Cresci no meio de peças de teatro. Li e vi muito. De Sófocles a Federico García Lorca. De Shakespeare a Anton Tchékov. Posso afirmar com um bocadinho de bazófia que de teatro até percebo um pouco. Contudo, não estava à espera de espectáculo quando fui almoçar com a minha mulher ao restaurante A Brasileira, recentemente integrado no hotel de cinco estrelas do grupo Pestana, que recuperou este emblemático edifício no coração do Porto. E até o La Féria lá estava com a sua comitiva. Através da janela, uma lona sobre a fachada do Teatro Sá da Bandeira anunciava que o encenador se preparava para apresentar Eu saio na próxima, e você?, uma peça com a Marina Mota e o João Baião. La Féria, soubesse eu, teria feito o mesmo.
Ao todo, contando com mais um casal que entretanto chegara, éramos oito pessoas num espaço onde caberiam pelo menos 40. Ainda assim, o serviço foi lento e pesaroso. Cheio de formalidades e de olhares reprovadores sempre que algum aprendiz levantava um prato ou talher na altura indevida. Bocejante. Sem falar da primeira abordagem em inglês. “Ah, pensei que eram estrangeiros.” Bem sei, menina, que pareço um deus grego e a minha esposa uma princesa nórdica mas, vá lá, já estávamos há dez minutos sentados e ela falou que se desunhou. Valeu-nos uma espanhola bêbada que começou a cantar em frente ao espelho e animou uma refeição desoladora.
Mas vamos ao que interessa. Julguei não ouvir lá muito bem quando descreveram o couvert. Como assim, manteiga com sabor a gomas? Inenarrável a sensação de estar a mastigar pastilha elástica em cima de um pedaço de pão branco sem graça. Um mau começo. Pedimos as empadas de carne. Não tinham. Dois maus começos. No seu lugar vieram uns agradáveis croquetes de carne fumada com um molho Samurai, apimentado e amostardado (9€). Já as batatas fritas gratinadas com molho de francesinha (4,50€) soaram melhor proferidas do que engolidas. Moles (pareciam ter sido fritas às 11 da manhã) num molho aguado.
O bacalhau à Brás com gema de ovo confitada estava bom, sem ser um espanto ou merecer uma ovação, com pedaços de azeitona verde desidratada que muito se assemelhavam a bolas de erva por moer – isso sim, teria sido divertido (12€). A presa de porco que se seguiu foi o momento wtf da refeição (10€). Dentro de cestos de bambu (daqueles onde se cozinham a vapor pãezinhos chineses) vinham dois massudos pães de Mafra, bocados tristonhos de alface Iceberg cortada desleixadamente e fiapos insultuosos de carne de porco cozida igualmente sem tempero.
A menina pousa mais molho Samurai e mais molho de francesinha e mais batatas fritas moles ao meu lado – O que raio faço eu com tudo isto?
Pedi as sobremesas esperançado. A tarte de maçã estava saborosa, com um bom gelado de caramelo, mas podia ter vindo em maior quantidade. O mesmo podia ter acontecido com a mousse de chocolate que não encontrei num prato composto por um gelado de baunilha básico, um creme de café enjoativo, um bolo de chocolate demasiado cozinhado e lascas de chocolate mole que deveria ter sido temperado (ambas a 5€). Queria ter batido palmas ao chef Rui Martins, mas talvez isso fique para um segundo acto.
*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.