[title]
Lisboa é linda. É feita gente, de luz e de muita história que sobrevive nas paredes de antigos edifícios que sobreviveram décadas, às vezes séculos, para as contar. Só que nem todos estão a ter os cuidados que merecem, especialmente os que foram classificados como Imóveis ou Monumentos de Interesse Público. É o caso do Palácio Burnay, em Alcântara, nas mãos do Estado desde os anos 40 do século passado, que tem andado votado ao abandono, uma situação denunciada pelo Fórum Cidadania Lx, uma associação lisboeta que está sempre atenta ao património da cidade. Em Dezembro, este movimento de cidadãos apresentou a sua primeira providência cautelar contra os ministérios das Finanças e da Cultura com o objectivo de travar a degradação do Palácio, um edifício do século XVIII localizado na Rua da Junqueira (Alcântara) que tem sido alvo de actos de vandalismo. A decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa foi conhecida no final de Março e exige que estes ministérios tomem uma série de medidas, no sentido de não piorar ainda mais o estado deste Imóvel de Interesse Público, uma classificação atribuída em 1982.
Foi em 2020 que o Fórum tomou conhecimento do estado de abandono do palácio, uma situação que se arrasta pelo menos desde 2012, ano em que deixou de operar aqui o Instituto de Investigação Científica e Tropical. Durante uma visita ao interior do imóvel, a associação viu janelas abertas ao nível da rua, tornando-o vulnerável a visitas indesejadas, e também a queda de tectos abobadados que resultou na acumulação de detritos espalhados pelo chão. Nesse levantamento, feito em Fevereiro de 2020, as telas da antiga sala de baile, da autoria do pintor José Malhoa (1855-1933), ainda estavam no local, mas em Junho de 2021, o Fórum diz ter tomado conhecimento que o palácio tinha sido alvo de vandalismo e as telas furtadas. Serão também de difícil reparação os frescos do tecto do teatro e da sala de jantar, igualmente assinados por Malhoa. "O imóvel de interesse público, encontra-se neste momento abandonado, deteriorado em muitas áreas do seu interior e delapidado de elementos pictóricos que faziam parte da sua decoração interior, como é o caso das telas da sala de baile que foram furtadas, havendo o sério risco de a permanência prolongada no tempo de janelas abertas ao exterior permitir, para além da contínua deterioração do seu interior, a deterioração ou mesmo o furto das valiosas pinturas murais aí existentes, da autoria do grande pintor português José Malhoa", lê-se no relatório do Tribunal, com data de 25 de Março.
Assim, o tribunal intimou o Ministério das Finanças a "proceder ao fecho de todas as janelas que se encontrem abertas, por forma a impedir a exposição do edifício às intempéries e à introdução de terceiros no seu interior, no prazo de 15 dias úteis", assim como a “proceder à limpeza do interior do palácio, supervisionada por técnicos de conservação e restauro da Direção Geral do Património Cultural (DGPC), do Ministério da Cultura, no prazo de 30 dias úteis.” Ambos os ministérios terão ainda de elaborar um relatório conjunto que "registe o actual estado do interior do Palácio Burnay, por forma a identificar as áreas do seu interior carecidas de obras de restauro ou de reabilitação, no prazo de 30 dias úteis."
Segundo a DGPC, o Palácio Burnay foi construído no início do século XVIII por iniciativa de D. José César de Meneses, irmão do primeiro Conde de Sabugosa. Após o terramoto de 1755, foi vendido ao Patriarcado de Lisboa, que aqui passou a ter a sua residência de Verão durante cerca de cem anos e depois teve vários proprietários privados até chegar às mãos do capitalista Henrique Burnay, que promoveu uma renovação total do interior do palácio. Nos anos 40 do século XX foi adquirido pelo Estado Português.
Perguntámos a um dos associados do Fórum Cidadania Lx se a associação tem identificado outras situações semelhante. Na resposta, aparecem nomes como o Palácio da Quinta das Águias, também na Junqueira, propriedade privada devoluta desde finais dos anos 80 e classificada como Imóvel de Interesse Público em 1996; e o Palácio Almada Carvalhais, no Largo Conde Barão, classificado como Monumento Nacional há mais de 100 anos e que em 2014 foi vendido pela Caixa Geral de Depósitos a um fundo imobiliário que ali quer construir um hotel.
+ Após muitos meses ao fresco, a janela da Solmar foi finalmente tapada
+ Recuperado, Palácio Biester abre a visitas pela primeira vez