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Herói Local: Jorge Pina, o pugilista

O antigo campeão do mundo de boxe tornou-se o “pai” de muitos que vêem no desporto um motor vital. Em Marvila, montou uma casa para a comunidade.

Rute Barbedo
Escrito por
Rute Barbedo
Jornalista
Jorge Pina
Francisco Romão PereiraJorge Pina
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Foi em 1987, aos 11 anos, que Jorge Pina, então morador do Bairro do Rego (Sete Rios), começou a praticar boxe. “Era um bairro social, problemático… Tive processos com álcool e drogas, e o desporto foi o que me ajudou a encontrar outro caminho.” Dez anos depois (e também em 1998 e 1999), sagrava-se campeão nacional. “Mas não foram os títulos que fizeram de mim o que sou hoje. Isso são outras histórias.” Em 2004, enquanto treinava para o campeonato mundial, perdeu totalmente a visão do lado esquerdo e 90% do direito. “Com o tempo aprendi, aceitei”, conta o boxeur

Façamos então fast forward, para 2011, ano em que o atleta paralímpico criou a Associação Jorge Pina, um projecto de inclusão através do desporto, a partir do qual Pina queria dar a crianças e jovens aquilo a que se agarrou quando era pré-adolescente. Como o próprio diz, foi depois de cegar que aprendeu a ver e que começou, por isso, a voltar-se para o exterior, tendo o desporto e o associativismo na base. Em 2014, criou a Escola de Atletismo Adaptado, depois investiu no goalball e andou, durante anos, à procura de um espaço que pudesse funcionar em simultâneo como uma academia e uma comunidade, passando os valores da perseverança, humildade, disciplina e respeito. Há seis anos, mostraram-lhe um espaço de 1700 metros quadrados no Bairro do Armador, em Marvila, “cheio de entulho, lixo, teias”. Servia perfeitamente. Conseguiu apoios (60% da Câmara Municipal de Lisboa e o restante de privados) e, em Novembro de 2021, depois de “muitos contratempos”, a Academia Jorge Pina abriu ao público. 

Hoje, quem entra passa pelos ringues e sacos de boxe, segue por uma pista de sprints, depara-se com a zona da ginástica acrobática e com as bicicletas de spinning. “Temos à volta de 500 pessoas a frequentar a academia, do boxe ao atletismo, de várias idades e de todos os estratos sociais. Temos um protocolo com as escolas, em que as crianças podem vir para cá estudar, fazer os trabalhos de casa e praticar um desporto. Quem não tiver como pagar não fica de fora.” Nem as pessoas com deficiência, os maiores de 55 anos, advogados ou funcionários públicos. “Se é inclusivo, é mesmo para todos.”

É aqui, portanto, que Jorge Pina passa grande parte dos dias, quando não está em reuniões com a Junta de Freguesia, a dar uma palestra num estabelecimento prisional, a correr de Norte a Sul do país ou a pedalar até ao Vaticano. Começa as manhãs a meditar, ao cimo de umas escadas que dão para uma espécie de clarabóia, onde pode “olhar para o céu” e concentrar-se no que virá a seguir, sejam aulas de boxe ou de spinning

À sua volta, a vida no Bairro do Armador mudou. Criou-se uma comunidade. Pina acha, por isso, “que este projecto devia ser replicado noutro bairro social” e já está a pensar em mais, como uma escola de ciclismo adaptado. “Quero sempre desafiar-me, trabalhar, ter objectivos e mostrar que se uma pessoa com dificuldades consegue atingi-los, os outros também.”

Em 2017, Jorge Pina foi distinguido pela Comissão Europeia pelo seu trabalho individual e comunitário em torno do desporto. O título? Herói local.

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