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Tudo tem dois lados, incluindo a revolução. Com a liberdade conquistada no 25 de Abril, chegou também a desordem da reforma agrária, os “retornados” do ultramar ou novas formas de censura política. Depois de uma primeira temporada passada entre os anos de ditadura, 3 Mulheres regressa num Portugal acabado de sair do Estado Novo. Natália Correia, Maria Armanda Falcão (conhecida também pelo pseudónimo Vera Lagoa) e Snu Abecassis continuam a ser três das mulheres mais influentes e corajosas da época, e é a partir dos seus olhares que percorremos a história desde a Revolução dos Cravos até aos primeiros passos da consolidação da democracia. O primeiro episódio de 3 Mulheres – Pós-Revolução tem estreia marcada para quarta-feira, às 21.00, na RTP1.
“Já havia muitas coisas [de televisão] sobre o 25 de Abril, mas não havia sobre algumas coisas do 25 de Abril”, começa por dizer Fernando Vendrell, realizador de ambas as temporadas da série, à Time Out. Daí esta segunda temporada incluir novas personagens, para representar a sociedade em rápida transformação daqueles tempos, com os portugueses vindos de África, com os jovens militantes do PCP ou com os latifundiários que vêem as suas propriedades ocupadas. “É muito difícil contar a atmosfera que se viveu no pós-25 de Abril, no PREC, os ataques, as bombas, os incêndios, e isso ainda não existia [na televisão]”, completa o realizador. Nesta altura, Natália Correia, Vera Lagoa e Snu Abecassis entram na fase mais política das suas vidas, com ligações a partidos e dirigentes políticos, mas com o mesmo sentido de rebeldia e contestação que as caracteriza.
“Em relação à Snu, ela continua à frente da editora Dom Quixote e começa a publicar as ideias dos novos políticos e pensadores da época, e é a partir daí que conhece Sá Carneiro”, revela-nos Victoria Guerra, a actriz que interpreta a dinamarquesa. Enquanto a primeira temporada, lançada em 2018 e agora disponível também na HBO Max, acompanhou a chegada de Snu a Portugal de mãos dadas com Vasco Abecassis, esta segunda parte vai mostrar o contínuo trabalho interventivo na editora e a polémica paixão por Francisco Sá Carneiro (Luís Eusébio). “Tivemos uma resposta tão boa do público [na primeira temporada] que percebemos que tínhamos de continuar a contar esta história. Por isso, acho que a responsabilidade [de interpretar Snu] foi ainda maior”.
Para a escritora e poeta Natália Correia, interpretada por Soraia Chaves, o pós-revolução significa a sua entrada na política, ao lado de Sá Carneiro, quando este se torna líder do PPD (actual PSD). “Na primeira temporada concentrei-me muito numa Natália poética. Agora, fui descobrir uma outra Natália, e é isso que é muito fascinante nela, são essas diferentes facetas”, partilha Soraia Chaves. Em 1974, Natália Correia tem 51 anos, uma idade que lhe traz maturidade mas que não lhe tira as paixões ardentes e as opiniões e atitudes que a sociedade ainda não reconhece a uma mulher. “Foi difícil porque tínhamos de avançar uma década, envelhecer muito e aí também a caracterização e o guarda-roupa foram fundamentais”, revela.
Maria Armanda Falcão, que adoptou o pseudónimo de Vera Lagoa ainda antes do 25 de Abril, é provavelmente a personagem mais controversa entre as três. Na primeira temporada, conhecemo-la ligada à esquerda e perdidamente apaixonada pelo revolucionário José Manuel Tengarrinha (Afonso Lagarto), fundador do MDP/CDE e preso pela PIDE durante o Estado Novo – um lado menos conhecido da jornalista e cronista. Uma década depois, temos uma mulher que se transforma num dos ícones da direita mediática. Interpretada por Maria João Bastos, Vera Lagoa é a persona utilizada por Maria Armanda Falcão para criticar o poder instaurado, qualquer que seja o espectro político.
Num Portugal ainda atrasado pela ditadura e onde os lugares de decisão continuam predominantemente em mãos masculinas, estas três figuras foram fundamentais para um novo olhar sobre as mulheres. “Este é um retrato importante e um documento histórico que vai ficar e fazer parte disso é muito satisfatório e um privilégio”, sublinha Soraia Chaves.
A segunda temporada de 3 Mulheres, com argumento de Luís Alvarães, Filipa Martins, João Matos e Diogo Figueira, conta com dez episódios de 45 minutos cada. O resultado desta ideia original de Fernando Vendrell e Elsa Garcia vai ser exibido às quartas-feiras, a partir das 21.00, na RTP1 e, posteriormente, ficará disponível na RTP Play.
RTP1. Qua 21.00 (estreia T2)
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