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É, provavelmente, o balcão mais pequeno da cidade – quatro pessoas já é demais –, mas nem por isso o menos concorrido. À hora do almoço, a fila fala por si. Nada que assuste José Rodrigues, o homem que comanda a frigideira à janela, onde as finas fatias de carne de porco se envolvem num molho sem segredos: vinho branco, banha e alho. A arte está na facilidade com que tudo é feito, sempre a olho, sempre certeiro. Eis As Bifanas do Afonso, casa com quase 50 anos de história, na Rua da Madalena.
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O senhor Afonso, como é conhecido por ali, reformou-se e José entrou em campo, já passaram sete anos, praticamente. À semelhança de Afonso, também José é da aldeia de Covas, em Vila Nova de Cerveira – podia ser apenas um detalhe, mas é mais do que isso se nos lembrarmos que durante muito tempo, e para os clientes mais antigos, este cantinho no Largo do Caldas tinha como nome Bar Covense.
“Venho aqui desde os 15 anos, era só velhotes, a beber o seu copito. Agora é uma máquina de fazer dinheiro”, diz um cliente habitual da casa, em tom de brincadeira, enquanto espera pela sua sandes com queijo da Serra (2,50€), como já não se vê em muitos sítios. “Nada disso, é uma máquina de trabalho, isso sim”, responde José, com um olho no balcão e outro na frigideira. Passa pouco das 11.00 e já tem pedidos seguidos de bifanas (2,70€).
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É sempre assim, garante. Bifanas logo de manhã, perguntamos? “Claro, desde as 08.00.”
De manhã, a janela para o Largo do Caldas, que serve como um segundo balcão, ainda está fechada. Abre à hora do almoço, quando os turistas se amontoam. Há quem não saiba ao que vem e acabe, por exemplo, a pedir uma bifana com uma meia de leite, como vimos acontecer com umas turistas asiáticas. “Bifana com leite? Não faça isso”, não hesita em responder o empregado. Perguntam-lhe o que beber: “Cerveja!”. “No, no.” E resolvem com um sumo. A verdade, diz José, é que mesmo assim são cada vez mais aqueles que chegam com a lição estudada. “Hoje em dia, com as redes sociais, a informação passa, já sabem o que querem. É uma vantagem, de certa forma”, destaca o responsável. “Já vêm com as fotos, querem pataniscas, querem aquilo, e aqueloutro.” Mas as bifanas é que são o bestseller, quase sempre acompanhadas de uma imperial, lá está. Ajuda o destaque que alguns nomes conhecidos lhe dão, como o chef Nuno Mendes, que começou a fazer bifanas no seu restaurante de Londres, O Lisboeta, apontando sempre esta casa com uma referência. A propósito, José vai buscar uma revista: “Não é qualquer tasca que sai no Financial Times. Nós estamos aqui em destaque a reboque do Nuno Mendes.”
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Já os locais, esses, sabem que podem sempre pedir pela porta da Rua da Madalena, havendo espaço até conseguem comer lá dentro. Até porque esses são menos. “O turismo é que é o boom do dia. Os outros são sempre mais ou menos os mesmos, mais dez, menos dez”, conta José, lamentando a falta de concorrência na zona. “É pena, abrem muitas casas novas, mas não é nada disto.”
As Bifanas do Afonso mantêm-se quase como um último reduto de uma Lisboa que vai desaparecendo no tempo. “Há alguma pressão imobiliária, mas por enquanto, vamos resistindo”, garante o responsável. “Não tem sido difícil, tem corrido bem. Tem havido uma actualização de rendas. Acho que isso é mais que justo. As coisas têm de normalizar, também não é justo rendas de 50€. Daí as coisas agora terem mudado, para nós e para outros.” Não há, porém, motivo de alarme, assegura.
Rua da Madalena, 146 (Baixa). Seg-Sex 08.30-18.30, Sáb 09.00-13.30