Cinco Minutos. Foi o tempo necessário para perceber que Olga Noronha é alguém muito fora do comum. Tem um vocabulário e uma sintaxe perfeitas, mesmo depois de tantos anos a viver fora do país. Uma energia inesgotável – “sempre fui uma miúda hiperactiva”, corrobora. E uma imagem irrepreensível. Quando chegámos ao ateliê andava em arrumações, com o cabelo em tonalidades vermelhas e azuis preso no topo da cabeça, e os lábios pintados, pronta para qualquer eventualidade.
Olga tem 28 anos, nasceu no Porto e é uma das joalheiras mais irreverentes que temos por cá. Faz joalharia medicamente prescrita, um projecto tão ousado quanto ela, mas já lá vamos.
“A joalharia apareceu quando eu tinha seis anos, por causa da moda dos fios e das missangas”, ri. “Mais tarde, comecei a pedir aos meus pais fios e arames. E quando tinha oito ou nove anos, numa viagem ao Brasil, gastei o meu dinheiro todo em pedras semipreciosas, como topázios e ametistas”, conta. As histórias sucedem-se e Olga prende-nos à conversa. “A minha paixão era evidente. Trabalhava com tanto afinco que me esquecia de comer. Tinham de me arrastar até à mesa, caso contrário, ficava ali. Ainda hoje isso acontece. Volta e meia a minha mãe aparece por aqui e enfia-me uma banana na boca só para eu não cair para o lado”.
Estudou joalharia contemporânea na Escola Artística de Soares dos Reis e aos 17 anos foi para a Central Saint Martins College of Art & Design, em Londres, onde o seu trabalho final “Dirty Tissues” foi considerado o melhor entre os 600 daquele ano. A universidade acabou por juntá-lo ao seu espólio privado.
Mas a primeira vez que Olga pisou uma escola de joalharia aconteceu, obviamente, de forma inusitada. “Contaram aos meus pais que ia abrir uma escola de joalharia para miúdas no Porto, a Engenho & Arte. Fomos lá, mas disseram-nos que não podiam aceitar alguém tão novo. Num determinado momento da conversa, a minha mãe fica com calor e tira o casaco. Assim que fez este movimento, revela um colar feito por mim. Os olhos da mulher com quem falávamos foram directos ao pescoço da minha mãe, encantada com a peça. E foi assim que com 11 anos me tornei a mais jovem aluna da escola de sempre”, ri.
Olga regressou ao Porto no ano passado, depois de uma década em Inglaterra. Hoje dá aulas e dirige o curso de joalharia da ESAD, tem um papel activo na ModaLisboa e é a criadora do projecto Joalharia Medicamente Prescrita, que transforma algo que a priori seria rejeitado pelo corpo, em algo desejado.
“É um projecto transdisciplinar que junta engenharia biomecânica, ortopedia, a área do meu pai, joalharia, antropologia, sociologia... Crio peças, como por exemplo um colar cervical, uma bengala, uma placa de fixação óssea, personalizados e sempre com participação médica”, explica, acrescentando que, se ao fim de um determinado período de tempo a prótese for retirada, ela lhe dá uma nova vida. “A peça pode ser reaproveitada para um anel, colar ou pulseira. O processo de cura acrescenta-lhe valor.”