Marcação feita para as 10.00, logo fui informado que a mesa poderia escorregar para as 10.30. Até aqui tudo bem, pois a gestão de expectativas é importante e só espera quem quer. Chegadas as 10.30 fui informado com uma simpatia artificial, tipo Casa dos Segredos, que ainda estava uma mesa à nossa frente e que teríamos de esperar mais um pouco. Às 11.20, e já estava eu a pensar que ia fazer uma crónica sobre gin, lá apareceu a mesa para o jantar xpto.
Pelo menos deu tempo para apreciar o espaço, que é realmente muito bonito e que faz lembrar um riade marroquino. Ou não estivesse integrado numa das alas do antigo armazém da antiga Fábrica de Cerâmica das Devesas, cujo edifício principal, na Rua José Falcão, é um dos conhecidos postaisdacidade.Todoo restaurante e bar contornam um fantástico pátio exterior, com arcadas em forma de ferradura, paredes revestidas a tijolo burro, azulejos ora lisos ora com bonitos relevos, num registo contemporâneo e fresco. Quanto ao mobiliário, uma boa parte é já conhecida para muitos, do antigo D ́Oliva em Matosinhos.
Infelizmente, muito pouco há mais a dizer de positivo deste Flow, que contrariando o nome, é tudo menos fluido. Na mesa um cesto de pão de milho e baguete banal e três manteigas com destaque para uma original de laranja e lima.
Para meu espanto, antes de as entradas chegarem, retiram a faca de manteiga usada e engordurada e colocam-na novamente em cima da toalha para que possa ser usada a mesma nas mesmas. O verniz começa a estalar.
No dia em que começava o Peixe em Lisboa, bem longe, iniciei com umas lulas da Patagónia salteadas (8€) que vinham num molho de manteiga fervida muito enjoativo, muitos coentros, tomate cereja vermelho e amarelo, microvegetais, entre os quais agrião. Com peixe de excelência a poucos metros de nós, não se justifica a origem das lulas. Eram um pouco elásticas, passadas de mais, tinham pouco sabor e apeteceu-me mandá-las para a terra delas.
O ceviche de peixe e gambas (9€) pouco tinha a ver com isso. Faltava cebola roxa, tinha pouco limão ou lima para dar acidez e, diga-se, cozer o peixe, faltava cebolinho e salvava-se apenas pela qualidade das gambas de porte médio. Umas agradáveis fatias de manga ajudavam a empurrar e tinha ainda uns inusitados nachos de milho não se sabe bem para quê.
Sugeriram-me um original confit de pato (16€). Aceitei para ver até onde ia a cozinha. Até nas coisas simples e fáceis falharam. Depois de mais 20 minutos para chegarem os pratos principais, a dita coxa aparece torrada de mais e acompanhada por uns desmaiados legumes grelhados e uma banal batata gratinada.
A saga continua num disparatado camarão tigre em forno a lenha (28€). O camarão pareceu-me ser de qualidade e óptimo porte, no entanto, o forno a lenha secou o marisco e tirou-lhe a suculência toda e sabor. Nem a manteiga de alho, tomilho, malagueta e limão o salvaram. Vinha com uma boa batata palha.
A madrugada ia adiantada e terminamos com o pudim de pão com gelado de Málaga (6€). O álcool dos licorosos de Málaga com sultanas embebia muito bem o brioche do pudim e foi o melhor da noite.
Paguei 50€ por pessoa, comi miseravelmente mal e fiquei cansado de tanta pretensão e disparate.
*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.