[title]
Das mortes colectivas causadas por guerras, catástrofes naturais, injustiças como a escravatura ou epidemias também reza a História, pelo que o colectivo activista Left Hand Rotation empenhou-se em tecer uma rota sobre quase 80 acontecimentos que são manchas impossíveis de apagar do percurso civilizacional. "Este é um projecto que começámos em 2011 de forma auto-gerida e que ao longo dos últimos anos já teve várias edições e acções", explica o grupo. No ano passado, regressou com uma nova edição (impressa), Especial Portugal, produzida pela associação Criatividade Cósmica, que inclui 24 pontos e memoriais do país relacionados com catástrofes que não devemos esquecer. Agora, este "guia turístico irónico", como lhe chama o colectivo, está acessível a todos em formato PDF e pode ser descarregado aqui. A leitura faz-se acompanhar pelo filme Monumento Catástrofe, igualmente disponível na íntegra online, mas que também será exibido em Abril no Centro de Cultura Libertária, em Cacilhas (Almada), e na Biblioteca Municipal de Marvila, em Lisboa.
Portugal integra, assim, com 24 localizações, uma lista internacional da qual fazem parte os monumentos às vítimas do Bloody Sunday (Irlanda) e aos heróis do gueto de Varsóvia, mas também à resistência indígena de Nicarágua, a quem passou pelo Campo de Concentração do Tarrafal (Cabo Verde) e aos mortos de Hiroxima (Japão). De Lisboa entram no guia o Monumento aos Combatentes do Ultramar (Belém), o Memorial às Vítimas do Massacre Judaico de 1506 (Baixa) e as Ruínas do Carmo (Chiado). Sintra está representada pelo Memorial aos Bombeiros Vítimas do Incêndio na Serra de Sintra, Setúbal pelo Memorial aos Fuzilamentos e Sesimbra pelo Memorial aos Estudantes Vítimas da Tragédia do Meco. A viagem, que começa em 1506 com o massacre dos judeus e termina nos incêndios de Pedrógão Grande, em 2017, continua por Évora, Santiago do Cacém, Peniche, Coimbra, Porto, Gralheira (Serra do Montemuro) ou Faial (Açores).
Sede da PIDE e memorial LGBT no novo guia de Lisboa
Olhar e sublinhar os pontos do espaço que lembram pontos da História é uma missão levada muito a sério pelo Left Hand Rotation, que foi criado em Espanha e chegou a Portugal perto de 2010, com o combate à gentrificação e a outros efeitos colaterais do turismo no centro do seu activismo. A partir dos guias que têm sido publicados, combate-se a visão do monumento público à catástrofe como um ornamento da paisagem, acreditam. E por isso o projecto é para continuar. Na calha estão duas novas edições: uma com o foco apontado a Lisboa (a publicação está prevista para o Verão) e outra a Buenos Aires, na Argentina.
Na capital portuguesa, as Ruínas do Carmo são o monumento que se destaca pelo maior número de vítimas. “Está num dos lugares mais fotografados da capital portuguesa e de um fenómeno natural que nunca falta nos discursos dos guias turísticos. O famoso terramoto de Lisboa de 1755 (com o seu epicentro no oceano Atlântico e um considerável grau 9 na escala de Richter) levou pela frente cerca de 100.000 almas, entre o sismo propriamente dito, um incêndio enorme, e por fim um tsunami que afectou toda a cidade naquele 1 de Novembro, véspera do Dia de Finados. As autoridades da altura decidiram deixar estas ruínas de um antigo templo gótico que aqui se encontrava como memorial do terramoto”, pode ler-se no guia Especial Portugal.
Da edição "Especial Lisboa" farão, também, parte o memorial às vítimas de homofobia e transfobia do Príncipe Real, o Cemitério do Alto de São João, o obelisco do Beco Chão Salgado (onde houve uma execução pública, no século XVIII), em Belém, a antiga sede da PIDE ou o memorial sobre os atentados do 11 de Setembro, na Avenida dos Estados Unidos da América, em Alvalade, segundo adiantou o colectivo à Time Out.
+ 30 localidades depois, escultura pela paz dá o nó com Lisboa
+ Serralharia onde trabalhou Saramago em risco, mas arqueólogos resgataram o que resta