Perguntaram-nos se queríamos o couvert, uma gentileza que não se encontra em todos os lugares. Na maior parte dos sítios espetam-te com ele à frente e se respirares sobre o cesto debitam-te sumariamente o conteúdo na conta. Mas aqui, comer o couvert deveria ser uma imposição. Como a sopa, quando somos pequenos. Enquanto não rapares o prato, não há bife ou sobremesa para ninguém.
O pão do Typographia Progresso do chef Luís Américo, que é uma espécie de rei Midas, já que transforma em ouro tudo em que toca – basta ver os casos de sucesso do restaurante Cantina 32 e do Puro 4050, que recebeu cinco estrelas de um dos críticos da Time Out –, é artesanal e feito ali mesmo, como fizeram questão de me garantir.
Barrei um pouco de manteiga de alho negro e paprica sobre um pão de batata doce fofo e saboroso, ainda quente. Não mentiam sobre a qualidade do couvert. Este trazia ainda broa de milho, pão de alfarroba, azeitonas temperadas com citrinos e uma tacinha com alioli onde carregaram fortemente no alho. Desapareceu tudo enquanto o diabo esfregava um olho (2€/pessoa).
Bebericámos dois copos – um Papa Figos branco, acidulado, e um tinto encorpado e quente (5€/copo) – e apreciámos a decoração enquanto não chegavam as entradas. Neste restaurante, com uma carta que espelha influências do mundo, funcionara em tempos uma tipografia e é possível ver por lá as máquinas de impressão bem enquadradas no espaço, decorado em tons verde-garrafa, preto e dourado. Um relógio de parede de proporções abissais deixou-me ligeiramente desconfortável, a sentir-me o coelho da Alice no País das Maravilhas com pressa de chegar a algum lugar.
Primeiro veio a salada japonesa de algas wakame com soja e sésamo, fresca, mas pouco entusiasmante (5€). Depois, um salmorejo (3,50€), uma sopa cremosa espanhola, da região de Andaluzia, feita com tomate, pão, alho, azeite e muito vinagre, como esta, aconselhável apenas a espíritos apreciadores de sabores fortes, e que me fez lembrar a mesma sopa que um ex-namorado me preparava. Era um ás na cozinha, pena que não tenha funcionado...
Para pratos principais pedimos uma moqueca brasileira com arroz de grão longo, muito solto, quase a fugir do garfo, e um molho a saber a coco e a tomate, onde nadavam camarões cozinhados no ponto (15€). O cachaço de porco arrancou mais aplausos (16€). Vinha tenro, cheio daquela gordura boa que o torna tão saboroso e que lhe permite ser comido à colher. Ao lado, umas tiras de polenta sequinhas e estaladiças e uns brócolos crocantes rematavam o conjunto. Ambos os pratos estavam muito bem feitos, com os ingredientes cozinhados na perfeição, mas que na minha opinião pediam um pouco mais de arrojo. Afinal é Luís Américo, não é um chef qualquer.
A vontade foi-me feita à sobremesa. Américo juntou duas receitas tradicionais portuguesas: pêras bêbadas cozidas em tawny, e aletria. O resultado foi um belo contraste entre a massa fria com a fruta quente, tudo na dose certa de açúcar, com um toque simples de genialidade (4€).
*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.