Por volta das 18.00 do segundo dia de ModaLisboa, os desfiles ainda vão a meio e o evento está a bom ritmo, mas Ana Roque di Pinho já se foi embora. Andou a fotografar nos bastidores desde as 15.00 — pouco antes de começarem os desfiles de sábado — e saiu direita à LxFactory onde revela as fotos que andou a fazer em película. Sair cedo é por isso a única opção para conseguir expôr as fotos no dia seguinte na Workstation, o espaço da semana da moda lisboeta onde três fotógrafos convidados pela organização mostram o seu registo do evento. Um work in progress onde se vão mostrando as imagens mais marcantes dos dias anteriores por três olhares muito diferentes.
Com Pedro da Silva e Arlindo Camacho é diferente. Ficam os dois até tarde, até aos últimos desfiles — não usam película e a revelação pode ser mais rápida. Isto se não contarmos com as horas de edição depois de chegar a casa. “Provavelmente num dia com grande acção faço perto de 1000 imagens”, diz Arlindo Camacho, também fotógrafo da Time Out Lisboa. Para as paredes da Workstation escolhe dez, a preto e branco, com muitos contrastes. Pode passar dois desfiles no mesmo sítio muito específico, à espera de apanhar o instante de que estava à procura, com um determinado movimento ou uma determinada luz. “À medida que vou fotografando sei as fotos que fiz. Mas eu não vou para casa ver se encontro alguma imagem, eu sei o que fiz e vou ter com aquela imagem [na edição].”
Começou a fotografar a ModaLisboa em 2008 como fotojornalista para o Diário de Notícias e em 2011 expôs pela primeira vez na Workstation, na segunda edição deste projecto. É o fotógrafo que mais vezes participou nesta área da ModaLisboa, quase sem interrupções, e por isso está a preparar um livro para reunir a memória do evento. “Não há ninguém que se ponha a posar para mim nos meus trabalhos. O principal é que a pessoa que eu estou a fotografar não repare na minha presença. Faço isto há dez anos e devo saber o nome de um único manequim. Nunca falei com nenhum e provavelmente nunca conversei com nenhum”, explica sobre a maneira como anda pelos bastidores. “Não tenho o objectivo de fazer nada relacionado com moda, não me interessa fotografar peças de roupa e por isso é que opto pelo preto e branco, não me interessa tirar partido das texturas e da cor. O objectivo é desconstruir as ideias que existem à volta da moda. Para mim o manequim pode estar com um olho aberto e outro fechado, com a boca torta que para mim pode ser uma foto válida.”
Na Workstation há modelos a olhar para a câmara, mas nas fotografias de Pedro da Silva que encheu o registo do primeiro dia da 50.ª edição da ModaLisboa de retratos — grandes planos ou o corpo inteiro no movimento de quem se atira ao desfile. “Fui ver um pouco o trabalho que a ModaLisboa desenvolveu a nível gráfico [nesta edição] e eles jogaram muito, tanto nos cartazes como nos vídeos, com os fundos pretos. Procurei bastante jogar assim com as luzes e criar um conceito mais intimista, sem muito ruído, mais simples, com o modelo com cor e o fundo escuro”, explica Pedro que começou a fotografar o evento em 2014, para o designer Luís Carvalho, e participou já em outra edição da Workstation.
A ideia de Pedro é apanhar o modelo meio distraído e rapidamente, numa ligeira pose não muito construída. “Não há muito tempo, pego na máquina, regulo o obturador, a abertura, tenho o flash, faço um ou dois testes e tento usar mais ou menos os mesmos sítios para ter sempre uma boa fotografia”.
Fora do contentor ao pé do Pavilhão Carlos Lopes onde Arlindo e Pedro expõem as suas fotos, num segundo contentor, estão as imagens de Ana Roque, com cores primárias fortes inspiradas pela imagem desta edição de ModaLisboa. Adivinha-se o analógico e Ana confirma. “É uma opção estética, é mais fácil atingir estas cores e mostrar o seu contraste e ao mesmo tempo a sua harmonia”. Nestas fotografias há retratos de modelos de costas, com ganchos e papéis a proteger o cabelo, outros a experimentar roupas enquanto alguém testa baínhas e afins. “O meu objectivo é chegar ao imperfeito, desconstruir a ideia de que as pessoas têm dos modelos e da moda”, explica Ana Roque di Pinho que entra na Workstation pela primeira vez nesta edição.
Por volta das três da tarde de domingo, o último dia de ModaLisboa, esta exposição fotográfica com o seu quê de reportagem volta a crescer com as fotografias do segundo dia, sábado. Depois fica tudo no site da ModaLisboa: o imperfeito, o inesperado e as imagens onde a roupa não interessa.