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Numa altura em que está a completar oito anos de crítica gastronómica, Alfredo Lacerda responde a perguntas sobre o ofício.
À falta de restaurantes, esta semana pensei fazer uma reflexão, um ensaio, vá. Mas, depois, como isto não é o Público, acabei por simular uma daquelas stories em que a pessoa responde a perguntas que os followers não fizeram. Não é tão profundo, mas poupa-se os olhos e o cérebro.
Comes à borla?
Nunca. As contas são sempre pagas até ao último cêntimo.
Já alguma vez foste identificado?
Tento não o ser. Faço as reservas com um nome falso e procuro pagar com dinheiro. Em sítios onde o chef ou o dono podem reconhecer-me, vou disfarçado.
Quantas estrelas gostas mais de dar?
Cinco, naturalmente. São os melhores textos e as melhores refeições.
Já alguma vez deste só uma estrela?
Já, aconteceu uma vez. Apareceu-me uma barata no prato.
Acidentes acontecem, não?
Sim. Mas manter na mesa o prato da barata só acontece aos piores.
E cinco estrelas, quantas vezes deste?
Uma dezena, em oito anos.
Como escolhes os restaurantes?
Têm de ser relevantes ou interessantes. Podem ser relevantes porque foram muito promovidos ou porque têm à frente um chef conhecido; e podem ser interessantes porque, à partida, oferecem boa comida e bom ambiente. Têm também de estar abertos há mais de três meses.
Já aconteceu teres desilusões?
Muitas vezes.
E o que fazes nessas situações? Publicas à mesma?
A regra é: restaurantes que andam nas bocas do mundo são sempre alvo de crítica, mesmo quando acabam por se revelar medíocres ou fraquinhos. Pelo contrário, se forem mauzinhos mas de pessoas desconhecidas e sem meios, metemos a crítica na gaveta.
Já foste ameaçado por escreveres uma crítica má? Uma única vez. Um indivíduo cadastrado disse-me que me dava uma tareia se aparecesse em determinado sítio. O assunto foi encaminhado para as autoridades.
Já foste injusto com algum chef?
Já. Mas já fui mais vezes injusto com os leitores. Os grandes erros de avaliação foram sempre em restaurantes a que dei 4 estrelas e que acabaram por me desiludir.
Porque é que achas que isso aconteceu?
Fazer crítica de restaurantes não é como fazer crítica de um quadro pendurado numa parede. A comida depende de factores que mudam todos os dias, a toda a hora. Mesmo em restaurantes de fine dining. Um prato no Feitoria, hoje, pode não ser igual ao mesmo prato no Feitoria, amanhã. A experiência depende de muitos factores ligados ao restaurante, mas também depende de muitos factores ligados à circunstância do crítico.
Explica lá isso da circunstância do crítico...
Ter mais ou menos fome, naquele dia, por exemplo. Gostar ou não gostar daquele tipo de comida.
Geres o teu apetite antes de ires fazer uma crítica?
Procuro sempre ir com fome. Por vezes não tomo o pequeno-almoço. Quando são jantares mais exigentes, não como nada durante a tarde.
Quantas visitas fazes, em média, para avaliares um restaurante?
Em média, duas. Mas podem ser três ou quatro ou cinco.
Qual o grande defeito da restauração actual?
Desprezar as sopas.
Quão importante é o preço da refeição?
Devolvo-te a pergunta.
Qual foi a factura mais alta dos últimos meses?
A do Fifty Seconds, do Martin Berasategui. Éramos dois, ultrapassou os 350 euros.
Tiras notas?
Tiro. E fotografias. Ambas com o telemóvel.
E bebes muito vinho às refeições?
Não. Um copo ou dois, por regra.
Qual foi a tua primeira crítica?
Belcanto (na foto). O director quis pôr-me logo à prova.
Ele gostou de ler?
Nem por isso. “Para primeira não está mal”, disse.