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Os Artistas Unidos abrem a temporada com O Vento num Violino, do argentino Claudio Tolcachir e encenação de Jorge Silva Melo.
A Darío custa-lhe arrancar, diz a mãe do rapaz de 30 anos. À mãe, Mecha, executiva endinheirada e bem falante, custa-lhe que o filho não arranque, que trapaceie o psicólogo, que por sua vez é uma marioneta de Mecha, que lhe pagou o consultório. Num plano paralelo – tão paralelo que o consultório e as duas casas propostas se confundem entre sofás, mesas e uma cama, numa espécie de desarrumação funcional – há uma outra família, a de Dora, empregada doméstica de Mecha, mais a sua filha Celeste e a namorada Lena, que exasperam por um filho.
Estamos em O Vento num Violino – do argentino Claudio Tolcachir, cujo original já havia estado em Matosinhos e no Festival de Teatro de Almada, em 2013, e que é a última parte de uma trilogia dedicada a histórias de amor de enredo caótico – uma peça em ruínas, duas famílias de pessoas desamparadas que o dinheiro separa e que a tragédia tentará unir. Foi esta a forma escolhida pelos Artistas Unidos, mais uma vez com encenação de Jorge Silva Melo, para abrir a temporada no Teatro da Politécnica, já a partir desta quarta-feira.
E tal como aqui, onde se confunde divã de paciente e sofá de filho e de mãe que não sabe do segundo sapato, também, pelo menos para Jorge Silva Melo, há em Tolcachir uma série de misturas interessantes: “Ele não hesita em misturar baixa e alta cultura, teatros de boulevard e Bach, efeitos fáceis com complexidade narrativa, é um teatro também plebeu, e eu disso gosto, disso vivo”, afirma.
Vivo sentir-se-á Darío – que até aqui andava mais moribundo, entre o ódio aos colegas de curso bem mais novos que entram no mercado de trabalho e o desejo de ser assistente de Santiago, ajudá-lo nos casos dos pacientes mais difíceis – quando cair na teia do jogo de Celeste e Lena, que em desespero o escolhem como pai do seu filho. Pai mero gerador de espermatozóides, entenda-se, e que será obrigado a fazer sexo com Celeste de faca encostada ao pescoço, que Lena não está aqui a brincar. Igual a dizer que quer tanto um filho que comete este crime macabro. Como dá para perceber, a salvação não anda aqui perto.
“O teatro de Tolcachir apresenta-nos as histórias daqueles que não estão na História. Não são os fotogénicos marginais que os suplementos semanais tanto exploram em fotografias e notícias com as suas tragédias. São pessoas sem tragédia, anónimas, sem história, até podíamos dizer sem interesse: são aqueles que, na vida real, não vemos, nem temos cinco minutos para ouvir. Gosto dessas pessoas, sei mais ou menos como são”, diz-nos Jorge Silva Melo.
Voltando ao enredo, claro que um crime destes – ainda que cometido sobre um jovem de 30 anos enrolado num manto de preocupação maternal – não ia cair em esquecimento. E aí, Mecha, já em versão furacão, vai tratar de esclarecer que assim, como está, é que isto não vai ficar, e que para ninguém ser preso a criança não ia crescer no bairro problemático onde ficava a casa de Dora. O problema é que também não ficará como Mecha idealizou. E aí talvez o dinheiro já não ajude grande coisa.
Ter-Qua 19.00. Qui-Sex 21.00. Sáb 16.00, 21.00. 6-10€.