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A kombucha é uma bebida viva e milenar, elaborada à base de chá, açúcar e uma simbiose de bactérias boas. A primeira fábrica de produção no Norte do país é a Camellia. Fomos conhecer a bebida, as pessoas e as bactérias que a fazem.
Parece um monstro, o scoby. Podíamos jurar que aquela gosma gelatinosa em forma de panqueca gigante seria capaz de nos comer vivos. Numa fase avançada de desenvolvimento, o scoby, o ingrediente principal da kombucha, atinge proporções descomunais. Mas é através dele que nasce esta bebida probiótica e intrigante. Terá surgido no leste asiático por volta de 220 a.C., possivelmente na China, onde era conhecida como “chá da imortalidade”. Ao longo dos séculos alastrou-se por vários países e no ano passado nasceu em Guimarães a primeira fábrica de kombucha do Norte de Portugal.
A Camellia foi criada por Sabrina Silveira, Gabriela Theófilo e Flávio Theófilo, três amigos brasileiros. Quando chegaram a Portugal não encontravam a kombucha que queriam beber e, por isso, lançaram mãos à obra. Fizeram estudos de mercado e perceberam o potencial da bebida no país. Instalaram-se no edifício da ASA, uma antiga fábrica de lençóis convertida num pólo empresarial que acolhe dezenas de pequenos negócios. E tiveram consultoria do produtor brasileiro Rafael Strapazzon na montagem da fábrica.
“Uma coisa é produzir em casa, outra é entrar numa escala industrial, é totalmente diferente”, diz Sabrina Silveira. Têm que controlar a temperatura, o pH, a densidade, fazer medições laboratoriais e testes sensoriais como cheirar, provar, ver a cor, controlar tudo para a bebida não ficar demasiado ácida ou avinagrada. Mas apesar dessa escala industrial, ressalva Sabrina, a Camellia é “uma empresa artesanal”. “Trabalhamos todo o processo só nós os três, a gente cuida de cada garrafinha.” Elas tratam mais da produção, ele do trabalho comercial.
A marca chegou ao mercado em Setembro de 2019 a produzir cerca de três mil litros por mês. Está disponível em garrafas de 33 cl com preços desde 2,75€ e em três variedades: a original tem uma agradável acidez, a de uva é mais doce, e a de gengibre, levemente picante, é a mais procurada. “O nosso diferencial é um nível de pureza a 100%, sem adição de água nem CO2”, explica Flávio. A Camellia Kombucha é 100% pura, 100% biológica, refrigerada e em garrafa de vidro, o que fica “dez vezes mais caro”, mas é garantia da qualidade e sustentabilidade do produto.
Na base usam uma mistura de chá verde e preto biológicos para colher os benefícios de ambos. “Os antioxidantes estão mais presentes no chá verde, mas o chá preto fortalece mais o scoby e o probiótico fica mais forte”, explica Sabrina. Adoçam o chá com açúcar de cana de origem certificada e acrescentam o scoby, uma colónia de bactérias que se alimenta do açúcar e da teína do chá e fermenta naturalmente durante cerca de dez dias no Verão e 12-15 dias no Inverno. Após a fermentação, a bebida pode ser consumida assim ou saborizada com frutas e temperos durante três a cinco dias. Não usam conservantes, aromatizantes nem corantes, nenhum aditivo alimentar.
A fermentação é fascinante. Parece feitiço. O scoby é uma massa mágica de celulose que agrega uma cultura simbiótica de microorganismos e leveduras. Em Novembro, um scoby com mais de 30 quilos foi eleito “funcionário do mês” na fábrica da Camellia. Foram precisas duas pessoas para conseguir pegar nele. Os scobys procriam como coelhos, crescem e multiplicam-
-se constantemente e os seus “filhos” são usados em novas fermentações. “O nosso scoby vem da Alemanha, é biológico e com certificação da qualidade e quantidade dos probióticos”, diz Sabrina. “A mãe scoby fala alemão, mas agora os filhinhos são portugueses”, acrescenta Gabriela, sem conter o riso. Não se assuste com os pedacinhos que nadam no fundo da garrafa – são garantia da pureza.
“Queremos ser um catalisador da mudança alimentar, participar dessa revolução que está a acontecer na cabeça das pessoas de pensar na longevidade. A kombucha é crucial nisso”, diz Flávio. Têm sido atribuídas qualidades à bebida, como a prevenção de doenças, o fortalecimento do sistema imunitário ou a diminuição da ansiedade. Mas nada disto está cientificamente provado. O que se sabe é que a kombucha, por ser um alimento fermentado, é rica em probióticos, que têm efeitos comprovados na saúde intestinal. E intestinos felizes fazem pessoas felizes. A kombucha não é a cura para tudo, mas pode ser uma peça no puzzle de um estilo de vida saudável. E sempre é melhor do que beber refrigerantes.
Os pedidos e os pontos de venda continuam a crescer e tudo aponta para que este seja o Verão da “explosão da kombucha em Portugal”. Para já, a Camellia está a ser distribuída em Guimarães, Braga, Porto e Matosinhos. Para os próximos tempos estão a estudar formas de eliminar o plástico na tampa da garrafa, de ampliar a fábrica, fazer assinaturas mensais, organizar workshops, vender kits para kombucha caseira, criar novos sabores, como frutos vermelhos ou goji, e, quem sabe, um espumante.
“As pessoas dizem-nos: ‘Finalmente, uma kombucha pura e portuguesa!’ Não vamos mudar isso porque é essa a essência da Camellia. Não precisamos de ser líder de vendas, queremos ser líder de qualidade. Podemos lucrar mais devagar, mas de forma consistente”, afirma Flávio. “Mesmo que a marca cresça, não vamos mudar nunca o nosso processo”, garante Gabriela. “Vamos manter a kombucha sempre pura e artesanal, como a gente faz agora.”
No distrito do Porto está disponível no daTerra, Vegana by Tentúgal, Apuro, Catraio Craft Beer Shop, Invicta Taproom, FixeBowl, Quintal Bioshop, Bio Mercado, Club Life, entre outros.