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Belém e Trafaria ganham peças em cortiça de assinatura

Projecto City Cortex é inaugurado esta quinta-feira, 6 de Junho, e conta com intervenções de Souto de Moura, do suíço-americano Yves Béhar ou do atelier nova-iorquino Leong Leong.

Rute Barbedo
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Rute Barbedo
Jornalista
Instalação Lily Pad, do atelier Leong Leong
Francisco Romão PereiraInstalação Lily Pad, do atelier Leong Leong
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O trabalho de explorar a cortiça como material antigo e ao mesmo inovador quanto à sua aplicação no espaço urbano começou há alguns anos, mais precisamente em 2008, conta por telefone à Time Out Guta Moura Guedes, fundadora da experimentadesign, para explicar como as oito peças que agora podemos ver e sentir nas zonas ribeirinhas de Belém e, na margem oposta, da Trafaria resultam de um longo processo de maturação.

Entre elas estão a segunda pele de uma árvore (Second Skin, do estúdio americano Diller Scofidio + Renfro) a impulsionar a leitura e partilha de livros em espaço verde e público, na proximidade da Biblioteca Municipal de Belém; um espaço lúdico e de repouso (Lily Pad, desenhado pelo atelier nova-iorquino Leong Leong) nos jardins do Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia (MAAT), onde também se ergue uma torre de boas-vindas aos visitantes (o Port_All desenhado por Yves Béhar); ou a conversadeira (porque nem sempre namoramos) proposta por Eduardo Souto de Moura, o único português do octeto criativo do City Cortex, projecto que se inaugura esta quinta-feira, 6 de Junho, como uma afirmação multiangular da cortiça enquanto material primordial para melhorar a relação dos cidadãos com o espaço urbano.

Port_All, de Yves Béhar
Francisco Romão PereiraPort_All, de Yves Béhar

“Nós, autarcas, cidadãos, decisores, turistas, desconsideramos durante muito tempo o espaço público. Houve muitas dimensões de que simplesmente nos esquecemos e prova disso é o facto de as cidades não estarem actualizadas. Por outro lado, esquecemo-nos da diversidade de materiais que existe. Estivemos durante anos obcecados com materiais artificiais”, critica Guta Moura Guedes. Mas, se houve esquecimento, não se deu uma paragem total. “A tecnologia desenvolveu-se, permitindo chegar a soluções muito interessantes, como a mistura da cortiça com betão, e a peças que podem ser usadas no exterior.” Eis o quadro ideal para que a cortiça, material natural, altamente resistente apesar de suave ao toque, térmica e acusticamente interessante, pudesse ser vista como uma solução para as cidades, em vários planos.

Aprender a cortiça de novo

O City Cortex surgiu do convite da corticeira Amorim a Guta Moura Guedes. “Já tínhamos trabalhado juntos em dois projectos de investigação e eles vieram ter comigo porque queriam ir mais longe. Estamos muito habituados a ver a cortiça em garrafas ou revestimentos de paredes interiores, por exemplo, mas não no espaço público”. A pergunta era: por que não?

Humpbacks, de Sagmeister & Walsh, no Espelho d'Água
Francisco Romão PereiraHumpbacks, de Sagmeister & Walsh, no Espelho d'Água

Em parceria, a Amorim e a experimentadesign convidaram designers, arquitectos e outros criadores, com diferentes visões sobre a vivência urbana, para reimaginar (em muitos casos, numa abordagem site-specific) a nossa relação com a cidade pública se lá tivéssemos estruturas que nos permitissem usufruir dela como um lugar de conforto, uma segunda casa. “Foi um desafio para todos, mesmo para Souto de Moura, que já conhecia a cortiça muito bem, mas que teve de aprender a trabalhar com as suas novas potencialidades”, conta a curadora.

Além de irem aos locais onde agora se fixam as novas peças de mobiliário urbano (grande parte a título efectivo, com excepção do colchão do Espelho d'Água, de que já falaremos, e das peças do Museu de Arte Popular), em muitos casos, os criadores visitaram contextos de fábrica e foram à raiz da matéria, os sobrais.

Regenerar um túnel, envolver moradores

Se em grande parte dos projectos a proposta foi aproximar os cidadãos do espaço público ou melhorar as possibilidades de relação com o mesmo, no caso do túnel que passa por baixo da linha de comboio de Cascais, na zona de Belém, a intervenção dos designers de comunicação Sagmeister & Walsh veio “regenerar um equipamento que estava em más condições, esquecido”, avalia Guta Moura Guedes. Dando atenção às propriedades de isolamento sonoro e térmico da cortiça, a dupla desenhou painéis para o tecto do túnel, transformando o espaço.

Os mesmos criativos pensaram também em como apresentar alternativas ao plástico na cidade e, para isso, criaram o colchão Humpbacks (uma espécie de baleia), que vai estar numa primeira fase no Espelho d'Água, em Belém, mas que depois poderá ser utilizado em piscinas ou praias, como incentivo à diversão.

A biblioteca Second Skin, do estúdio Diller Scofidio + Renfro
Francisco Romão PereiraA biblioteca Second Skin, do estúdio Diller Scofidio + Renfro

Já na Trafaria fica assente outra grande questão da actualidade: a urgência em criar sombras onde o calor é uma ameaça à saúde pública, ao conforto e ao simples acto de estar. Com Onda, o arquitecto Gabriel Calatrava mudou a Praceta Porto de Lisboa, acrescentando-lhe uma cobertura (com intervalos de respiração) em cortiça. Mas decidiu não fazê-lo sozinho. Chamou o colectivo americano CAL e a comunidade da Trafaria (com o apoio da associação local EDA) a colaborar no projecto. “A comunidade participa na instalação, trazendo de suas casas para o espaço expositivo cadeiras já sem uso que serão renovadas através de uma membrana de cortiça, não só numa óptica de reutilização e reciclagem, mas também com o intuito de que a população local se relacione emocionalmente com o espaço, criando as suas próprias referências”, pode ler-se na descrição do projecto. Sobre a surpresa da cortiça, em específico, o arquitecto acrescenta: “É um material fantástico para o público utilizador", pela sua "flexibilidade, resistência e suavidade ao toque".

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