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Esta exposição mostra que o Porto não é (só) uma cidade branca

‘Presentes! Africanos e afrodescendentes no Porto’ mostra esta comunidade pelo olhar do fotojornalista José Sérgio. Pode ser vista no Mira Fórum até 23 de Dezembro.

Escrito por
Maria Monteiro
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O título desta exposição não é apenas um nome à cabeça da folha de sala que passa diante dos nossos olhos por instantes e depressa vai parar às profundezas do esquecimento. É, antes, uma afirmação determinada, proferida de punho cerrado, que quer tornar visível a existência de uma comunidade ainda pouco falada e (re)conhecida no Porto e reclamar um lugar para ela no espaço público. “Diria que tem um duplo sentido: é uma constatação de que estas pessoas estão aqui presentes e, ao mesmo tempo, de que estas vidas fazem parte do presente da cidade”, contextualiza José Sérgio, a propósito de Presentes! Africanos e afrodescendentes no Porto, exposição que pode ser vista no Mira Fórum, em Campanhã, entre 31 de Outubro e 23 de Dezembro. O fotógrafo e fotojornalista apresenta 40 retratos que formam “um primeiro registo fotográfico” de uma realidade plural, heterogénea e multicultural.

Nem sempre foi esta a ideia de José Sérgio sobre o Porto. Há mais de 20 anos que trocou Moçambique por Portugal, primeiro na Área Metropolitana de Lisboa – onde a comunidade africana e afrodescendente tem uma dimensão e representação substanciais. Mas quando ia ao Porto ficava com a impressão de estar sozinho numa cidade branca. “Tinha na cabeça essa imagem, que vim a perceber ser errada, de que não havia comunidades africanas no Porto.”

PRESENTES! AFRICANOS E AFRODESCENDENTES NO PORTO
© José Sérgio

Tudo mudou quando foi viver para a cidade, em 2018. Ao contrário do que acontecia quando a visitava pontualmente, começou a ver mais pessoas com a sua cor de pele. “Ao circular pelas ruas, no meu dia-a-dia, constatei que já não era tão branca como noutros tempos”, descreve. Resolveu, então, ir em busca da sua comunidade, mas não sem antes procurar estudos estatísticos e/ou sociológicos que o pudessem ajudar a contextualizar a presença africana no Porto a nível histórico, social e cultural. Não encontrou (quase) nada. “Não posso afirmar que não existem, mas se calhar são dados que ainda não estão tratados”, nota. Confrontado com essa lacuna, o fotojornalista foi para o terreno e abordou algumas pessoas sobre o seu projecto para sondar a sua disponibilidade para participar. “Nenhuma destas pessoas foi abordada e fotografada no mesmo dia”, revela o artista. Depois de uma primeira conversa, ficava marcado um café, ao que se seguia um ou vários encontros, na tentativa de construir uma relação de confiança e intimidade.

Houve, ainda, um momento de entrevista, com um questionário único e registada em vídeo. Finalmente, os participantes foram desafiados a criar um “retrato fotográfico que, no caso dos que saíram da sua terra, servisse de postal para mandar aos amigos e à família”. O resultado é um sólido trabalho documental, apoiado por pequenos depoimentos e registos sonoros, sobre pessoas que se “sentem tão habitantes deste lugar como qualquer outro portuense”. Embora se trate de “uma pequeníssima amostra dos afroportuenses que podemos encontrar”, esta exposição permite perceber a diversidade de contextos em que se inserem. Alguns já nasceram e sempre viveram aqui, outros vieram de fora e não quiseram mais sair, outros ainda chegaram para estudar. Uns são trabalhadores-estudantes, outros são cabeleireiros e barbeiros, outros trabalham na restauração. Mas todos fazem da cidade a sua casa e têm hábitos e rotinas que os inscrevem, cada vez mais, no tecido cultural, social e político do Porto. “A cidade tem de redescobrir-se e reconhecer-se nessa nova diversidade”, aponta José Sérgio, defendendo que “gritar ‘presente’ é especialmente adequado ao momento em que vivemos”, nomeadamente com o racismo e a violência policial a sair à rua e o movimento Black Lives Matter a ganhar força.

PRESENTES! AFRICANOS E AFRODESCENDENTES NO PORTO
© José Sérgio

Não é a primeira vez que o fotógrafo se debruça sobre a africanidade em Portugal. Em 2019, realizou a exposição A viagem que Guerra Junqueiro nunca fez na Casa-Museu Guerra Junqueiro, sobre o poeta português que desempenhou o cargo de deputado pelo distrito moçambicano de Quelimane sem nunca o visitar. Devido às restrições da pandemia, este novo trabalho assumiu um carácter mais genérico do que o desejado. “Gostava de mostrar hábitos e lugares para [poder] ir além do retrato propriamente dito”, conclui.

Mira Fórum. Rua de Miraflor, 155 (Campanhã). Ter-Sáb 15.00-19.00. Entrada gratuita.

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