[title]
Depois de Setembro, o Douro renasce de outra forma. As uvas estão colhidas, as videiras mais leves e o ritmo da terra abranda, como se ela respirasse mais devagar. As encostas vestem-se de tons acobreados e amarelos torrados, numa paleta de cores assinada por um Outono que chega brando e se deita sobre o Alto Douro Vinhateiro como um gato que se estica ao sol. A terra está húmida debaixo dos pés à hora que chegamos. Choveu nessa manhã, mas um espevitado sol de Inverno convenceu toda a gente a instalar-se na esplanada da Cantina de Ventozelo, o restaurante da quinta duriense com o mesmo nome, com vista para os socalcos. E em todas as mesas pediu-se o mesmo: o menu Azeite Novo, inspirado no azeite resultante da apanha, por varejo manual, que acontecera poucos dias antes na propriedade.
Disponível ao almoço e ao jantar, o menu pensado pelo chef José Guedes está dividido em quatro momentos, antecedidos por um couvert que enche o olho e a barriga mal nos sentamos à mesa. As azeitonas gulosas pedem para serem devoradas com sofreguidão e o pão com pedaços de azeitona para ser mergulhado no pratinho com o azeite novo. De almotolia na mão, a tradicional vasilha em alumínio destinada ao transporte e armazenamento de azeite, um dos funcionários diz-nos que este é “mais picante e com um forte sabor a noz e a amêndoa e a fruta verde”. Confere. Permanece na boca durante bastante tempo, com um bom equilíbrio entre a sua acidez e o seu lado mais frutado.
Nos cerca de 20 hectares de olival da Quinta de Ventozelo, um dos mais extensos do Douro, crescem as principais variedades autóctones da região, como a Madural, a Negrinha de Freixo, a Galega, a Cobrançosa e a Verdeal transmontana. E as diferentes altitudes, tipos de solo e exposições solares contribuem para a produção do Azeite Virgem de Ventozelo e do Azeite Essência de Ventozelo, este mais aveludado, que podem ser comprados na mercearia da quinta, online ou em lojas gourmet, como o supermercado do El Corte Inglès (16€ e 21,50€).
Celebrar tradições, valorizar produtos
“Queríamos valorizar o produto, proporcionar uma experiência pedagógica ao cliente”, começa por contar José Guedes, o chef, sobre a iniciativa que perdurará enquanto houver stock de azeite novo. “E tentámos fazer isso através da forma como o azeite se manifesta nos diferentes pratos”. Juntamente com o cesto de pão, chega a bola de azeite, húmida e fofa, e a laranja fidalga, com este fruto autóctone regado por um fio de azeite. A entrada escolhida para dar início à refeição é uma perdiz de escabeche com pão de entre-lenha de Ervedosa. “O azeite é importantíssimo no escabeche de perdiz, por exemplo, que é um animal de caça e estamos na época dela”, explica.
O bacalhau à lagareiro também não poderia faltar, mas, este ano, respeitou uma execução “mais tradicional”. É acompanhado de esparregado de couves que florescem na horta a poucos passos dali. Este é, aliás, um dos grandes pilares de toda a quinta, que aposta na proximidade dos produtos. Vão buscar matéria prima a produtores locais e muitos dos legumes e frutas que abastecem o restaurante vêm do pomar e da horta biológica da qual cuidam durante todo o ano. Das couves às alfaces, passando pelo aipo, funcho, beterraba, batata ou feijão verde.
A encerrar um menu que se aproxima muito de uma viagem no tempo – toda esta experiência é uma forma de relembrar as refeições que ocorriam nos lagares de azeite na altura da apanha da azeitona –, servem-nos um óptimo pudim de azeite e mel de Ventozelo. “Escolhemos o pudim de azeite e mel, tradicional dos Açores, uma receita do chef Miguel Castro e Silva, porque usa gorduras mais tradicionais”, acrescenta José Guedes. O remate de um menu que custa 55€ por pessoa já com a harmonização dos vinhos da casa incluída.
“Queremos que as pessoas se sintam envolvidas na região, na quinta, na paisagem. Que percebam mais sobre as nossas tradições, que absorvam toda esta dinâmica do azeite antigo e do azeite novo, que é extraído a frio e vai directo na vasilha para o restaurante”, conta o chef, acrescentando que no ano passado “trabalharam” o rio e tudo o que ele dá. “Dos espargos trigueiros que nascem nas margens, aos peixes, como a truta de Boticas e o lucioperca do rio Douro”. No currículo contam já com outras iniciativas, dedicadas ao tomate Coração de Boi e à época das vindimas, por exemplo.
Se estiver interessado em aprofundar a sua ligação ao azeite e às azeitonas, quando for tempo de as apanhar, reserve um quarto por aqui. Os hóspedes alojados no Ventozelo Hotel são desafiados a fazer provas de azeite e a participar na apanha da azeitona juntamente com os trabalhadores agrícolas. Se a sua visita calhar numa outra altura do ano, não há problema. As provas de vinhos orientadas, o centro interpretativo da quinta sempre aberto, os trilhos em redor da propriedade, a piscina infinita com uma vista de cortar a respiração, a emocionante época das vindimas e os quartos espaçosos e confortáveis vão tratar de o manter ocupado.
+ Mais do que uma feira: o Perímetro está de volta com concertos, performances e exposições
+ Do trapézio ao roller-skating, a magia do Circo de Natal ocupa o Coliseu do Porto