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Sentado num caixote do lixo verde, igual àqueles que vê espalhados pela cidade e que futuramente será parte de uma obra de arte, Artur Bordalo (aka Bordalo II) faz uma pausa nas montagens para falar connosco. Mas, antes disso, olha para o macaco gigante para ver se está a ficar como tinha imaginado, um check up rápido àquela que é a peça que dá as boas-vindas aos visitantes da sua exposição “Attero”, que inaugura este sábado, no Beato.
“O aterro é o fim da linha. Agarramos no fim da linha, que é o lixo que passa por todo um ciclo económico e social, e transformamos isso em matéria-prima”, explica. Artur pega no lixo, aliás, no desperdício — como prefere chamar-lhe — e cria arte com ele. “Lixo é aquilo que supostamente não serve para nada, mas eu pego nesse lixo e crio alguma coisa. O que prova que o lixo, se for separado, pode ser reaproveitado, por isso é desperdício.”
Esta é a primeira grande exposição em nome próprio do artista, que abre ao público as portas do seu ateliê, na Rua de Xabregas, quase uma segunda casa onde a magia acontece. É lá que o artista vai fazer uma espécie de retrospectiva pelos corpos de trabalho que tem desenvolvido ao longo dos anos (estima-se que já tenha reutilizado umas 28 toneladas de desperdício), sempre com uma premissa base: uma crítica à sociedade consumista e à forma como exploramos, muitas vezes de forma abusiva, os recursos da Natureza. “Interessante é nós agarrarmos numa coisa que já não é nada, em lixo, e conseguir que ela seja alguma coisa e que transmita uma mensagem. sobre um problema”, diz. “ O que eu faço é uma chamada de atenção, tento sempre que haja um espírito crítico construtivo nas minhas peças. Não é apenas o design ou o sentido estético que interessa, a obra está no espaço público e tem de ter uma mensagem de forma a comunicar com a sociedade é o fundamental.”
As obras de arte que falam para que passa:
A Time Out acompanhou a montagem da peça principal do "Attero". Passo a passo, uma obra de arte a nascer do desperdício que pode ver neste vídeo.
Cada peça fala para si mesma e fala com as pessoas — é essa a mensagem que o artista pretende passar. “Entre a obra e a pessoa existe um discurso. Quando vemos a peça de longe, a imagem é reconhecível, mas quando nos aproximamos damos de caras apenas com o material de que são feitas, esse tal lixo. É uma distância que se cria, e depois a proximidade e a mudança radical da interpretação daquilo que lá está. Tudo isso é um discurso”, afirma.
E o material, esse de onde vem? De aterros ilegais, por exemplo, ou de fábricas e até mesmo da rua. Se Artur e a sua equipa encontram coisas interessantes tudo se aproveita.
Artur sabe que a sua arte — como todas — não dura para sempre. E o facto de estar exposta no espaço público torna-a ainda mais vulnerável. Mas isso não o preocupa. “Nada dura para sempre. Acho que é importante, durante um período de tempo, a peça fazer o seu papel crítico. No meu caso faço coisas a partir do lixo e depois elas voltam a ser lixo passado alguns anos a serem arte, não me incomoda porque é um ciclo.”
Conhecido pela série Big Trash Animals, Bordalo II traz mais do que isso ao “Attero”. A exposição vai desvendar o processo criativo de Artur desde as suas peças maiores — basta olhar para a foto aqui ao lado— às mais pequenas, em forma de maquete onde reinam os animais em vias de extinção. Patente até 26 de Novembro, data em que há uma visita guiada com o artista, a exposição é de entrada livre e com tertúlias, visitas temáticas e o lançamento de um livro marcados na agenda.
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