Quando chegámos, ainda antes da inauguração, na sexta-feira passada, algumas pessoas tentavam encaixar parte do mural nas imagens sacadas por máquinas fotográficas ou telemóveis.
Instalações, pintura, serigrafia e até curtas-metragens – poucas formas de expressão artística são estranhas a André, que agora se aventurou por um dos grandes símbolos nacionais: a arte de azulejaria.
188 metros de comprimento, 1011 m2 de área e 52 738 mil azulejos – nem mais, nem menos – pintados à mão. São estes os números da última obra de André, que ganhou reconhecimento nos anos 90 com o seu alter ego Mr. A, uma personagem que substitui o tradicional tag dos artistas urbanos e que na altura invadiu algumas cidades europeias. O ponto de partida foi Paris e hoje o artista luso-francês, que também responde por Monsieur André, é um artista global com um corpulento currículo que inclui exposições no MOCA (Los Angeles), no Grand Palais (Paris) e no MUDE, por onde passou em 2014, com uma exposição com 200 peças.
Foi precisamente por altura dessa exposição que André Saraiva confessou a Bárbara Coutinho, directora do MUDE, o sonho de fazer um mural gigante de azulejos. Passearam por Lisboa e, ao passarem pelo Jardim Botto Machado, André perguntou se podia ser mesmo ali, naquele muro.
Daí passaram à captação de parcerias. O painel é uma iniciativa da Câmara Municipal de Lisboa e da Junta de Freguesia de São Vicente e promovido pelo MUDE, que tem por missão contribuir para a afirmação do design e criatividade nacionais. A estes junta-se um peso pesado nacional, a Fábrica Viúva Lamego. Tudo foi feito segundo a técnica de fabrico nacional de azulejos, com uma diferença: em vez de serem azulejos delicadamente pintados à mão, ali vai encontrar grandes pinceladas que remetem para a técnica do graffiti. É um mundo imaginário, uma espécie de Andrepolis.
O dia da inauguração foi o primeiro em que o artista viu o seu trabalho na vertical. Até aí tinha-o visto ganhar forma no chão da fábrica, onde no último ano e meio contou com a ajuda de uma equipa de artesãos. O desenho que dá a volta a todo o jardim reinterpreta Lisboa, mistura o passado e o presente, pondo lado a lado caravelas e cruzeiros, redesenha Pessoa, espelha o Elevador de Santa Justa, o Castelo de São Jorge e o Cristo-Rei. O Frágil está lá, diferente; uma carrinha da Vigor, pequena, lá vai andando; tal como uma grua que não foi esquecida. Lisboa aqui também é francesa, com a Torre Eiffel e um livro do poeta francês Jacques Prévert, tudo com o céu e o Tejo como pano de fundo. E muitos, muitos Mr. A.
Perguntámos a André se já tinha feito alguma obra desta dimensão. “Em spray já fiz trabalhos maiores, mas com esta quantidade de trabalho não. E este é para sempre.” Esperemos que sim.