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Inicialmente, o mural principal da sala mostrava uma mulher de olhar determinado e bochechas rosadas, despida de roupa, preconceitos e inibições relativas ao seu corpo — personagem não muito diferente das que normalmente habitam o mundo de Berri Blue, artista polaca que desde 2016 decora as ruas do Porto com obras sobre identidade, saúde mental e sexualidade.
Com o período de confinamento, a exposição prevista para Março, que retratava “dois meses felizes de Primavera”, foi adiada e virada de pernas para o ar. A bonita silhueta feminina deu lugar a uma figura cadavérica e soturna, mas ambas foram preservadas e montadas em espelho, dando corpo ao contraste de Amor em tempos de praga, que inaugurou, finalmente, a 11 de Julho, na Urtiga, e ali deverá ficar até 29 de Julho.
“Esta [exposição] é sobre a beleza e a melancolia da experiência [de isolamento] e a forma como elas co-existem”, introduz a artista. A exposição apresenta as suas memórias e vivências dos últimos meses, do amor e harmonia que precederam a pandemia, à ansiedade e pressão que vieram com ela. A partir de uma instalação que transporta o seu estúdio para a galeria, Berri Blue encara o espaço como depósito de memórias e lugar de catarse.
“Quis arrancar tudo das paredes para poder começar de novo”, revela, equiparando o processo à “mudança de pele de uma cobra”. Todos os elementos da exposição contêm uma “grande carga pessoal e emocional”, permitindo uma imersão total no mundo de Berri. A secretária onde trabalha, as tintas e pincéis, os esboços e rascunhos, as inúmeras listas (de compras e não só), o livro que está a ler de momento e a caneca de chá verde que a acompanha religiosamente oferecem uma janela privilegiada para a sua rotina.
“Parece que mudei de casa”, nota Berri, entre risos. Além dos objectos do estúdio e das pinturas em exposição, há um vídeo que reúne filmagens pessoais dos últimos três meses, algumas delas previamente mostradas no Instagram. “É importante fazer o contraponto entre o que vemos na Internet e o que é real e físico”.
Embora se descreva uma “pintora que coloca as suas obras na rua” e não estritamente uma “artista de rua”, Berri Blue faz da rua a sua galeria de arte principal, colando os seus trabalhos pela cidade com uma pasta caseira de farinha, açúcar e água. Talvez aqueles que tropeçam na sua obra pelo caminho não esperem encontrá-la numa galeria. Vale a pena fazer um desvio e entrar na Urtiga para criar uma nova intimidade com ela. A entrada é livre.
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