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Quando a austeridade acerta em cheio no país, Jorge é um homem à beira do KO. No novo filme de Marco Martins, não há santos nem milagres que valham a um pugilista a braços com dramas pessoais e cobranças difíceis. Durante dois anos, Nuno Lopes, o protagonista do título que se estreia esta semana nas salas de cinema, preparou o físico e ensaiou uma chuva de directos e ganchos num ginásio na Avenida de Ceuta. Falámos com Paulo Seco, o treinador de boxe que acabou a fazer dele próprio nesta fita.
Foi a primeira vez a dar formação a actores?
Com cinema, foi uma estreia. Com actores, não. Tivemos que preparar um actor para uma novela; tinha que ganhar corpo e estrutura. Mas não metia boxe nem nada.
Quando começou o seu envolvimento neste projecto?
O trabalho de pesquisa do filme começou em 2011. Na altura não sabia com quem ia trabalhar. Vieram ter comigo da produção, iam fazer um filme sobre um pugilista. Só lá para frente é que soube quem era o realizador e o actor. Quando me disseram que era para avançar, apresentaram-me o Marco e o Nuno. O filme foi gravado em 2015.
Como funcionavam os treinos?
O Nuno treinou afincadamente durante dois anos. Começou em 2013, por aí. Claro que não podia vir todos os dias, porque tem o seu trabalho. Vinha umas três vezes por semana.
Quando o viu pela primeira vez achou que tinha potencial ou nem por isso?
Achei que tinha potencial, é um actor empenhado e gostei de trabalhar com ele. Já lhe disse que devia haver um São Jorge II, porque o filme acaba mal, na minha opinião, e temos que dar a volta à situação. Se há um Rocky dois, três, etc., porque não há sequela do São Jorge?
Faz sentido. Ele continuou a treinar depois das gravações?
Não tem vindo treinar, mas continuamos a falar. Depois do boom do filme, dos prémios, nem sempre tem tempo, mas passa pelo ginásio e telefona. É um dos melhores profissionais que está aí. Levou os treinos mesmo a sério.
Aplicou-lhe os exercícios habituais?
Sim, fez contacto com os atletas e houve algumas situações em que estávamos a ver que aleijávamos o Nuno.
O que aconteceu?
Foi num exercício, sem querer. Aleijou-se e teve que ir ao hospital. Estava tudo ok. E as pessoas não sabem mas nas filmagens também se aleijou. Quando há lutas, há alguma tensão. Aquilo mais parecia um combate real porque as partes levaram aquilo a sério. Faltou pouco para ficar ali alguém a dormir.
Com quem foi esse episódio?
Com um rapaz advogado. Tocou-lhe com a cabeça no nariz. Baixaram a cabeça ao mesmo tempo. Foi aí que apanhámos um susto. Era chato aparecer com o nariz partido. O Robert de Niro também fez filmes de boxe e teve que ter cuidados.
O Nuno Lopes dava luta?
Dava, dava. Aprende facilmente. Saltou à corda, fez exercícios de aquecimento, sombra, bateu no saco.
É na Avenida de Ceuta que Paulo Seco lidera o seu Boxing Club. Se tomou o gosto e quer ver um combate, ou vários, ao vivo e a cores, reserve já na agenda o dia 1 de Abril. O treinador é um dos organizadores do evento de boxe profissional no Boa Hora Futebol Clube. Rui Pavanito, Pedro Matos e Bruno Pereira são os cabeças de cartaz.
É fácil ensinar?
Costumo dizer que o boxe é fácil de ensinar. Ensino a qualquer pessoa. Combater é que já é mais complicado. Todos sabemos dar um soco num saco. Isto é como levar um carro todo torto à oficina e sair de lá com ele em melhor estado.
Como reagiam os outros atletas?
De forma normal. Não é o primeiro actor que treina connosco. Há músicos e outras figuras públicas. Treinamos o João Pedro Pais e muitos outros.
Não poupa em elogios. E pontos fracos?
O ponto fraco é não ter tempo para treinar mais. É um atleta que evolui rapidamente. Todos nós temos a ideia que as mulheres sabem saltar à corda e os homens não. O Nuno aprendeu isso rapidamente. Até a parte de fazer plastron; ele não se esquece das sequências. Uma pessoa não desaprende, pode apenas ficar enferrujada. O próprio Marco ficava admirado com a prestação do Nuno.
Mais uns treinos e estava pronto para o ringue?
Estava, estava. Hoje não, porque não faz nada desde 2015. Mas se a progressão dele fosse esta, sim.
Em que categoria?
81 quilos. Meio pesado. Tem uma boa estrutura.
O Paulo já viu alguma coisa do filme?
Não, só algumas coisas através do Facebook. Estive com o Marco esta semana e está supercontente. Estou curioso. Eu participo como treinador do Nuno. Faço o meu papel de treinador.
Como foi a sua estreia? Contava com isto?
Eh pá, não (risos). O Marco disse-me que o filme devia ser o mais real possível. Boa parte do elenco, de actores não têm nada.
Deu-se bem com a experiência?
Nunca me disseram para falar assim ou assado. A parte chata era ter que estar constantemente a repetir as coisas. Eu só fiz o meu papel.