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La Fortuna é uma história de piratas. Piratas de mar, à antiga, embora esta não seja uma série de época. Estes piratas não têm perna de pau, olho de vidro e cara de mau, como escreveu Braguinha. São mais sofisticados. Dizem-se caçadores de tesouros, usam tecnologia de ponta, envergam roupas de fino corte e cirandam pelos meandros do poder, amealhando aliados. O que fazem é perscrutar o fundo dos oceanos para recuperar moedas, metais preciosos e outras relíquias perdidas em naufrágios. No caso, a Atlantis, empresa do aventureiro Frank Wild (Stanley Tucci), retira das águas a Oeste de Gibraltar (isto é, sensivelmente a Sul de Portugal) o riquíssimo recheio de uma fragata espanhola, La Fortuna, afundada por navios de guerra ingleses no início do século XIX. O maior tesouro submarino alguma vez resgatado. Mas fá-lo à revelia das autoridades espanholas e tenta esconder a mão, apresentando o espólio como um achado nos EUA e recorrendo à burocracia norte-americana para legalizar o saque e impedir Espanha de o reclamar.
Este é o ponto de partida de La Fortuna, a primeira série de televisão de Alejandro Amenábar, realizador chileno-espanhol que a maioria conhece pelo filme Mar Adentro (2004), com o qual conquistou um Óscar. É a adaptação de uma novela gráfica, O Tesouro do Cisne Negro, de Paco Roca e Guillermo Corral (ed. Levoir, 2019). Esta, por sua vez, dramatiza um acontecimento real: o destino da fragata Nuestra Señora de las Mercedes, em 1804, que trazia para a Europa todo o ouro e toda a prata possível, por ordem da Coroa espanhola, e que os ingleses tentaram desviar; face à recusa do comandante de cumprir o exigido, afundaram-no, num incidente que precedeu a famosa Batalha de Trafalgar, no ano seguinte; em 2007, a empresa americana Odyssey Marine Exploration encontrou e retirou o tesouro das profundezas, numa operação denominada “Cisne Negro”, ao que se seguiu um processo judicial promovido pelo Estado espanhol para o recuperar. É quase um decalque, embora não exactamente, já que o leque de personagens vívidas, que introduzem irreverência, rivalidade e romance à narrativa, acrescentam salero televisivo à história.
Antes de mais, Frank Wild, sedutor mas resoluto, ardiloso e implacável. Ao seu lado, a advogada Susan McLean (T’Nia Miller), leal e prudente, e a filha impaciente e obstinada, a adolescente Amy (Indy Lewis). Do lado espanhol estão Álex Ventura (Álvaro Mel), um jovem assessor diplomático do Ministério da Cultura, e Lucía Vallarta (Ana Polvorosa), uma arqueóloga idealista remetida às catacumbas labirínticas do mesmo Ministério, onde se ocupa do arquivo, e que toda a gente nos pisos superiores considera uma chata. Juntos vão convencer o ministro, Enrique Moliner (Karra Elejalde), a ir à luta pelo tesouro, contra a opinião dos conselheiros mais próximos do seu gabinete. Como? Recorrendo a um chavão do próprio ministro – “A cultura é o nosso petróleo” – e ao seu orgulho patriótico. Para isso, contratam Jonas Pierce (Clarke Peters), um reputado especialista em direito marítimo e antigo amigo de Frank Wild, que com ele tem uma profunda e desconhecida desavença. A série explora ainda as diferenças culturais entre espanhóis e americanos, mostrando como a incompreensão propicia generalizações abusivas e até sentimentos xenófobos.
Estreada no Festival de Cinema de San Sebastián, em Setembro passado, e ainda no mesmo mês no Movistar+, La Fortuna chega esta quarta-feira, 11 de Maio, à televisão portuguesa. Passa no AMC, às 22.10. Os seis episódios de cerca de uma hora cada foram todos dirigidos por Amenábar, que partilha o argumento com Alejandro Hernández (Adú).
AMC. Qua 22.10 (estreia)
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