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Foi em conversa com um amigo que João Rebelo, mais conhecido como Lince Rebelo, descobriu O Rapaz da Camisola Verde, poema de Pedro Homem de Mello que foi musicado por Frei Hermano da Câmara e imortalizado na voz de Amália Rodrigues. O tema obedecia ao canto da saudade e do destino habitual no repertório do fado, mas acabou por distanciar-se do carácter homoafectivo e homoerótico evocado no original de 1954. “Fui-me apercebendo do potencial narrativo que o fado poderia ter para a comunidade queer portuguesa quando desconstruído do seu imaginário normativo”, revela Lince Rebelo.
Assim nasceu Bem e Mal Amado, a exposição que pode ser visitada até 3 de Maio na Galeria Cozinha da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto (FBAUP). O universo queer é presença habitual no trabalho de Lince Rebelo - também co-coordenador da Cravo Zine, revista digital que todos os meses apresenta diferentes artistas plásticos nacionais e internacionais -, que quis “reinventar a estética [associada ao fado] para subverter a sua narrativa”. Nesse sentido, procurou alargar o espectro de figuras e histórias representadas no género musical que se rege normalmente por uma dinâmica heteronormativa e cisgénero.
Para explorar a ligação entre o fado e o queer, o artista baseou-se em 20 poemas interpretados por Amália Rodrigues. Inicialmente, queria destacar obras de poetas queer mas, à excepção de poemas de Pedro Homem de Mello e Ary dos Santos, encontrou muito pouco material. “O contexto em que o fado surgiu [em pleno Estado Novo] não permitiu que estas narrativas fossem popularizadas”, sublinha. Então, acabou por escolher poemas de autores queer e não queer, todos “ligados a Amália e ambíguos nas suas personagens centrais”.
Bem e Mal Amado despe o fado de restrições de género através de uma variedade de abordagens e meios. “Algumas são mais literais, outras focam-se em ideias-chave dos poemas e outras afastam-se mais”, explica Lince Rebelo, acrescentando que os visitantes podem ver “maioritariamente peças de ilustração, mas também objectos em pano cru, tecelagem e escultura”. A exposição é de entrada livre e pode ser vista entre as 10.00 e as 19.00 até esta sexta-feira.
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