Um amigo francês, gourmet encartado, manda-me um SMS: “Onde posso comer boa comida tradicional no Porto?” Só vai ter uma oportunidade, escala para almoço entre dois voos.
Parece uma recomendação fácil. O que não falta na cidade são restaurantes tradicionais bons. Penso em várias casas de especialidades, umas mais taberneiras, outras mais sofisticadas. Em todas encontro falhas. Falhas conhecidas, que sei contornar ou tolero, como faz a clientela local. Mas falhas que facilmente perturbariam um parisiense alimentado a Michelin.
Às vezes, precisamos que tudo corra bem. Não é ter a refeição mais emocionante da nossa vida. É que tudo corra bem. Que os enchidos das tripas sejam bons; que o bacalhau tenha cura e gordura; que o cherne na vitrina esteja de olhos convexos e saia da grelha sem parecer um carvão esbardalhado; que o cabrito seja um cabrito; que o vinho tinto se sirva à temperatura correcta e em copos dignos; que as pessoas saiam do restaurante com o blazer sem cheirar a um exaustor que sugou o sarro de 30 doses de carapauzinhos fritos.
Parece simples. Não é.
Produto, técnica, serviço. Tudo junto. Sem falhas. Sem um dia mau.
Em Lisboa, quando este tipo de desafio acontece, a indicação óbvia é o Solar dos Presuntos. O Solar é uma máquina oleada de cozinha tradicional, com garrafeira e produto de nível Michelin. Falta um Solar dos Presuntos no Porto. Será? Eis que surge a resposta. “Rogério do E se um dia um estrangeiro exigente lhe perguntar qual o melhor restaurante tradicional para almoçar no Porto? Alfredo Lacerda responde. Rogério do Redondo Redondo, mon ami Jean-Pierre! Vous ne le regretterez pas.”
O Rogério do Redondo, sem posh e sem vinhos a mil euros, é uma escolha segura. Fiz lá quatro refeições este ano, duas pré-Covid, duas já durante a pandemia.
O único defeito que encontrei aos almoços foi a economia excessiva nas opções. Sobretudo as entradas: são poucas e são pouco estimulantes. Na mesa, espera-nos sempre salpicão e um queijinho de ovelha de pasta mole e os restantes intróitos mantêm-se na charcutaria.
Nos principais, uma dúzia de possibilidades, o que é razoável. Fora os dois bifes, o costeletão de boi na brasa e os secretos de porco preto, encontrei lá vários nomes sonantes do cartaz nortenho e uma ou outra raridade nacional. Cabritinho com grelos, caras de bacalhau, galo caseiro estufado com ervilhas, filetes de peixe galo com açorda de ovas (com um pão mais sério, seria ainda melhor), cabidela de galinha, tripas. Só de ler, dá fome.
Na cozinha, há atenção aos pontos de cozedura, seja do arroz seja dos peixes. Na sala, há atenção ao cliente, mesmo quando a lotação está esgotada – e está esgotada muitas vezes e isso, ainda assim, é tranquilo, porque as mesas estão dispersas como num almoço de salão dos bombeiros.
Já de regresso a Paris, o meu amigo estrangeiro envia-me a sua recensão: “Oh là là. C’était magnifique!” Effectivement, Jean-Pierre.
*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.