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Por estes dias, o imaginário artístico de Ana Aragão toma conta da Casa Comum da Reitoria da Universidade do Porto, a propósito da exibição de Galeria X, mostra que pode conhecer até dia 5 de Abril. Esta resulta de uma reflexão sobre a ideia de colecção e conta com a curadoria de Rui Manuel Vieira, explica a artista enquanto nos conduz pelas três galerias que compõem a exposição.
A visita começou na Galeria Possível, com ilustrações produzidas entre 2012 e a actualidade. Para ver, há obras “definidoras de irrecuperáveis momentos de descoberta” no trajecto da arquitecta de formação. Estas são também as que melhor revelam “a real natureza dos desenhos, com os seus erros, omissões e finitude”, considera Aragão. Um bom exemplo disto mesmo é uma cartografia de Lisboa, marcada por um grande vazio negro, consequência de um desacerto. “Eu desenhei um navio encalhado, mas ficou tão mal que o recortei. Depois disso, sempre que olhava para o desenho achava que estava indefinido. Tentei resolvê-lo de todas as formas possíveis, mas a dado momento resignei-me e aceitei que o vazio era só o vazio. Houve aqui um encontro e uma aceitação de que nem tudo no desenho tem que ser definido e que este admite pausas, hesitações e é lugar para a imprevisibilidade e para leituras por parte do observador. Foi uma autodescoberta”, conclui.
Uma reinterpretação da Torre de Babel de Bruegel, dotada de “uma carga negativa muito alta, por resultar de uma leitura do mundo que não é optimista”, segundo a própria, é outro dos destaques da sala. Tal como em outros trabalhos, sobressai a riqueza dos pormenores. “Procuro obras onde eu me possa demorar. Parece-me importante a nível de processo estar muito tempo debruçada sobre uma ilustração, pois interessa-me esta relação entre uma leitura aproximada, em que se vê todos os detalhes escondidos, e uma distante, em que podemos olhar por uns segundos e fica tudo visto”.
Na Galeria em Construção brilha um desenho infinito que Ana nunca foi capaz de terminar. “Tento sempre iniciar e acabar os trabalhos, mas neste caso não consegui. Dei-lhe sentido através da criação deste papel de parede que forra a sala. É como se de algum modo mergulhássemos numa imagem que se podia estender infinitamente”, explica. Pela questão do preenchimento, da abundância e do que expressa sobre a relação entre o indivíduo e o todo, a peça acaba por ter um valor especial para a autora. “Faz-nos questionar onde é que estamos no meio de todas estas casinhas que personificam o excesso e a alta densidade.”
A mostra termina na Galeria Ideal, que acolhe uma interpretação livre de uma das galerias do pintor e arquitecto italiano Giovanni Paolo Pannini. “É aqui que reúno os ensinamentos dos mestres que também usavam o desenho para apresentar propostas para a cidade. Muitas dessas obras são chamadas de arquitecturas de papel por nunca terem saído desse formato. Marcam, contudo, a história da arquitectura e da cidade.” Até porque acredita que para contar esta história não só é necessário falar dos edifícios construídos, mas também das utopias do desenho. Aldo Rossi, Álvaro Siza Vieira, Souto Moura e Giovanni Battista Piranesi são alguns dos artistas referenciados nesta galeria.