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Espero o autocarro, entretido com o painel digital da paragem. “Em 2024 reciclámos 17.022 toneladas de vidro”. Ora aí está uma coisa de que os 547 773 lisboetas se devem orgulhar. Sabendo que um vasilhame de 0,75L pesa 550 gr, dá umas 56 garrafas de vinho por cabeça. Individualmente, posso garantir que contribui com mais do que isso. Mas o que conta é o trabalho de equipa.
O anúncio remata: “Ajude-nos a manter a cidade limpa”. É o que em marketing se chama call to action. Soa a título de filme com o Chuck Norris, mas é na verdade um mecanismo de comunicação eficaz: depois de inspirar o receptor, induz-se um comportamento.
Ora, a mensagem aqui parece-me razoável. Alegadamente, estamos todos a fazer um bom trabalho e por isso é-me pedido que, enquanto cidadão, seja um consumidor consciente e que, se beber, conduza a garrafa ao destino certo. Certíssimo.
Novo cartaz. “Lisboa devolve o teu IRS”. É uma mensagem curta e directa, simplificada sem faltar à verdade – e ainda me trata por tu, coisa que me faz sentir jovem e eu agradeço. Desde 2008 que todas as câmaras podem atribuir um desconto de até 5% no IRS aos seus munícipes. Chama-se Participação Variável no IRS. Moedas escolhe dar-nos uns trocos todos os anos e isso é bom.
No IRS de 2024 Lisboa ainda se vai abotoar com 0,5%, mas para o ano será um dos 43 municípios a abdicar inteiramente do imposto. É uma espécie de cashback para sócios e acho que nem o Benfica dá tanto.
Mas é aqui que eu começo a enxofrar. O que tenho à frente é uma peça de campanha a sete meses das eleições. Nada me diz sobre o que preciso fazer para beneficiar de um direito; o que devo fazer para cumprir um dever; ou o que posso fazer para cooperar no bem comum. E essas são, em geometria simples, as linhas que separam a comunicação pública da comunicação política.
Outro cartaz: “+2000 chaves de casa entregues”. Ponto. Fico a pensar se apenas dão um jogo de chaves a cada inquilino ou se inclui suplentes. Mas mais uma vez a questão que me inquieta é que nada na mensagem que o governo da cidade me dirige, utilizando meios públicos em espaço público, é mais do que publicidade política. Sem o logo da autarquia, podia bem ser um reclame às Chaves do Areeiro.
O mesmo se poderia dizer do catrapázio que informa “Lisboa faz o maior investimento de sempre na habitação, 560 milhões de euros” (mais de mil euros por habitante, realmente muito guito); ou do outro que proclama: “Lisboa mais inovação, melhor emprego”. Não existe nestas mensagens informação útil ao cidadão, mas é claro onde querem chegar. É como a palavra catrapázio: também não existe mas toda a gente a entende.
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