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Dez bandas indie pop que todo o caçador de Pokémons deveria conhecer

Apesar da globalização, da World Wide Web e do YouTube, muita música continua a circular em áreas restritas. É o que se passa com a pop japonesa, que é quase completamente desconhecida no Ocidente, apesar da sua extraordinária vitalidade

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Nunca os jovens ocidentais estiveram tão fascinados pela cultura pop japonesa como hoje, mas o interesse concentra-se no manga, no anime, nos jogo de computador, no cosplay, no karaoke e na ParaPara Dance, e a música pop made in Japan é quase invisível, se exceptuarmos a que está associada a bandas sonoras de anime populares, e que tende a ser plastificada e estridente.

A verdade é que a pop japonesa parece satisfeita com o mercado interno – 127 milhões de habitantes, com elevado poder de compra – e portanto é cantada (salvo raras excepções) em japonês e os websites das bandas e das editoras oferecem informação apenas em japonês. O uso do japonês tem outra consequência: a fonética é tão diferente da inglesa que nem sempre casa bem com as linhas melódicas típicas do pop-rock anglo-saxónico e o carácter staccato e áspero do japonês soa desagradável à maioria dos ouvidos ocidentais. Nem na pop mainstream nem na pop indie (por vezes designada como J-indie) subsistem hoje marcas evidentes das tradições japonesas: a maioria das bandas limitou-se a assimilar o modelo anglo-saxónico e a reproduzi-lo na perfeição. Há porém vários aspectos extra-musicais em que a J-indie difere da indie pop ocidental.

Uma das mais óbvias é a participação feminina: na Europa ou nos EUA, a dominância masculina é esmagadora, apesar de tanta medida e discurso em favor da paridade de género; e não só são poucas, como surgem quase sempre o papel de cantora (mais raramente como teclistas). No Japão também há predominância masculina, mas as raparigas surgem frequentemente como guitarristas, baixistas e bateristas, apesar de o Japão ter tido uma tradição de menorização do papel da mulher ainda mais sufocante do que o Ocidente e que durou até mais tarde – talvez os sociólogos e antropólogos tenham explicação para o paradoxo. Outro aspecto evidente na indie pop japonesa é a invulgar quantidade de bandas formadas por adolescentes dotados de mestria técnica e maturidade no songwriting e nos arranjos, quando a maior parte da miudagem ocidental está, com essa idade, ainda na fase do punk rupestre.

Uma vez que as canções e discos só costumam ter títulos em japonês, quando, abaixo, se mencionam os seus nomes usa-se uma tradução inglesa aproximativa (e que poderá variar segundo as fontes consultadas). Muitos dos discos indicados são mini-álbuns (meia dúzia de canções, meia hora de duração) um formato pouco corrente no Ocidente, mas popular entre as bandas de J-indie. As discografias dos grupos não são extensivas.

+ Está aí a festa do Japão

Dez bandas indie pop que todo o caçador de Pokémons deveria conhecer

People In The Box

Origem: 2003, Fukuoka
Membros: Hirofumi Hatano (voz, guitarra), Kenta Fukui (baixo), Daigo Yamaguchi (bateria).
Discos: Rabbit Hole (2007), Frog Queen (2007), Bird Hotel (2008), Ghost Apple (2009), Citizen Soul (2012), Ave Materia (2012), Wall, Window (2014).

A banda adoptou nome inglês mas canta em japonês – e fá-lo com desenvoltura, pois sabem, como poucos, encaixar a sua língua na urdidura da pop anglo-saxónica. Os People In The Box até serão familiares a muitos fãs de cultura pop japonesa no Ocidente, pois uma das suas canções, “Seijatachi”, faz parte da banda sonora da popular série de anime Tokyo Ghoul, a partir do manga homónimo.

[“Translation Machine” e, a partir dos 5’47, “Seijatachi” (Saints), de Wall, Window]

Kinoko Teikoku

Origem: 2007, Tóquio
Membros: Chiaki Sato (voz, guitarra), A-chan (guitarra), Shigeaki Taniguchi (baixo), Kon Nishimura (bateria) Discos: Whirpool (2012), Eureka (2013), Long Goodbye EP (2013), Fake World Wonderland (2014), Cat and Allergy (2015), Ai No Yukue (2016).

As boas canções de Kinoko Teikoku estão ao nível de qualquer coisa que os Ride, os My Bloody Valentine ou os Slowdive tenham feito. É um misto de dream pop e shoegaze, combinando belas e tristes melodias (a que a voz expressiva de Chiaki Sato confere frequentemente uma tonalidade trágica) com alta energia, distorção adstringente (cortesia de A-chan), vórtices sónicos e psicadelismo suficiente para justificar o nome da banda, que significa “Império dos Cogumelos”. A excepção é Fake World Wonderland, onde tentaram explorar outros registos e acabaram por produzir canções bem mais mainstream.

[“Eureka”, do álbum homónimo]

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Atlantis Airport

Origem: 2012, Tóquio
Membros: o núcleo central foi constituído por Sonezaki (voz), y0den (teclas) e BONO (baixo), que têm trabalhado com diferentes bateristas e guitarristas; porém, BONO já não entra nas canções mais recentes.
Discos: A [ ] Passport EP (2014), A [360º] Cosmic Flight EP (2015), Rembrandt Rays (2016, split EP com os Marmalade Butcher).

Um improvável casamento entre a ingenuidade da pop, a complexidade do rock progressivo e os labirintos rítmicos do math rock. O trabalho de composição vem sobretudo de y0den, o teclista – por uma vez, o rumo não é diatado pela guitarra, que é remetida a papel secundário – mas muita da frescura da banda vem da azougada vocalista Sonezaki.

[Três canções, ao vivo no Rock In Japan Festival 2014: A primeira é “AnTi pOp ARt”, que foi a primeira demo da banda e é uma das suas canções mais originais e enérgicas]

Uchu Conbini

Origem: 2012, Kyoto; dissolvidos em 2015
Membros: Emi Ohki (voz, baixo), Daijiro Nakagawa (guitarra), Uto Sakai (bateria).
Discos: Feel the Dyeing Note (2013), I Looked By the Reflection Of the Moon (2014).

Uchu Conbini significa algo como “Loja de conveniência no espaço exterior” e, com efeito, é pouco plausível que os Uchu Conbini sejam do nosso planeta, pois as suas canções de precisão micrométrica não condizem com miúdos com ar de não ter idade legal para poder comprar cerveja. Aos ritmos intricados da bateria e ao tapping mirabolante da guitarra somam-se as melodias oníricas na voz, numa perfeita síntese math pop.

[“Pyramid”, de Feel the Dyeing Note]
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Ame no Parade

Origem: 2012, Kagoshima (o extremo sul do Japão); mudaram-se para Tóquio em 2013.
Membros: Kohei Fukunaga (voz), Kosuke Yamazaki (guitarra), Ryosuke Korenaga (baixo), Mineho Osawa (bateria).
Discos: Sense (2014), New Generation (2016), Stage (2016).

O nome da banda significa algo como “Parada da Chuva” (será uma homenagem aos Rain Parade?) e a música é indie pop melódica e suave. No Ocidente o estereótipo de género determina que até as bandas maioritariamente femininas costumam ter um baterista masculino, mas nos Ame no Parade a baterista é uma rapariga (e não está lá por razões “decorativas”, pois dá bem conta do recado). O grupo é assessorado por um artista plástico, um estilista de moda e uma designer de joalharia e os seus videoclips dão testemunho do cuidado posto na imagem da banda (digamos que é a aplicação à pop do conceito de Gesamtkunstwerk).

[“Petrichor”, de Sense; “petrichor” não é uma palavra japonesa, vem do grego “petra” + “ichor” e denota o “odor que se liberta da terra seca após a chuva”]

Aquarifa

Origem: 2007, desde 2012 com esta formação, Kanagawa, área metropolitana de Tóquio.
Membros: Iwata Machi (voz, guitarra), Matsukawa Shinya (guitarra), Takuto (baixo), Rintarou (bateria) Discos: Scene (2012), Tsukiakari no Seinishite (2013), Ma-ni no Himitsu (2015).

O nome mistura alusões a água e a luar e a música tem um núcleo de furiosa energia hardcore envolvido num halo de distorção shoegaze.

[“Switch”, de Tsukiakari no Seinishite, que significa algo como “a culpa é do luar”]
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Otori

Origem: 2013, Tokyo
Membros: Kobara Sae (voz), Hino Tetsuya (guitarra), Miyata Wataru (baixo), Hada Masaya (bateria)
Discos: I Wanna Be Your Noise (2014).

A banda mais desalinhada e inclassificável desta selecção, funde, a alta temperatura, noise pop, post punk, no wave e hip hop. Kobara Sae, a vocalista, tira partido do carácter staccato da língua japonesa para criar um registo rap que rivaliza em alucinação com o de Mike Doughty, dos Soul Coughing, e a guitarra de Tetsuya evoca as bizarrias sónicas de Tom Morello, dos Rage Against The Machine.

[Canção não-identificada num concerto não-identificado]

Infelizmente, a banda não tem (ainda) videoclips e os registos ao vivo disponíveis na internet têm má qualidade de som e imagem, pelo que se deixa aqui uma amostra breve do seu único disco. E sim, também nós queremos que os Otori sejam o nosso ruído.

[Excerto de I Wanna Be Your Noise]

Quruli

Origem: 1996, Kyoto
Membros: Após várias mudanças de formação, o núcleo criativo é actualmente formado por Shigeru Kishida (voz, guitarra) e Masashi Sato (baixo).
Discos: 11 álbuns de estúdio, sendo o primeiro, Sayonara Stranger, de 1999 e o mais recente de 2014. Os álbuns Zukan (2000) e Team Rock (2001) foram produzidos por Jim O’Rourke (produtor e/ou colaborador de Sonic Youth, Wilco, Smog, Joanna Newson).

Os Quruli fazem figura de veteranos e vedetas entre as jovens e obscuras bandas desta selecção, pois Kishida nasceu em 1976 e Masashi em 1977 e têm atrás de si uma extensa discografia e reconhecimento generalizado. O seu som tem vindo a aproximar-se ao mainstream e alguns críticos apontam o início deste século como o seu pico criativo e lamentam que a banda tenha, desde então, caído na modorra.

[Versão ao vivo de “Highway”, uma das canções mais célebres da banda, composta originalmente para a banda sonora de Joze to Tora to Sakana-Tachi (Josee, the Tiger and the Fish, 2003), do realizador Isshin Inudo]
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Chouchou Merged Syrups

Origem: 2011, Kyoto
Membros: Kawato Chiaki (voz, guitarra), Yoshikuza Shota (guitarra), Toriishi Rota (baixo), Takagaki Ryosuke (bateria).
Discos: Since (2013), Clepsydra (2014), Yesterday, 12 Movies Later (2015).

Sob este nome desconcertante (talvez faça mais sentido em japonês) há math rock frenético e, por vezes, muito denso, que se abre para deixar ouvir melodias pop.

[Uma canção de Yesterday, 12 Movies Later]

Shojoskip

Origem: 2006, Tóquio
Membros: Chisato (voz, guitarra), Takashi Otsuki (guitarra), Chisato (teclas, coros), Kouki Arai (baixo), O-isshi (bateria).
Discos: Sweet Days/Her Last Kiss (2008, split com os My Dead Girlfriend), Cosodorokitsune (2012).

Dream pop e shoegaze, com influências de Stereolab, mais evidentes nos temas cantados; a maior parte da indie pop japonesa pode não abrir novos caminhos, mas o que faz está à altura dos seus modelos e canções como “Glory of the Snow” podem ser equiparados ao melhor dos Stereolab.

[“Glory of the Snow”, de Cosodorokitsune]
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