Notícias

O histórico Pinguim Café pegou "no que foi esquecido" e entrou num novo ciclo com ainda mais cultura

Com o actor e encenador Rui Spranger ao leme, o bar portuense passa a ter mais noites de cultura. Os 35 anos das míticas noites de poesia vão ser assinalados com um livro.

Ana Catarina Peixoto
Escrito por
Ana Catarina Peixoto
Jornalista, Porto
Rui Spranger e Pedro Martins estão agora à frente do novo ciclo do Pinguim
@ Margarida Santos | Rui Spranger e Pedro Martins estão agora à frente do novo ciclo do Pinguim
Publicidade

A cidade do Porto mudou ao longo dos anos. Abriram-se negócios, fecharam-se outros tantos, chegaram pessoas novas e mais projectos e ideias. No meio desse cenário, há espaços míticos que continuam a ser a casa de muitos e que mantêm a essência desde o primeiro dia, mas adaptados aos novos tempos. O clássico Pinguim Café, nascido em 1987 e um dos mais importantes bares culturais do Porto, é um desses exemplos. O espaço vive agora uma nova fase, com o actor e encenador Rui Spranger na gestão, e conta com algumas mudanças que pretendem trazer ainda mais cultura ao Pinguim, tal como antigamente.

A garantia é do próprio responsável, que tem desde Março deste ano a gestão do Pinguim, que esteve, nos últimos 25 anos, nas mãos de Paulo Pires, falecido em 2023. “Esta é a minha casa já há muito tempo. O objectivo é continuar e, sobretudo, fazer com que o Pinguim seja o Pinguim que era antes. É fazer uma junção entre toda a história deste espaço e transformá-lo novamente num bar essencialmente cultural”, refere Rui Spranger à Time Out. Ao seu lado tem Pedro Martins, responsável pelo bar e um dos companheiros nesta nova caminhada.

O bar está localizado no centro do Porto
@ Margarida SantosO bar está localizado no centro do Porto

Logo à entrada do espaço, um quadro feito de origamis com o rosto de Paulo Pires, em homenagem ao antigo dono, dá-nos as boas vindas. Mais à frente, num outro, escrito a giz, lê-se: “A tradição não é a veneração das cinzas, mas a passagem do tempo”. As paredes deste piso, com várias mesas e o bar no centro, continuam a receber, com frequência, exposições de artes plásticas, sobretudo de pintura e fotografia e as mesas do espaço mantêm também a tradição e permitem aquilo a que Rui gosta de chamar “arte efémera”, uma vez que é possível desenhar e escrever nelas com giz. No exterior, o Pinguim não sofreu grandes alterações, mantendo a sua identidade. Mas a nível cultural há novidades. 

O objectivo é renascer, recuperar o que ficou esquecido, reavivar velhos hábitos, introduzir ainda mais cultura e adaptar-se para receber novos públicos. Para isso, o horário de funcionamento foi alargado, passando a estar aberto todos os dias, das 17.00 às 02.00 (com happy hours entre as 17.00 e as 20.00), a esplanada foi reaberta e a programação cultural na cave mais poética do Porto foi reforçada. 

Mais cultura e um livro com 35 anos de noites de poesia

Uma das apostas é o reforço das já históricas noites de poesia, que acontecem quase religiosamente há mais de 35 anos e que todas as segundas-feiras enchem a cave deste espaço com pessoas de todos os lugares e das mais diversas áreas (não precisa de ser poeta ou escritor para participar nestas sessões). Numa altura em que estavam prestes a desaparecer, em 2002, Rui Spranger chegou para as recuperar e pela mais famosa e antiga tertúlia de poesia da cidade já passaram nomes como Valter Hugo Mãe e João Habitualmente. 

As noites de poesia acontecem há mais de 35 anos na cave do Pinguim
@ Margarida SantosAs noites de poesia acontecem há mais de 35 anos na cave do Pinguim

“Uma noite de poesia normalmente soa a uma coisa chata e aborrecida e as noites de poesia aqui não são chatas nem aborrecidas. Estas noites começaram em 1988 e tornaram-se um fenómeno. Depois, também tiveram um período negro no final dos anos 90, mas a partir dos anos 2000, com a chegada do Paulo, começaram novamente a crescer e a ganhar outra vez o seu papel e o seu estatuto. São as noites de poesia mais antigas do país e temos várias cópias espalhadas por aí, porque acabou por se tornar uma espécie de inspiração para muitos outros espaços”, explica Rui.

Para assinalar este marco, e à semelhança do que já aconteceu no 25.º aniversário das Segundas de Poesia do Pinguim Café, vai ser lançado, em breve, um livro que reúne vários textos que daqui saíram ao longo de 35 anos. “Na antologia dos 25 anos, os músicos tinham ficado de fora. Agora vamos incluir os músicos e vai ser lançado um livro-cd”, acrescenta o responsável. 

Além destas já tradicionais segundas-feiras de poesia, a programação conta também com novas apostas, como é o caso de um ciclo de performances todas as quintas-feiras, numa noite dedicada à performance artística/dança/música experimental, “pensada para ser disruptiva”. Em Abril, será o ciclo de performances “A Margem”, com a curadoria da performer Silvia Péra, todas as quintas-feiras, às 22.00.

O Pinguim Café abriu portas há quase 40 anos
@ Margarida SantosO Pinguim Café abriu portas há quase 40 anos

as sextas-feiras serão repartidas entre as Noites de Quiz (na segunda sexta-feira de cada mês) e a actividade “A Cave é Minha”, que acontece na segunda e na terceira sexta-feira do mês. Nesta iniciativa, o Pinguim Café desafia um artista ou personalidade associada à casa para fazer o que quiser na cave do espaço – desde concertos a actividades como pintura e leitura. No mês de Abril, foram convidadas as artistas Mafalda Maia (dia 11, às 22.00) e Sofia Bodas Carvalho (dia 17).

Na quarta semana de cada mês, está de regresso, 37 anos depois, o evento Soul Shake Down Party, ligado ao Soul, Reggae e Dub, com o Dj Bob Figurante aos comandos. A programação fica completa com os sábados de stand-up comedy e há ainda concertos todos os sábados e domingos à tarde, a partir das 18.00 (Rui David no dia 12 de Abril, Pedro Enes no dia 19 e Felipe Camolesi no dia 26).

“Queremos criar aqui uma família outra vez”

A ideia desta nova fase, sublinha Rui Spranger, é voltar a trazer “o lado mais de casa familiar do Pinguim”, em que se reconhece cada cliente que entra e há um atendimento personalizado. E, por isso, também na parte do bar há algumas novidades. Além da carta com mais de 80 referências de gins, servidos a preceito agora por Pedro Martins, há ainda uma garrafeira especializada em todo o tipo de destilados, cocktails ou cervejas artesanais, duas delas em exclusivo para o Pinguim. Para completar, o Pinguim tem agora um menu de petiscos assente em produtos regionais, sobretudo queijo e fumeiro, fruto de uma parceria com a quase centenária Queijaria Amaral.

O Pinguim Café é um dos bares culturais mais importantes do Porto
@ Margarida SantosO Pinguim Café é um dos bares culturais mais importantes do Porto

“O Pinguim, além de ser um espaço cultural, sempre foi tido como uma escapatória de muitas pessoas que trabalham na zona. Lembro-me perfeitamente de vir cá aos domingos, às segundas-feiras ou até às terças-feiras, e encontrar toda a gente que trabalha na área aqui do Porto. Vínhamos para cá, discutíamos aquilo que se tinha passado durante o dia, durante a semana, durante o mês, e juntávamos-nos”, explica Pedro Martins, acrescentando que o objectivo é também trazer públicos novos, sem nunca perder a essência do Pinguim. 

“Queremos que venham pessoas novas, de todos os estratos [sociais], de todos os locais, mas também queremos voltar a ter aquela dinâmica em que sabemos os nomes dos clientes, o que vão beber, etc. Queremos criar aqui uma família outra vez. Costumo dizer que isto não é um Pinguim 2.0, é mais um Pinguim plus: manter exactamente aquilo que era, manter a essência e a memória, principalmente do Paulo, mas trazer mais algumas coisas para cima da mesa. Voltar a pegar naquilo que foi, de certa forma, esquecido”, sublinha.

As mudanças que a cidade tem vindo a sofrer não são colocadas de parte e, explica Rui, tudo foi tido em conta, sobretudo na tentativa de captar público estrangeiro, que tem maioritariamente passado nesta zona. Ainda assim, alerta, "é importante manter os compromissos que este bar cultural tem com a cidade", uma vez que integra o programa de protecção de lojas históricas Porto de Tradição. "Nesta rua já quase não há moradores, portanto, também temos que, aos poucos, trabalhar o turismo. Não quero ultrapassar os 30% de clientes turistas. A oferta cultural é feita para os portugueses e isso também é o lado interessante do projecto. Mantendo as suas características e não cedendo ao imediato ou ao facilitismo. É um projecto de continuidade, de construção com o passado e a projectar um futuro”, garante.

Rua de Belomonte, 65 (Porto). Seg-Dom, 17.00-02.00.

+ Câmara do Porto quer apoiar três companhias de teatro com 145 mil euros

+ easyJet faz anos e está a oferecer viagens e descontos nos próximos dias

Últimas notícias
    Publicidade