Muito se tem ouvido falar do oficina. Muito se tem lido sobre o Oficina. Muito se tem instagramado o Oficina – a provocação do painel com neon à entrada, um directo “Fuck Art Let’s Eat”, trabalho assinado por Filipe Marques, está lá mesmo a pedir a fotografia. Mas há mais: apesar de trendy, cool, kitsch e outros estrangeirismos que tais, o quarteirão da Bombarda não tinha até agora uma oferta na restauração tão séria. Por séria entenda-se assinada por um chef credenciado – Marco Gomes, ex-Foz Velha –, num espaço muito bem trabalhado e decorado – o projecto é do galerista Fernando Santos, figura incontornável da rua –, carregado de obras de arte – Pedro Cabrita Reis é só um dos nomes que tem intervenções no restaurante. Um daqueles sítios que chama a atenção da rua e onde apetece ficar quando se está lá dentro (de tão giro que é e de tão cómodas cadeiras que tem). Fosse na Foz e seria só mais um restaurante do momento. Aqui é “o” restaurante do momento.
Ora a fama e o falatório fazem, como é costume, com que aumentem as expectativas sobre o sítio. Ler elogios rasgados ao restaurante, idem. Tocar à campainha, ser recebida cheia de sorrisos e entrar para uma sala bonita, a mesma coisa. O sítio tem tudo para ser memorável.
E tudo me parecia bem até chegar o primeiro prato. Vieiras frescas na chapa com ovas de salmão, crocante de toucinho e manjericão (13€). Primeira vieira na boca e apanhei uns grãos de areia. Segunda vieira, mais grãos. E nada estraga tanto um prato destes quanto apanhar areia.
O jantar, que começava torto – broa do couvert seca e esfarelada, nenhuma das pastas do couvert (trufa, manjericão e presunto) acima do normal –, melhorava de seguida com uma alheira transmontana com grelos, ovo de codorniz e creme de pimentos assados (8€). A reinvenção do prato a torná-lo mais chique. Interessante o toque dos pimentos, boa a alheira, muito bom o conjunto, com a acidez da alheira e dos outros produtos bem equilibrada.
Mas, de tudo o resto que se provou, só mais um prato esteve a este nível – nível esse que se traduz em linguagem oral por “que bom”, “está óptimo”, “por mim podia vir outro igual”. Uma vitela de comer à colher com batata brava e grelos salteados (23€). Excelente, a desfazer-se na boca, com acompanhamento à altura.
Todos os outros pratos andaram na linha do normal. O taco de robalo do mar ao vapor, aromatizado com hortelã da ribeira e risoto de lima (21€) de afinidades mexicanas nada tinha. Era uma tranche de robalo a vapor, a peleavirtostadaemcima,sobreumrisotocom acidez e caldo a mais. O medalhão de vitela com escalope de foie gras, tarte de batata e molho pimenta rosa (24€), feito com carne maturada, não veio mal passado como se pediu, a tarte de batata estava seca a insossa. Salvaram-se do desastre a brunesa de legumes e o escalope de foie. E se uma das sobremesas até estava agradável – uma marquise de chocolate com gelado de framboesa – o mesmo não se pode dizer dos ovos falsos no ninho (6€). Um prato de bolinhas de mozarela com marmelada dentro, algo borrachosas, num ninho de canela e massa folhada, mais para o duro do que estaladiço.
Voltei dias depois ao almoço para o menu do dia. Serviram-me uma boa empada de frango e cogumelos com folhas do campo (isto é, rúcula), com massa estaladiça e o mesmo creme de pimentos do jantar; um salmão corado com batata assada e mostarda antiga simples e sem grande sabor; e um bolo de bolacha forte e muito amargo, que devia trazer um gelado de café, mas por lapso da cozinha, não trazia (19,50€ o menu com vinho e café).
Tudo somado, são poucos pratos surpreendentes, demasiados assim-assim e alguns com erros que um restaurante a estes preços não deve cometer. É pena a comida não acompanhar a qualidade da arte.
*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.