O almoço andava a ser adiado há tempo demais, coordenar agendas de gajas é pior do que aprovar um Orçamento de Estado num parlamento que não se entende. Por isso, quando a apanhei a jeito aqui no Porto (ela mora em Lisboa), arrastei-a até ao recém-aberto wine bar com petiscos da Rua das Flores.
Chegámos tarde, logo escapámos à enxurrada de turistas afogueados que acorrem aos bares de vinho da cidade como se esta fosse the ultimate experience. Relatos que, depois, imagino, partilhem efusivamente com os amigos e vizinhos back home.
Mas vamos ao que interessa. Lá dentro, uma placa dourada anuncia que a decoração ficou a cargo de Pedro Mourão Interiors. Há uma garrafeira iluminada, um mural de arte urbana desenhado pelos graffiters Third & Mots, e mesas feitas a partir de troncos de árvore. Tudo muito moderno, mas a roçar o rococó. Ela torceu o nariz ao aparato. E eu pensei que a conta ia ultrapassar o que tinha planeado para um almoço rápido entre amigas. Raios.
Optámos por partilhar três pratos e começámos pelo tártaro de atum com molho de soja (10€). A primeira desilusão. O peixe parecia congelado, uma vez que conseguia sentir a textura dos cristais de gelo a rebentarem-me entre os molares. Safou-se o sabor, com a gema a envolver o cebolinho, a cebola roxa, as microervas e umas tostas fininhas picantes a acompanhar.
Depois pedimos uma variação da francesinha (10€). Quando se trata de francesinhas não sou nada fundamentalista. Não saio por aí a bater com a mão no peito e a discutir se vem primeiro o bife ou a linguiça (eu sei, exilem-me, aceito a punição). Esta vinha gulosa, numa massa folhada amanteigada, com um bife da alcatra mal passado, bem no ponto, mais queijo e fiambre.
Contudo, o caso muda de figura quando tentam assassinar uma alheira. A tigelada da mesma com grelos e ovo roto (10€) tinha uma alheira seca e sem piada, vinha com uns grelos ácidos, mas como eu gosto, e um ovo cozinhado a baixa temperatura, um pouco ressequido, que não se quis envolver com o resto.
O almoço escapou da hecatombe e daquela pergunta condenatória – “Mas afinal não é no Porto que se come bem?” – à conta de uma incrível pavlova (6€). A pavlova, assim como os suspiros, que na minha opinião não passam de bombas de açúcar em esteróides, nunca me entusiasmou particularmente, mas esta foi a melhor que comi na vida. Estaladiça por fora e melosa por dentro, tem a doçura cortada por dois chutneys: um de frutos vermelhos e outro de maracujá.
Ela pediu um copo de água para acabar com aquela hiperglicemia gustativa, mas como a garrafa de um litro (3€), enchida debaixo torneira já tinha acabado, viemos a seco. E eu que julgava que a água não se negava a ninguém.
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