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Lisboa: não imagino uma outra cidade para morar senão aqui.
Quando estudei nas Belas Artes fui um ano para fora, para Milão. Lembro-me de vir a casa de férias e de repente te achar uma cidade de brincar. As cores, o tamanho dos prédios, das ruas e avenidas.
Lisboa: não te deixes iludir pela fama e pelo dinheiro.
Vivo num bairro com o mundo inteiro, muito perto do centro. Há nesta zona da cidade duas ruas onde morei na infância, duas ruas onde morei enquanto estudava, outra quando comecei a namorar e finalmente a rua onde vivo, onde me tornei mãe. Muito mudou nesta zona da cidade, mas a mudança mais recente e assustadora foi a chegada da especulação, dos investimentos estrangeiros, dos despejos, dos hotéis em cada esquina. E o espaço para a vida das pessoas que fazem de ti quem és, Lisboa? Não nos mandes para longe, não arranques de ti aqueles que são quem verdadeiramente és. Não somos de passagem. Somos inteiros e temos a tua memória inscrita em nós.
Lisboa: deixa as crianças tomar as ruas.
O tempo é de urgências, e a mais crucial é a sobrevivência do planeta, a sobrevivência do futuro. E se as crianças tomassem as tuas ruas, Lisboa? O espaço tinha que ser alargado, verde, seguro. As ruas tinham que se despojar cada vez mais dos carros para dar lugar a mais bicicletas, elétricos e autocarros. Os nossos pés voltariam a andar e respirar. Deixa as crianças tomar as ruas, e com elas todos nós.
Maria Remédio, Ilustradora