O fosso entre os compositores de música erudita e o seu público, que começou a abrir-se há quase um século, poderia ter levado a que o repertório dos concertos se centrasse no Classicismo e no Romantismo e nas obras mais conhecidas de alguns nomes do Barroco, mas a redescoberta dos muitos tesouros esquecidos que foram compostos antes de Mozart tem assegurado uma permanente renovação do repertório.
Um dos melhores exemplos dessa recuperação e revitalização do passado é o programa “Folias Antiguas & Criollas: Da antiga Hespéria ao Novo Mundo”, que nos é proposto pelo maestro Jordi Savall, com o Hespèrion XXI e o Tembembe Ensemble Continuo (Sáb 7, Igreja Matriz), e dá a oportunidade de ouvir recriações coloridas e vivas de obras de compositores activos na Península Ibérica e nas Américas nos séculos XVI-XVII, mesclando repertório de dois CDs na Alia Vox, o excepcional Villancicos y Danzas Criollas e, numa toada crossover, El Nuevo Mundo: Folías Criollas.
O maestro Lionel Meunier, à frente do ensemble Vox Luminis (Dom 8, Igreja Matriz), confronta a produção de música sacra do jovem J.S. Bach quando era organista em Arnstadt (1703-06) com a dos seus antecessores e inspiradores – Buxtehude, Johann Michael Bach e Johann Christoph Bach. J.S. Bach, agora na vertente orquestral – Concertos Brandemburgueses e Ouvertures –, volta a ser o assunto do Ensemble Zefiro, dirigido por Alfredo Bernardini (Dom 15, Igreja Matriz) e o sustentáculo do programa “Variations on Variations”, em que o Concerto Italiano, de Rinaldo Alessandrini (Sáb 21, Igreja Matriz), toca transcrições de peças para tecla do mestre alemão. O festival fecha com mais Bach, pela mão do Coro Arsys Bourgogne e da Pulcinella Orchestra, co-dirigida pela violoncelista Ophélie Gaillard e Mihály Zeke (Sáb 28, Igreja Matriz), num programa repartido entre Johann Sebastian e o seu filho Carl Philipp Emmanuel.
Bach seria capaz de providenciar matéria para vários festivais, mas o FIMPV dá também espaço à música italiana do final da Idade Média, pelo ensemble La Fonte Musica, de Michele Pasotti (Qui 12, Igreja São Pedro de Rates), e à celebração dos 350 anos do nascimento de François Couperin, em que a cravista Ana Mafalda Castro (Ter 17, Igreja São Pedro de Rates) rodeia o compositor francês dos seus antecessores, contemporâneos e sucessores: D’Anglebert, Balbastre, Forqueray, Rameau e Royer.
E, claro, também há concertos para quem não cinge a dieta a música anterior a Mozart: Chopin, Lopes-Graça e Schubert por Pedro Burmester (Ter 10, Cine-Teatro Garrett), Schubert e Webern por um ensemble de câmara que reúne alguns dos melhores instrumentistas da Europa, encabeçado pela violinista Isabelle Faust (Sáb 14, Igreja Matriz), compositores contemporâneos portugueses (entre os quais António Pinho Vargas) pelo Quarteto Verazin (Qui 19, Cine-Teatro Garrett), Haydn, Prokofiev e Shostakovich pela Orquestra Sinfónica do Porto, dirigida por Martin André (Sex 20, Cine-Teatro Garrett), Beethoven, Ligeti e Schubert pelo Vision String Quartet (Dom 22, Igreja São Pedro de Rates) e a ópera L’Heure Espagnole, de Ravel, pelo Ensemble Messiaen, dirigido por Yoan Héreau, e com encenação de Raquel Silva (Sex 27, Cine-Teatro Garrett). Neste lote, o evento que provavelmente atrairá mais público será o recital do pianista russo Arcadi Volodos (Qua 25, Cine-Teatro Garrett), que grava em exclusivo para a Sony e actua regularmente nas grandes salas de Nova Iorque, Londres ou Paris – o seu programa combina Mompou, Schubert e Schumann.
Não há indícios de que o consumo repetido de música excepcional cause efeitos secundários indesejáveis (embora possa causar habituação), pelo que poderá empanturrar-se com o programa integral do FIMPV sem receios.
Vários locais da Póvoa de Varzim. Sex 6 a Sáb 28, 21.45. 3€ por concerto, 25€ passe geral.