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A história de Jamie Cullum com o público português quase se confunde com a história do festival Cooljazz (que acaba de incorporar o patrocínio no nome, sendo agora Ageas Cooljazz). Afinal, o britânico já passou cinco vezes pelo evento, tendo-se estreado naquele palco em 2005, aquando da sua primeira visita a Portugal.
Quando o festival — que se divide entre o Hipódromo Manuel Possolo e o Parque Marechal Carmona, em Cascais — começou a preparar a edição dos 20 anos, Cullum foi logo o primeiro nome a ser anunciado. Para encerrar a edição comemorativa, vai actuar a 31 de Julho, com a primeira parte a cargo da portuguesa Inês Marques Lucas. Os bilhetes encontram-se à venda entre os 30€ e os 35€.
Um convite irrecusável
Como revela em entrevista à Time Out Cascais, Jamie Cullum nem ambicionava dar concertos este Verão. Nos últimos anos, o músico tem dedicado mais tempo à família, fazendo menos digressões. O seu último disco, The Pianoman on Christmas, também já tem quatro anos. Mas o convite do Cooljazz não podia ser recusado e Cullum lá marcou mais umas datas para fazer uma pequena tour durante os meses mais soalheiros do ano.
Jamie falou-nos ainda da relação que mantém com o público português, contou-nos como a experiência de palco é tão importante para si, levantou ligeiramente o véu sobre as novas canções que anda a preparar e explicou-nos como a natureza particular da sua família tem influenciado mais e mais os seus temas.
Este será o seu regresso a Cascais, uma vila onde já esteve muitas vezes, num festival que também já se tornou casa. Do que é que gosta em Cascais quando cá vem?
Do público. Obviamente, é uma zona linda do mundo e, como sabes, os britânicos adoram ir a Portugal... Mas, quando penso neste festival, lembro-me sempre que estava a vir de um festival no Reino Unido onde tinha passado um óptimo bocado, com um grande público. Adoro os meus fãs no Reino Unido, mas quando cheguei ao meu primeiro Cooljazz, tudo aumentou em 50 por cento. As pessoas eram mais barulhentas, batiam mais palmas, cantavam mais alto, a sensação de alegria tinha aumentado... Enquanto artista, é aquilo que mais adoro. E tenho andado a perseguir esse sentimento cada vez que volto.
Com sucesso?
Definitivamente. Isso nota-se na quantidade de vezes que toquei em Portugal ao longo dos anos. É um dos países onde mais toquei. Porque sabemos que temos sempre um público incrível, e para nós é muito divertido... Não fizemos nenhuma viagem aí que não tenha sido maravilhosa.
Obviamente, ao longo dos anos tocou em pequenos clubes, em grandes festivais, em salas de espectáculo fechadas... O Cooljazz não é só ao ar livre, é num ambiente muito verde. Sabe melhor tocar ali?
Absolutamente, é um sítio muito bonito. Nós temos a oportunidade de ir a muitos sítios incríveis, sítios a que não iríamos se não fosse desta maneira – e este é um daqueles a que temos sempre vontade de voltar. Porque é bonito, muito verde, exuberante. Comemos sempre muito bem. Da última vez que estive em Cascais comi um dos mais deliciosos peixes da minha vida inteira, foi num restaurante incrível à beira-mar, não longe do festival.. Infelizmente não me recordo do nome. Enfim, tenho grandes memórias, somos sempre muito bem recebidos.
E o que é que o público pode esperar do concerto deste ano? À medida que os anos passam, foi acumulando cada vez mais canções... Torna-se mais difícil escolher o alinhamento?
Sempre que estás em tour, pelo menos para mim nos últimos 15 ou 20 anos, estás por causa de um álbum novo. Portanto, tens sempre de apresentar aquilo que estás a fazer no momento e revisitar apenas as coisas que as pessoas querem ouvir de álbuns anteriores. Esta é a primeira vez em que estou em tour, mas sem estar a apresentar nenhum disco específico. Foi há 20 anos que lancei o meu primeiro grande álbum, o Twentysomething, parece-me uma óptima oportunidade para revisitar os últimos 20 anos e mergulhar mais a fundo nos discos mais antigos.
Há mais liberdade numa tour assim?
Sim, é um tesouro poder fazê-lo. Porque significa que chegaste a um ponto na tua carreira em que as pessoas querem ir ver-te independentemente daquilo que estás a fazer agora. Tenho música nova para gravar, que irei gravar muito em breve, mas não estará preparada para lançar antes de partir para a digressão. Não há mesmo outra razão: o Cooljazz ligou e perguntou-me, "queres fazer o Cooljazz?" Fui chamado para uns três festivais este Verão, um dos quais o Cooljazz, e não estava a planear fazer nenhum concerto. Mas pensei: "bem, eu gostava mesmo de fazer o Cooljazz." Então, basicamente, baseámos os outros concertos a partir deste, e conseguimos marcar mais. Cascais será o último que faremos este Verão.
E esta também é uma edição especial do Cooljazz, que faz 20 anos.
Sim! Estamos ambos na casa dos 20, o Cooljazz e o meu álbum Twentysomething, que foi o meu primeiro disco com verdadeiro sucesso.
A sua história em Portugal obviamente funde-se com a do festival. É importante para si construir estas relações?
Completamente, tem sido aquilo que tem alimentado a minha carreira. Significa que não te estás a agarrar àquilo que está a acontecer no Spotify, no TikTok ou seja o que for. Significa que estás a construir fãs da vida real, e se esses fãs também organizam festivais e gostariam de te ter lá, estamos a trabalhar juntos para criar uma situação musical perfeita para todos. E chegas lá e dás tudo.
Os seus concertos são conhecidos por terem essa energia. É no palco que se sente melhor enquanto músico?
É particularmente especial quando um concerto está a correr bem e estás na onda e não a pensar se cantaste ou tocaste a nota desta ou daquela forma, se ficou tudo totalmente perfeito. E o público está contigo. É um sentimento muito especial, não dá para comparar a qualquer outro. Mas também adoro estar em casa a ensaiar, a compor e a gravar – é algo que saboreio muito. Mas, sim, é difícil bater o sentimento que tens quando estás em palco.
É viciante?
Já não tanto... Quando era mais novo sentia que não conseguia não fazer tours. Mas, agora que sou mais velho e tenho uma família, sou casado há muito tempo, gosto de estar tão ocupado quanto quero estar. Nem sempre tenho sucesso nisso, adoro tocar, mas já não diria que é viciante.
E descobriu muito cedo que não seria um músico tradicional de jazz? Que teria uma abordagem mais pop dentro do género?
Bem, eu nunca soube sequer que seria músico. Mesmo que eu me estivesse a ensinar a mim próprio a tornar-me um músico. Mas nunca pensei que seria alguém... O jazz então era um mistério para mim, não tinha professores, não existia Internet, eu só tinha os discos. Não havia ninguém que eu conhecesse que realmente soubesse algo sobre aquilo. Portanto era um mistério: porque é que gosto desta coisa que eu não compreendo assim tão bem? Comecei a ter uma vida musical muito cedo, fiz parte de bandas de rock e pop, grupos que tocavam em casamentos, e quando comecei a fazer coisas mais ligadas ao jazz pareceu-me natural misturá-lo com as outras coisas que eu fazia nas outras bandas. Ninguém me disse para não o fazer [risos]. E eu não cresci numa cidade grande, era um meio rural, por isso eu não era uma pessoa muito urbana e cosmopolita. Pergunto-me se, caso tivesse sido exposto a imenso jazz ao vivo, numa cidade grande, teria tido outras ideias sobre misturar isto tudo.
Há pouco dizia que tem música nova para gravar. Está a ir numa direcção específica para formar um próximo disco?
Estou muito entusiasmado com as novas canções que tenho composto, mas ainda não consegui perceber exactamente qual é a direcção delas. Acho que ainda estou naquela fase em que estou a acumular material. Depois, a narrativa do que isto será acabará por se revelar de forma gradual algures durante o processo. Mas soa-me a território familiar, uma mistura entre composições que espero que sejam boas com uma influência jazzística e pop. Acho que vai soar a um álbum que eu faria. Tirando isso, ainda estou no escuro, ainda estou na oficina a brincar, o que é uma parte super divertida do processo.
E, com os anos e a experiência, tem a necessidade de abordar outro tipo de assuntos?
Dei por mim a escrever muito sobre a história da minha família nestas canções mais recentes. É um tema de grande interesse para mim, porque a minha mãe nasceu em Burma, de pai indiano e mãe birmanesa; o meu pai nasceu em Jerusalém e a sua mãe escapou aos nazis. Eles não falavam muito sobre isto enquanto eu crescia, porque acho que foram forçados a serem o mais britânicos possível na altura em que estavam no Reino Unido e queriam que nós, os filhos, fôssemos considerados britânicos, por muito que não fôssemos de todo. Depois, quando tens os teus próprios filhos, começas a interessar-te muito mais por isso, pensas mais sobre isso. E isso tem-se reflectido nas letras destas canções, mesmo que não tenha sido intencional.
E com uma carreira que tem quase 25 anos, obviamente já conquistou muita coisa, tocou em muitos sítios e colaborou com muitos artistas. O que falta fazer?
Sinto que deveria ter uma resposta sexy, um álbum de duetos com a Beyoncé ou algo assim... Mas são mesmo coisas pequeninas que têm a ver com a forma como toco, a minha habilidade para tocar acordes e solos, e a forma como componho melodias e progressões de acordes... São coisas pequenas que para mim são muito importantes. São coisas em que penso mas que sei que mais ninguém teria interesse [risos]. Mas são essas as minhas ambições, esteja eu a aplicá-las no palco ou no corredor da minha casa.
É importante manter os pés na terra?
Acho que, naturalmente – com quase 45 anos, um filho adolescente e uma filha com 11 anos, estando casado...– se isso não te deixa com os pés na terra, nada o fará. Mas não acho que eu tenha uma tendência para caminhar na direcção oposta. Sinto que, de forma orgânica, sempre operei a partir de um lugar de gratidão. Muito antes de ser uma palavra tão usada [risos]! Mas sempre me senti muito grato por poder fazer aquilo que faço, viver num país relativamente pacífico e poder ir saciando a minha curiosidade. É um sítio muito sortudo para se estar.
Ageas Cooljazz, Hipódromo Manuel Possolo, Cascais. Qua, 31 de Julho. 30€-35€
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