A oferta cultural portuense é vasta, apesar de, por vezes, escapar ao radar dos mais distraídos. E no que diz respeito a museus, não podíamos estar melhor servidos, já que a quantidade e a qualidade falam por si só. Estão espalhados por todos os recantos da Invicta e há para todos os gostos e épocas, da escultura à imprensa, e do futebol à pintura, pelo que visitá-los devia ser instituído como uma disciplina obrigatória nas escolas do país ou como programa não-facultativo aos fins-de-semana. Para lhe facilitar a vida, preparámos-lhe o roteiro dos melhores museus do Porto, para (re)descobrir a História e as estórias que conservam.
Está a chegar aquele que tem tudo para ser um dos grandes acontecimentos da agenda cultural de 2019: o DDD + FITEI, ou seja, a aliança entre o DDD – Festival Dias da Dança e o Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica (FITEI), duas das mais importantes e pujantes mostras de artes performativas do país. À quarta e à 42ª edição, respectivamente, o DDD e o FITEI celebram, pela primeira vez, uma parceria de programação e comunicação que visa não só rentabilizar esforços mas, sobretudo, fortalecer e diversificar a apresentação de espectáculos internacionais e valorizar as artes performativas portuguesas.
Apesar da denominação, os festivais mantêm o seu ADN, a sua própria identidade programática. “Não se trata de uma junção, mas sim de uma potenciação”, assinala Gonçalo Amorim, director artístico do FITEI. “Quando falo disto, as pessoas ficam entusiasmadas porque é um pouco contracorrente: normalmente os festivais rivalizam, tentam abafar-se.” Deste encontro nasceu um projecto comum que cruza os dois festivais: a Semana + (8 a 12 de Maio), um programa multidisciplinar dedicado à criação artística nacional, com foco na dança e no teatro. “Para essa semana convidámos programadores nacionais e internacionais para descobrir o que estes criadores andam a fazer”, explica Tiago Guedes, director artístico do DDD. Apesar de o panorama artístico contemporâneo em Portugal estar cada vez mais vibrante, a projecção e a circulação internacional dos artistas portugueses é algo que precisa de ser trabalhado, acreditam os programadores. “Há um grande desconhecimento do que são as artes performativas portuguesas”, refere Gonçalo Amorim.
A outra linha programática partilhada pelo DDD e pelo FITEI é o Foco Brasil, sem dúvida um dos pontos altos e diferenciadores deste superfestival. Este ciclo congrega coreógrafos, encenadores, dramaturgos e intérpretes jovens e consagrados do Brasil em mais de uma dezena de espectáculos que reflectem, na sua maioria, a profunda polarização político-social do país. Se, por um lado, o governo de extrema-direita de Jair Bolsonaro e os seus apoiantes estão a contribuir activamente para a proliferação e normalização da violência sistémica contra pobres, negros, indígenas, mulheres e pessoas LGBTI, por outro lado há um forte movimento de resistência e de disputa de espaços, de lugares de fala. Uma força revolucionária que, na verdade, já se mobiliza há vários anos, mas que está a ser cada vez mais ameaçada – artistas incluídos.
“Todos estes artistas são artistas de resistência”, diz Gonçalo Amorim relativamente às propostas do FITEI para este Foco Brasil. Numa edição que tem como âncora temática o “Brasil descolonizado”, o festival quis ir “ao encontro de artistas que lutam pela descolonização material e do pensamento”, com trabalhos que “espelham o afropolitismo, o feminismo, as questões de género, os corpos não-normativos”, descreve o responsável.
Se no FITEI o recorte politizado da programação e a relação com o Brasil não são novidade – afinal, o festival já serviu de refúgio para artistas exilados durante a ditadura militar do Brasil, bem como a do Chile –, já o DDD nunca assumiu uma posição política de forma tão clara. “Sim, podemos dizer isso”, concorda Tiago Guedes. “Política no sentido em que vamos poder ver que palavra é que os artistas têm hoje e o que dizem sobre o que se passa no Brasil”, continua o programador. “Os criadores estão a trabalhar em piores condições mas com muita força, e urge apresentá-los e apoiá-los.” Paralelamente aos espectáculos, há outras actividades que dão continuidade a esta reflexão, como a conversa Mulheres em Te(n)são, a 4 de Maio no Rivoli, com as brasileiras Nayse Lopez, Alice Ripoll, Lia Rodrigues e Linn da Quebrada, esta última cantora, performer e activista trans que dará também um concerto nesse dia.
À boleia do DDD, regressam ao Porto criadores consagrados como Lia Rodrigues, Marcelo Evelin, Christian Rizzo, Vera Mantero ou Tânia Carvalho, sem esquecer a presença de jovens coreógrafos portugueses e nomes menos óbvios que merecem a nossa atenção, como Amalia Fernández ou a companhia sueca GöteborgsOperans Danskompani, que apresenta no Coliseu Autodance e Skid, dois espectáculos para o grande público. Já no FITEI, onde o programa de residências, oficinas e encontros aparece reforçado, o protagonismo do Brasil é equilibrado com criações nacionais e latino-americanas. Entre os espectáculos altamente recomendáveis encontra Preto, de Marcio Abreu/ Companhia Brasileira de Teatro, cujo elenco conta com a célebre actriz Renata Sorrah e a actriz e dramaturga Grace Passô; Ela Sobre Ela, da dramaturga uruguaia Marianella Morena; ou Parasomnia, uma instalação/ performance sobre o sono (ou a falta dele) de Patrícia Portela, em que os espectadores podem dormir.
Feitas as apresentações, ficam as perguntas: será que o Porto tem pedalada para quase 70 espectáculos em cinco semanas? Há espaço para respirar? “Acho que o DDD + FITEI é também uma resposta à forma como o Porto se mobilizou à volta das artes performativas. A realidade de hoje é muito diferente da de há cinco anos”, observa Tiago Guedes. “A programação é muito diversa, muito texturada artisticamente e nas suas dimensões. Vamos ver como resulta.”