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“Este festival começou pela mão de uma marquesa. Nasceu, por isso, ainda no seio da aristocracia, para um grupo muito restrito, onde desde o início se assumiu um compromisso com a excelência, porque eram pessoas habituadas àquilo que de melhor havia na música e no mundo. Hoje é um festival de Sintra: já não é da vila nem deste ou daquele palácio, mas do concelho e de quem habita e faz este território, quer seja durante todo o ano ou um dia por ano”, assegurou Martim Sousa Tavares esta quarta-feira, 15 de Março, na apresentação do programa da 57.ª edição do Festival de Sintra, a primeira desde que foi anunciado como novo director artístico em Dezembro passado. Além de destacar a nova imagem do festival – que reflecte uma visão mais contemporânea que, sem deixar de honrar o passado, vive o presente e a sua diversidade –, o músico e maestro chamou a atenção para a “grande novidade” deste ano, que se prende com o volume da oferta. “Triplicou”, garante.
A exactamente três meses do festival, que se realiza entre os dias 15 e 25 de Junho, nunca antes a programação foi avançada tão cedo. “É, por isso, também a edição preparada em menos tempo, precisamente porque o festival, que originalmente acontecia no final do Verão [nos meses de Setembro e Outubro], passa a ser um festival de abertura de Verão, sem haver festivais concorrenciais a acontecer na mesma altura do ano”, ressaltou Martim Sousa Tavares, empenhado na renovação de públicos, também através de artistas e horários mais propícios a atrair uma faixa etária jovem, entre os 18 e os 30 anos. “A partir deste ano, temos também, por um lado, uma página de Instagram, porque é impensável não nos comunicarmos nas redes sociais de uma forma desempoeirada; e, por outro, um bilhete gratuito para um concerto à escolha no Centro Cultural Olga Cadaval a todos os residentes no concelho de Sintra que tenham até 18 anos.”
Estão confirmados mais de 50 artistas, distribuídos por 35 eventos em cerca de 16 locais distintos, incluindo a Serra de Sintra, com destaque para o talento emergente e os formatos novos de programação. De um duelo de pianistas no Palácio de Seteais (20 Jun, Ter 21.30), um evento imensamente popular no século XIX que é agora recuperado, colocando frente-a-frente Raul da Costa e Vasco Dantas Rocha, até às novas caminhadas-concerto na natureza – três ao todo, uma das quais ao nascer do sol no dia de Solstício de Verão (21 Jun, Qua 05.00) –, procurou-se reforçar a quantidade, qualidade e diversidade das propostas. “Já se chamava festival há muitos anos, mas para ser um verdadeiro festival, para ter um sentido festivo e festivaleiro, as pessoas têm de ser convidadas a circular e, por isso, não há um único dia, nos dez dias desta edição, que não tenhamos três a quatro concertos por dia. Tentámos ainda que fosse possível – se algum maluco quiser tentar – vê-los a todos, desde que, claro, se circule, porque vão estar a acontecer em todo o território de Sintra.”
Música clássica, cinema, dança e o mais que der
O festival arranca a 15 de Junho, às 18.30, na Sala do Trono do Palácio Nacional de Queluz, com uma conferência do musicólogo e organista britânico David Cranmer. Segue-se, no mesmo local, às 19.00, um concerto e lançamento de CD do Ensemble Bonne Corde, um grupo de música barroca que interpretará composições, recentemente descobertas, de um autor português barroco. “Para terminar o dia, concluímos com este ‘Musa, vai chatear o Camões’, [uma expressão] tirada de um poema de José Miguel Silva. Trata-se de uma conversa a quatro, em que participam Anabela Mota Ribeiro, Carlos Vaz Marques, Mia Couto e eu [Martim Sousa Tavares], sobre a importância de ir ao teatro e ao cinema e de ouvir música, e o perigo de não o fazer. Porque este festival é, em primeiro lugar, serviço público.” Neste sentido, o director artístico chama a atenção também para o reforço da programação infantil e familiar, desde logo com As árvores não têm pernas para andar, pela pianista Joana Gama, no dia 18 de Março, às 11.30, no Edifício Multiusos Cultural de Belas.
Entre a restante programação, já disponível para consulta no site, destaca-se desde logo o novo ciclo de cinema com sete sessões, que antecedem concertos específicos e convocam a um diálogo entre a sétima arte e a música clássica. No dia 23 de Março, por exemplo, à exibição de Farinelli, de Gérard Corbiau, segue-se um concerto de Alois Mühlbacher. “Normalmente, quando um festival quer trazer um grande nome internacional, não tem grande agência sobre o que os artistas vêm cá fazer, porque eles já estão numa tournée pela Europa ou o que for com um programa específico. Ao trazermos artistas mais jovens, mais disponíveis e até mais ágeis do ponto de vista do pensamento, podemos convidá-los a fazer concertos exclusivos, como é o caso do Alois Mühlbacher, que é um contratenor alemão, que vai estar inserido num concerto para o qual o convidámos para ser solista, acompanhado pela Orquestra Barroca Portuguesa Real Câmara, com um repertório dedicado àquilo que era a tradição dos castrati, uma voz que desapareceu e entretanto se recuperou com os contratenores, e que está directamente relacionado com o filme.”
Além da aposta em talentos emergentes no panorama internacional, esta edição reforça também o espaço dado a artistas nacionais, inclusive em novos “concertos crossover”, que acontecem sempre às 23.00, em vários locais, como o Palácio de Sintra e o Centro Cultural Olga Cadaval, e onde poderemos ouvir nomes como Joana Gama (19 Jun), Tiago Sousa (21 Jun), Filho da Mãe a.k.a. Rui Carvalho (22 Jun) e Pedro Flores (24 Jun). “É também uma forma de oferecer uma mão aberta a quem de facto vem de outras latitudes musicais e olha para um programa de música clássica e não entende o que é que é um opus e referências de catálogo. Portanto, temos um conjunto de músicos, que são muito híbridos, periféricos, sendo até difícil dizer se são uma coisa ou outra, e que certamente vão convidar uma forma de estar diferente, em concertos mais relaxados. É uma espécie de after, como todos os festivais têm.”
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