[title]
John Stonehouse foi um proeminente deputado britânico, do Partido Trabalhista, que exerceu funções como ministro durante o segundo governo liderado por Harold Wilson. Mas não foi por isso que ficou para a história. Stonehouse viraria o Parlamento ao contrário, após ter sido dado como desaparecido em Miami, para onde viajou sozinho e onde foram encontradas roupas e outros pertences seus numa praia, sem o político à vista. Obituários chegaram a ser publicados em alguns órgãos de comunicação social, embora poucas semanas depois Stonehouse tenha sido encontrado a largas milhas de distância, na Austrália, onde tinha entrado com um passaporte falso. A série estreou no início de Janeiro no canal britânico ITV1 e chega a Portugal esta terça-feira, 28 de Março, com a Filmin.
Estávamos em 1974, ano em que o poder no Reino Unido governava sem maioria absoluta. Ou seja, todos os assentos parlamentares eram fundamentais e o desaparecimento de Stonehouse fez mossa na política interna britânica. Mas esta história que agora chega à ficção inspirada na realidade foca-se nas alegações de que Stonehouse era um espião ao serviço da então República Socialista da Checoslováquia. Para disfarçar o dinheiro que recebia clandestinamente, começou a fazer alguns investimentos mais criativos, que não só quase o levaram à ruína como começaram a despertar a curiosidade das autoridades policiais. Vai daí… Miami. Isto embora uma das filhas de Stonehouse ainda hoje conteste as alegações de espionagem ligadas ao pai, que morreu em 1988.
A história não está apenas a ser recuperada à boleia deste argumento desenhado por John Preston, também autor de A Very English Scandal (por cá disponível na HBO Max), outra minissérie inspirada em trapalhadas da política britânica, criada a partir de um livro do próprio Preston e igualmente baseado numa história real. Curiosamente, a vida de espionagem e traições de Stonehouse foi recentemente recuperada nos documentários The Spy Who Died Twice (Channel 4, 2022) e The Real Stonehouse (ITV, 2023); e nos livros Stonehouse – Cabinet Minister, Fraudster, Spy (2021), de Julian Hayes; e Agent Twister: John Stonehouse and the Scandal that Gripped the Nation – A True Story (2022), de Keely Winstone e Philip Augar. Obras que Julia Stonehouse, a tal filha, contesta no seu site (www.juliastonehouse.com) no que diz respeito às suspeitas de espionagem. Escreveu mesmo um livro, John Stonehouse, My Father (2021), cuja promoção logo na página de entrada do site questiona: “onde estão as provas?”. “As pessoas podem dizer que John Stonehouse era um espião, porque ele não as pode processar, está morto e, por lei, os mortos não podem ser difamados, porque deixam de ter reputação a prejudicar. Isso deixa o caminho aberto para qualquer um dizer o que quiser sobre ele – mesmo quando não tem provas”, lê-se.
A série conta, portanto, e em três episódios, uma versão não autorizada da história. A realização esteve nas mãos de Jon S. Baird, o realizador de Bucha e Estica (2018). E o actor que veste a pele de Stonehouse é Matthew Macfadyen, cujo talento também pode ser apreciado em Succession (a quarta e última temporada estreou a 27 de Março na HBO Max), como Tom Wambsgans – papel que lhe valeu um Emmy e um BAFTA. O primeiro-ministro Harold Wilson é interpretado por Kevin McNally, pela segunda vez. A primeira foi no filme Lendas do Crime (2015), de Brian Helgeland. O papel da mulher de Stonehouse, Barbara, é da actriz Keeley Hawes, que na vida real é casada com Macfadyen (e já trabalharam juntos quatro vezes, em cinema e televisão). Numa nota de imprensa enviada pela Filmin, Macfadyen – que empresta algum humor a esta produção – admite que gostaria de perguntar a Stonehouse porque fez o que fez, concluindo: “Acho que nem ele seria capaz de responder a essa pergunta. O coração quer o que quer e, por vezes, não é capaz de raciocinar as coisas. Basta fazê-las.”
Filmin. Estreou a 28 de Março
+ Filme sobre o Estrangulador de Boston destaca as jornalistas que lideraram a investigação