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Abriu em Setembro de 2019 sem imaginar que passaria grande parte do tempo fechado devido à pandemia. Mesmo assim, no final de 2020 conquistava uma estrela Michelin, que manteve no ano seguinte. Com os tempos incertos deixados para trás, o chef basco Eneko Atxa voltou ao seu Eneko Lisboa. Conheceu equipa que ainda não conhecia, liderada pelo chef Lucas Bernardes, e revelou novos pratos no menu.
“Estive praticamente dois anos sem vir e a verdade é que comunicávamos por videochamadas, mandávamos vídeos e fomos sempre falando, mas não é a mesma coisa. Ontem chegámos e fiz uma coisa que quase nunca faço nos restaurantes que tenho: sentei-me como um cliente.” Tudo para observar a equipa e para se deixar surpreender por Lucas, que conduz o restaurante na ausência de Eneko, habitualmente aos comandos do Azurmendi, com três estrelas Michelin, em Biscay, no País Basco. “O reencontro não é algo nostálgico, é algo melhor. Há um ingrediente que muitas vezes nos escapa e que são as pessoas que nos rodeiam. Neste caso, que rodeiam o Lucas”, conta o chef, depois de um jantar com a imprensa, em meados de Julho, que serviu também para revelar algumas novidades nos menus, Erroak e Adarrak.
Erroak significa raízes e o menu de degustação (129€/214€ com harmonização de vinhos) leva esse nome por reunir pratos emblemáticos de Eneko como o lavagante assado e descascado com manteiga de café e cebola roxa de Zalla. Prometida para breve na carta está a gema trufada cozinhada ao contrário que o chef faz há anos no Azurmendi.
Já o menu Adarrak (159€/274€ com harmonização de vinhos) dá espaço às novas criações do chef. E é aqui, claro está, que há novidades, como a tartelete de bacalhau e zurrukutuna (sopa de alho e aves) ou o leitão com gnocchi e pesto de idiazabal e trufa.
“Acho que não há fonte de inspiração mais importante que a própria natureza e quando digo natureza falo em termos globais. O que nos dá o mar, a montanha, o que nos dá o campo, o que nos dá cada estação. Isto é fundamental”, aponta Eneko. “Não somos nós que decidimos o que cozinhamos, são os produtores que dizem o que vamos cozinhar”, continua o espanhol, muito elogiado ao longo dos anos pelo trabalho em prol da sustentabilidade. “Esse trabalha começa quando nos levantamos, antes até. Quando hoje decidimos o que vamos cozinhar amanhã, já começámos o processo de sustentabilidade, porque temos de pensar muito bem. A quem vais comprar, como vais comprar, como vais pagar. Na cozinha temos de entender tudo”, explica, contando que nesse mesmo dia, por exemplo, fez questão de passar pelo atelier do Studioneves, dedicado às cerâmicas de autor para restauração, para lhes agradecer a disponibilidade demonstrada mesmo em tempos de pandemia. “Quando precisava de alguma coisa, eles faziam-me tudo. Esta manhã não queria só ver as coisas, queria agradecer-lhe pessoalmente porque tornaram a minha vida mais sustentável. E quando estávamos a fazer isto tudo, desafiaram-me a fazer um prato.” Nesse processo, o chef percebeu o tempo que peça levava a ser feita. “Três dias aqui, depois forno, depois esperamos 14 dias. E eu pago 20 euros por isto? É preciso explicar às pessoas o valor das coisas”, defende.
É por isso que nos seus restaurantes não admite que lhe digam que as refeições não valem o dinheiro pedido “porque não havia grandes produtos ou não havia caviar”. “Podia ter havido, mas sabe que o chicharro que usamos hoje foi capturado assim e assim. Se contarmos a história da pessoa, se tivermos a capacidade de contar uma história real, as pessoas valorizam. No Azurmendi juntamos muito a história da pessoa, pode parecer-te aborrecido, mas quando contas a alguém o que está a acontecer para teres aquela experiência, é logo outra coisa.”
Em Lisboa, Eneko assume que grande parte desse trabalho é feito por Lucas. “É a ele que pergunto o que é o que campo ou o mar nos vai dar. Tens de ouvir o território, as pessoas que sabem interpretar o território e levar isso para a cozinha”, diz. “Eu faço os pratos, sou eu que os crio, mas ele diz-me se podemos ou não fazer aqui. Às vezes ele diz-me: tu pões esta flor, mas eu não posso plantar flores aqui, eu estou em Lisboa e tu estás na montanha. E sugere uma alteração. É bonito. Ele vai explorando e encontrando coisas que eu não conheço. Há coisas que quando venho aqui descubro.”
R. Maria Luísa Holstein 15 (Alcântara). 21 583 3275. Ter-Sáb 19.00-22.30
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