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Roubando a ideia ao título do novo livro do jornalista português Nelson Nunes (N.1986), e apesar de o trabalho incluir conversas com 12 chefs, não há aqui nada que se assemelhe a uma receita propriamente dita. Há um Miguel Castro e Silva a descrever um prato que confeccionou em casa - “...fiz uma infusão de azeite com colorau e alho, depois fiz um caldo com os legumes e as cabeças. Cozinhei o peixe no caldo, com a infusão, deixei reduzir e fiz um género de pil pil (p.185).” - há um Leonel Pereira a descrever a criação de um prato chamado Estrela-do-mar (p.269) e há uma ou outra achega a pratos especiais que podem ser provados nos restaurantes destes chefs. Mas o livro é tudo menos um manual para se aprender a cozinhar com alguns dos grandes nomes da nossa praça.
O que é então? Ensina a olhar para o negócio como eles olham; a pensar a gastronomia como eles pensam; a formar equipas como eles formam; a descobrir como se traçam caminhos como os deles. Sem ciência exactas, claro, antes à custa de trabalho, criatividade, viagens, boas equipas, experimentação, coragem. Espremendo as 12 entrevistas feitas – pelo que se percebe, todas na Primavera deste ano –, há, pelo menos, esses pontos em comum aos cozinheiros escolhidos. São eles: Susana Felicidade, Alexandre Silva, Miguel Rocha Vieira, Miguel Laffan, Leonel Pereira, Henrique Sá Pessoa, Vítor Sobral, José Avillez, Marlene Vieira, Ana Moura, Rui Paula e Miguel Castro e Silva.
Ora isto é a base. Depois, e citando o próprio escritor logo no arranque do livro, há o “objectivo de conhecer as motivações artísticas e conceptuais destes que são alguns dos melhores chefs a operar em Portugal.” (p.16). Uma forma de traçar as linhas da gastronomia no país – ou em Lisboa, já que à excepção de Leonel Pereira, todos eles têm restaurantes na capital – com recurso a uma série de entrevistas transformadas em capítulos que intercalam citações com anotações do autor, um leigo em gastronomia, admite.
A criação do livro obedece a uma bateria de perguntas sobre as primeiras memórias dos chefs na cozinha; o utensílio favorito; o palato ser inato ou treinado; a violência nas cozinhas; a definição de alta cozinha; por aí fora. E apesar de ser o objectivo do livro, torna-se, lá para o quarto capítulo, algo cansativo e repetitivo. A estrutura dos capítulos é construída sempre na mesma linha, com a infância, entrada na cozinha e percurso dos chefs, para apenas depois entrar num lado mais conceptual de questões relacionadas com empresário-cozinheiro, construção de pratos, cozinha como arte (ou não), o peso da Estrela Michelin, por aí fora. Sorte a do leitor que isto são pessoas com histórias mirabolantes, percursos totalmente diferenciados, vidas e origens diferentes.
Há, pelo meio, detalhes engraçados e curiosos do trabalho de cada chef, há confidências e episódios caricatos e há um lado de biografia de pessoas que apesar de constantemente presentes na imprensa da área, poucas vezes têm espaço para mostrar que tipo de percurso levou ao que fazem hoje.
Fica sem se perceber como é que Nelson Nunes chegou a esta lista final de chefs, com cada vez mais nomes a operar em solo português, que é em si variada em géneros e idades, logo em histórias e caminhos – outro ponto a aligeirar a repetição de perguntas. A experiência de uma Ana Moura, com 32 anos, é, como não podia deixar de ser, bem diferente, da de Vítor Sobral, com 50.
É, por isso, um livro engraçado para quem quer conhecer mais os meandros da cozinha de chef, saber mais sobre os chefs de Lisboa e descobrir como cada um deles pensa a gastronomia.
Livro: Isto Não É Um Livro de Receitas
Preço: 16,59€
Editora: Vogais
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