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“Esta exposição é uma viagem”, declara Delfim Sardo, administrador do CCB, antes da inauguração de “Evidence”, instalação site-specific criada por Patti Smith e Stephan Crasneanscki, do Soundwalk Collective, que pode ser visitada a partir deste sábado, 23, e até dia 15 de Setembro, no CCB/MAC. “Não só é uma viagem em si, para nós todos que entramos naquele espaço, como é sobre viagens.”
Concretamente, é sobre três viagens de outros tantos poetas e escritores franceses. “A viagem de Antonin Artaud ao México, em 1936. A de Arthur Rimbaud à Abissínia. E a de René Daumal ao Monte Análogo. São viagens físicas, mas sobretudo mentais”, detalha Delfim Sardo. “Esta exposição é também uma viagem mental. E, como todas as grandes viagens mentais, é transformadora.”
Nas paredes da primeira sala, quase às escuras, estão inscritas três partes de uma conversa entre Stephan e Patti Smith. Enquanto as lemos, um assistente dá-nos um telemóvel e uns auscultadores de onde brotam as peças que a cantora e o Soundwalk Collective compuseram para esta exposição.
Mas é na segunda sala que “Evidence” revela o seu potencial transformador. À medida que andamos pelo espaço, as paisagens sonoras vão mudando, de acordo com as peças que temos diante de nós: estilhaços e pedras que nos aproximam de Daumal; uma terra vermelha e peyote que aludem a Artaud; até madeiras etíopes, “do lugar onde Rimbaud passou a última década da sua vida”, segundo Patti Smith. Nas paredes, são projectados vídeos e fotografias das pesquisas que ambos fizeram.
A exposição foi encomendada pelo Centre Pompidou, em Paris, onde esteve entre Outubro de 2022 e Março do ano passado. E tem agora uma segunda e “nova” vida, que a curadora francesa Chloé Siganos descreve como “totalmente portuguesa” e adaptada ao CCB/MAC. “Reflecte o espaço, o museu, os trabalhadores e a própria cidade”, indica a histórica cantora e poeta norte-americana. “É muito entusiasmante poder olhar para ela a partir de outra perspectiva.”
Um acaso poético
Patti Smith e Stephan Crasneanscki conheceram-se por acaso, “graças à poesia”. “Estávamos sentados ao lado um do outro, num avião. Nunca falo com ninguém quando estou a voar, mas ele atraiu-me porque estava a ler a poesia da Nico, que eu cheguei a conhecer”, conta Patti Smith. “Começámos a conversar e ele comentou que estava a pensar fazer-lhe uma homenagem, com alguém a ler poemas dela por cima das gravações dele. Perguntei-lhe quem ia declamá-los, ele disse-me que ainda não sabia e eu ofereci-me logo para fazê-lo.”
“Pouco tempo depois fui ao estúdio dele, em Nova Iorque, e entendemo-nos tão bem que, quando acabámos, fiquei com vontade de continuar a trabalhar com ele. Na altura, o Stephan estava a trabalhar num projecto sobre o Rimbaud e quis fazer também isso. No final, disse-lhe para fazermos mais outro e ele escolheu o Artaud. E a seguir o Daumal. Foi completamente orgânico”, considera. “Éramos dois estranhos num avião e agora somos colaboradores, bons amigos e trabalhadores.”
Foi o Perfect Vision, o tríptico que álbuns gravados entre 2017 e 2021 e dedicados respectivamente a Rimbaud, Artaud e Daumal, que levou o Centre Pompidou a encomendar a exposição que agora se encontra no MAC/CCB a Patti Smith e ao Soundwalk Collective de Crasneanscki e Simone Merli. Porém, não são essas músicas e poemas que se vão ouvir a partir das 19.00 deste sábado, 23, em Correspondences, o espectáculo que prepararam para o Belém Soundcheck, o novo festival do CCB.
A cantora tem estado a trabalhar em novas peças com o colectivo, e tem vontade de mostrá-las. Os textos são da sua autoria, inspirando-se em múltiplos temas e pessoas, da Medeia de Pier Paolo Pasolini à imigração e as alterações climáticas. Ainda não sabem o que vão fazer a seguir, mas não parecem muito preocupados. “Logo se vê”, diz Patti Smith. Parece que ideias não lhes vão faltar.
CCB/MAC (Belém). 23 Mar. 10.00-00.00. 7€; 24 Mar-15 Set (Seg-Dom). 10.00-19.00. 10€-20€
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