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Foi numa casa do final do século XIX, localizada na Rua de Santa Catarina, que o Quarto Mundo renasceu. O projecto criado por Miguel Guedes e James Keating, aos quais se juntou recentemente Tiago Trigo, saiu há dois anos da sala que tinha na Rua Cândido dos Reis e encontrou agora um novo refugio, com a mesma essência: promover a escuta atenta em várias sessões onde a música pode ser experimentada através de um sistema de som analógico de alta-fidelidade, enquanto se aprecia um bom vinho do Porto ou um chá.
O caos da vida urbana fica do lado de fora. Nesta casa – que também é morada de ateliers e de um espaço de coworking –, escadas íngremes levam ao andar subterrâneo, onde se entra noutra frequência. A iluminação é acolhedora, o tecto é composto por vigas de madeira, as paredes são de granito e há almofadas prontas, bem como discos de vinil e equipamentos de som cuidadosamente colocados em diferentes ângulos, para que a escuta seja feita com a maior qualidade possível. Se quiser estar mais confortável, pode tirar os sapatos e deixá-los à entrada. “Queríamos um espaço intimista, onde não houvesse ruído exterior, onde as pessoas pudessem vir e estar focadas no que se está a passar”, explica Miguel Guedes.
Cada sessão de escuta tem a duração de duas horas e uma lotação limitada de 15 pessoas. O objectivo é que os participantes se sintam confortáveis e relaxados – deitados, sentados, de olhos fechados, descalços – enquanto escutam e sentem a música, muito diferente da que é passada noutros locais. “Passamos mais música ambiente, drone, jazz espiritual, tudo vibrações e frequências que convidam a um determinado tipo de estados. É relativamente comum as pessoas chegarem e adormecerem e depois acordarem passado um bocado. E penso que isso é também uma prova de confiança. As pessoas conseguem desligar um pouco do mundo exterior”, explica Tiago.
O Quarto Mundo surgiu em 2019, quando Miguel Guedes, técnico de som, e o irlandês James Keating se conheceram numa exposição e perceberam, quase de imediato, que partilhavam a mesma paixão pela música. Começaram a organizar algumas sessões temáticas para partilharem o reportório que foram acumulando ao longo dos anos, sem as distrações do mundo lá de fora. “O nosso mote é a escuta e isso é tão raro hoje em dia”, acrescenta o fundador.
As sessões neste novo espaço começaram oficialmente em Fevereiro deste ano, sendo que a nova programação arranca na próxima quinta-feira, dia 10 de Outubro, com Burnt Friedman como convidado, trazendo uma experiência sonora diferente, mas pensada com base na experiência das áreas da música electrónica, dub e jazz. Para reservar os bilhetes é necessário contactar o projecto através do Instagram, sendo que cada entrada tem o valor de 12€. Os concertos ao vivo são uma das novidades da rentrée e, no futuro, serão também convidados alguns DJs para colocarem música no Quarto Mundo, além de Miguel e de Tiago. Até ao final do ano há ainda sessões a 24 de Outubro, a 14 e 28 de Novembro e a 12 de Dezembro.
Uma “viagem contínua” dentro de quatro paredes
Tiago Trigo juntou-se ao Quarto Mundo no ano passado por uma coincidência do destino. Saiu da Suíça, onde estava a viver e a trabalhar, e procurava em Portugal um espaço onde pudesse pôr música. “Temos espaços interessantes, mas estava ainda um bocadinho frustrado, sem conseguir encontrar exatamente o espaço que queria. Descobri que havia umas sessões que estavam a ser feitas no Torto e fui lá até para ver se poderia pôr música. Foi lá que encontrei o Miguel e sentamo-nos a falar e a trocar algumas ideias”, explica.
Miguel, que também estava à procura de uma nova morada para o Quarto Mundo, juntou-se e reiniciaram o projecto na casa de família de Tiago, que decidiu reabilitar o edifício pelas suas próprias mãos, juntamente com a sua namorada, Sara Sampaio, também arquitecta e com quem fundou um atelier.
Cada sessão é “uma espécie de viagem contínua” durante duas horas, sendo que, refere Miguel, o objectivo é que tudo funcione à volta da escuta. “Através do som conseguimos unir aqui pessoas que vêm de contextos diferentes e que até têm preferências musicais distintas. Não quer dizer que quem vem aqui goste necessariamente de ouvir só este tipo de música no seu dia-a-dia. São pessoas que ouvem músicas distintas, mas depois vêm aqui à procura deste tipo de exposição, de determinado tipo de sons e de vibrações. Estão num sítio comum – em grupo ou com desconhecidos – e não têm que apresentar códigos de conduta. Aqui há silêncio, há escuta e podes ser livre, estar completamente descontraído”.
Rua de Santa Catarina, 771 (Porto). Qui, 21.30-23.30.
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