Luís Salgado
Músico, Maus Hábitos
É difícil falar do Maus Hábitos sem mencionar Luís Salgado, programador do emblemático e ecléctico espaço portuense que junta, numa simbiose perfeita, música, arte, comida, bebida, café e festa. Curiosamente, a parceria de sucesso, que foi oficializada em 2014, nasceu de um acaso.
“Antes de qualquer outra coisa, sou músico e, desde a abertura deste projecto cultural, em 2001, que vinha cá actuar com as bandas que integrava. Com isto, acabei por conhecer o Daniel Pires, que é o dono. Quando me preparava para comemorar um aniversário redondo [em 2012], desafiado por uns amigos que questionavam a minha capacidade de organizar um festival, perguntei-lhe se me deixava fazer aqui a celebração. Ficou reticente, é certo, mas lá me cedeu a sala principal”, começa por contar.
O resto pode dizer-se que é história. Com uma programação composta, essencialmente, por bandas de amigos, Salgado superou todas as expectativas e, no ano seguinte, voltou a festejar o aniversário com um minifestival. “Nessa espécie de segunda edição, já tinha o Maus Hábitos todo disponível e consegui trazer alguns grupos mais conhecidos para actuar. Aí, o público chegou perto das 2000 pessoas. Algumas tiveram de ficar à porta”, acrescenta.
Em Abril, cerca de três meses após a realização do evento, Pires fez a pergunta que mudou tudo: “Consegues fazer isto todas as semanas?” Apanhado de surpresa, o músico escolheu a via da sinceridade. “Disse-lhe que não sabia, até porque me faltava experiência e conhecimento em programação, mas estava disposto a tentar. Foi assim que, sem nunca ambicionar, me tornei programador”.
A pouco e pouco, Luís, natural de Tomar, mostrou que tinha realmente jeito para a coisa. “O facto de estar no mundo da música, ainda que apenas como artista, facilitou, até certo ponto, o trabalho. O demais fui aprendendo com o tempo”. A capacidade de juntar à sua volta pessoas novas terá sido um dos motivos do sucesso. “No primeiro mês, dediquei-me a fazer reuniões com todos os colectivos que havia na cidade para perceber o que estava a acontecer à nossa volta e como estes grupos podiam fazer coisas aqui, de concertos a clubbing e artes plásticas”, explica o profissional. Tudo para devolver a velha glória ao Maus Hábitos.
“Já éramos uma instituição no Porto, porém, tivemos um período mais complicado do qual queríamos recuperar. A ideia era voltar a estar sempre entre as primeiras opções de quem queria sair à noite e ser um ponto de referência não só de qualidade, mas de liberdade e experimentação”.
Salgado também tratou de levar o projecto para fora de portas. “Enquanto espaço físico, com muita pena minha, não temos como crescer. Então começamos a apostar na realização de eventos noutros sítios. Surgiram assim, por exemplo, os Concertos de Bolso, na Feira do Livro, e o circuito Supernova, que promove actuações fora do Porto. Até porque, sendo de uma cidade pequena, sei bem o que é ter de me deslocar para ir a concertos. Com estas iniciativas, conseguimos levar iniciativas a sítios em que, sem o apoio de uma marca conhecida e consolidada, seria mais difícil. No fundo, quisemos democratizar a arte ao torná-la mais acessível a todos”.
Cerca de uma década após o início deste percurso, o músico faz um balanço positivo. “Ainda há muito que queremos fazer, mas há uma série de objectivos já conseguidos. Nomeadamente, ser um espaço em que todas pessoas se sentem bem e livres para ser quem são, independentemente da idade, orientação sexual, género, nacionalidade ou preferência musical. Actualmente, é comum ver punks a beber cocktails no Beyoncé Fest e quem ouve Death Metal também ouve pop, por exemplo, o que era impensável num passado não muito distante”.
Da programação dos próximos meses, vale destacar o concerto de Cabrita (2 Fev). Depois de um aclamado disco de estreia (2020), o saxofonista apresenta Umbra, "que difere do seu antecessor pela abordagem mais sombria, relacionada a questões circundantes à nossa existência - a dos vivos - e à maneira como nos mantemos por cá".
Igualmente imperdível é o espectáculo de Wakadelics (16 Fev), grupo de Viana do Castelo conhecido por explorar vários estilos musicais. Naquela que é a sua primeira actuação no Maus Hábitos, a banda apresenta Mau Olhado, o mais recente EP.
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