[title]
O traço é tosco, a convicção firme. Isabel Braga e Maria Malaquias querem promover uma consciência colectiva da luta pela liberdade, mas sobretudo do direito a sermos nós “póprios”, com erros e tudo. Foi dessa vontade que nasceu a Pópria, uma marca portuguesa que se distingue pelos bordados feitos à mão. A primeira colecção convida-nos a andar de cravos nos pés.
“Nunca trabalhámos na área. É uma prática amadora, mas já personalizávamos meias e até outras peças de roupa, para nós e para os nossos amigos”, conta Isabel. Maria completa: “Esta arte foi também algo que as nossas mães nos passaram, não no sentido de concretizar e perpetuar o papel [tradicional] da mulher, porque felizmente sempre tivemos as duas educações muito livres e não estereotipadas, mas por curiosidade nossa.”
Não se descosem quando lhes perguntamos o que fazem quando não estão a fazer bordados, mas confessam-nos que, sim, têm outro emprego. Este pequeno negócio surgiu primeiro como uma actividade de tempos livres, uma paixão que partilham a meias, tal como a serigrafia. Incentivadas pelos amigos, decidiram lançar-se na aventura de ter um pequeno negócio e inauguraram a Pópria no Instagram, no passado mês de Março. “A expressão ‘sê tu próprio’ ou ‘sê tu própria’ é usada muitas vezes dentro do nosso grupo de amigos, mas costumávamos brincar com o erro, ao dizer ‘póprio, pópria’”, explica Isabel.
“Estamos numa altura em que existe muita competição e nos vendem a ideia de que se formos nós próprias chegamos onde queremos, mas nós sabemos que a meritocracia não existe, porque saímos todos de lugares muito diferentes e é muito mais difícil chegar a qualquer lugar que se queira saindo de um lugar mais pobre, que é a condição base para que tudo te possa correr mal na vida”, acrescenta Maria. “Por isso, numa era em que tudo nos diz e nos leva ao sucesso e à perfeição, quisemos brincar com o erro e mostrar que há beleza nele e que dele também podem sair coisas incríveis.”
As meias compram-nas em mercados locais, no norte de Portugal, e depois bordam-nas à mão. Para acompanhar os cravos em miniatura, flor que simboliza a Revolução de 25 de Abril de 1974, Isabel e Maria inspiram-se num imaginário revolucionário e feminista, povoado por letras de Zeca Afonso e de figuras femininas, como As Três Marias, Francisca Camelo, Capicua e A Garota Não. Nos têxteis brancos e pretos, lemos frases como “em cada esquina um amigo”, “em cada rosto igualdade”, “a paz, o pão, habitação, saúde, educação”, “eles comem tudo e não deixam nada”, “cá dentro inquietação”, “o povo é quem mais ordena” e “que força é essa, amigo?”.
“Escolhemos o 25 de Abril como tema principal, porque é claramente necessário no panorama actual, em que a extrema-direita está a subir a largos passos. É preciso falar sobre isso”, alerta Isabel. “Para nós, sempre foi uma data muito querida pelos ideais de Abril”, continua Maria, “e lançámos a marca ainda antes das eleições [de dia 10 de Março], quando as sondagens já nos diziam que o mundo estaria a votar cada vez mais à direita, o que é preocupante. E é por isso que é urgente continuar a passar a mensagem de Abril, porque não nos faz sentido voltar a tempos obscuros. Se não é por isto que continuamos a sair à rua, não sei pelo que é. A liberdade não é um direito adquirido.”
No futuro, Isabel e Maria gostavam de levar a mensagem – da liberdade, do feminismo, da luta de classes – também ao peito, com o lançamento de t-shirts e sweatshirts. E, quem sabe, marcarem presença em lojas físicas, com as quais se identifiquem. Para já, as encomendas fazem-se através de mensagem privada para a página de Instagram da marca(@popria__) e o preço das meias com citações é de 14€ – as meias com a palavra “sempre” custam 10€, as meias apenas com cravos 8€. É ainda possível receber bordados personalizados (10€-15€).
Siga o novo canal da Time Out Lisboa no Whatsapp
+ Esta colecção de t-shirts e acessórios é para famílias atípicas