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Este fim-de-semana, a literatura cigana tem encontro marcado na Casa Fernando Pessoa

Não é a primeira vez que a casa-museu chama à sala "grupos mais arredados", mas é o primeiro momento em que se foca na cultura cigana. A 26 de Outubro, a tarde de conversas culmina com a actuação de Diego El Gavi.

Rute Barbedo
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Rute Barbedo
Jornalista
O músico Diego El Gavi encerra a tarde de conversas
DRO músico Diego El Gavi encerra a tarde de conversas
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Durante a tarde de sábado, 26 de Outubro, escritores, artistas e investigadores, de etnia cigana ou seus conhecedores, juntam-se na Casa Fernando Pessoa (CFP) para falar de dois grandes temas: de um lado, a escolarização, a leitura e os hábitos culturais nas comunidades ciganas; do outro, o circuito da literatura cigana, desde quem escreve até quem publica, passando, claro, por quem lê. Este é o primeiro Encontro de Literatura Cigana na CFP, abrindo a porta a um mundo desconhecido por muitos, mas para o qual "é preciso dar espaço", como nos haveria de dizer Bruno Gonçalves, moderador do evento. 

A ideia, no entanto, já existia "há algum tempo", começa por enquadrar Clara Riso, directora da Casa Fernando Pessoa. Com a maior exposição da comunidade cigana na comunicação social, com base em testemunhos de artistas a activistas, mas também, do lado oposto, com o ganho de visibilidade de alguns movimentos discriminatórios, o tema tornou-se latente para a responsável. Tendo em conta o foco de actuação da CFP, a decisão foi dá-lo a conhecer, explorando o universo literário cigano, sem esquecer a tradição oral que lhe está na base. "São pessoas e uma cultura que ainda conhecemos mal", reconhece a directora. "E parece-nos que o público em geral também."

Casa Fernando Pessoa
José Frade/EGEACCasa Fernando Pessoa

Do painel de conversas fazem parte Tânia Oliveira, mediadora sociocultural e activista; Maria Gil, actriz, activista e "uma referência na promoção feminista das mulheres ciganas", como detalha o programa; Cláudio Garcia, formador para o Alto Comissariado para as Migrações na área das comunidades ciganas; Olga Mariano, activista e poeta; Natanael Santos, activista e cronista em vários jornais; Paula Moura, que colabora com o Alto Comissariado para as Migrações nas áreas da interculturalidade e inclusão; e Leonor Teles, realizadora que ganhou o Urso de Ouro para curtas-metragens no Festival de Berlim, com Balada de um Batráquio, filme sobre a tradição portuguesa de colocar sapos à porta de estabelecimentos como sinal de que pessoas de etnia cigana não são bem-vindas. 

Balada de um batráquio, de Leonor Teles
DRBalada de um batráquio, de Leonor Teles

"Todos têm trabalhado com a escrita ou sobre a escrita e com comunidades ciganas" e têm algo a dizer, explica Clara Riso à Time Out, incluindo na afirmação os participantes Bruno Gonçalves, da Ribaltambição – Associação para a Igualdade de Género nas Comunidades Ciganas, Ana Umbelino, vice-presidente da Câmara de Torres Vedras; e Maria José Casa-Nova, Conselheira do Alto Comissariado para a Imigração e o Diálogo Intercultural. O programa culmina com a actuação do músico Diogo El Gavi, às 18.30.

Quanta literatura cigana temos?

"A literatura cigana está a surgir de forma muito ténue, mas existe, da poesia à ficção, passando pelos livros de missão. Agora, é sobretudo uma cultura ágrafa, com uma tradição oral muito forte. Só que é preciso registar. Temos tantas histórias dos nossos avós, bisavós, sobre o nomadismo forçado e muitas outras coisas... O povo cigano é um povo que tem sido ignorado, omisso, da história de Portugal. Por outro lado, muitas vezes escreve-se sobre ciganos de uma forma muito folclórica, o que só faz enraizar estereótipos", analisa Bruno Gonçalves, da Ribaltambição.

Olga Mariano, poeta roma e uma das participantes no encontro
DROlga Mariano, poeta roma e uma das participantes no encontro

O encontro que acontece este sábado funciona, assim, como "uma chamada de atenção" não só para a cultura cigana, mas também para a necessidade de apoios ao desenvolvimento de várias frentes, através de iniciativas como a criação de "prémios para jovens escritores", sugere o mesmo responsável. "É preciso um incentivo a quem tenha medo de escrever. Na poesia, então, há muitos jovens com talento, mas que não têm oportunidade. A comunidade cigana precisa do seu espaço", afirma. 

Tempo para "excluídos" e "arredados"

O Encontro de Literatura Cigana é o primeiro momento do género organizado pela CFP, mas a sua continuidade, em edições futuras, não está fora de questão. "O acontecimento não deve esgotar-se em si mesmo", assume a directora, Clara Riso. "Queremos manter o contacto com estas pessoas e poder vir a trabalhar com elas, no futuro, sobre escrita, poesia, as áreas de actuação que nos são mais próximas."

Sendo uma estreia no âmbito da cultura (ou culturas) cigana, o encontro segue a "estratégia de trabalhar com grupos que estão mais arredados, excluídos", tal como já aconteceu com a comunidade surda ou com pessoas com histórico de doença mental, grupos com quem a Casa Fernando Pessoa colaborou no passado, no sentido de construir uma programação diversificada e inclusiva. "Queremos trazer pessoas de fora das áreas dominantes ou dominadoras", frisa Clara Riso. 

Rua Coelho da Rocha, 18 (Campo de Ourique), 26 Out. Sáb. 15.00. Entrada livre

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No final das conversas, cujo programa te envio anexo, haverá um momento de música, com o Diego El Gavi.

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