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A pouco tempo de celebrar o quarto aniversário e depois de dois anos duros na restauração, João Sá renovou o Sála, na Rua dos Bacalhoeiros. Já não há pratos à carta, apenas dois menus: um de três momentos em que o cliente é que escolhe o que quer comer e outro de cinco, definido pelo chef. João Sá não tem dúvidas de que este é o melhor momento do seu restaurante – a sala cheia a um dia de semana ao jantar é prova disso. "Estamos sempre com três/quatro semanas de antecedência de reservas para o jantar", revela.
“Um restaurante precisa de tempo, às vezes em Portugal esquecemo-nos disso. Tudo isto faz parte do crescimento”, começa por dizer o chef. Se é verdade que a pandemia foi ingrata para toda a restauração, João Sá também conseguiu tirar consequências positivas. Foi com a covid, por exemplo, que decidiu passar a ter apenas dois menus. “Neste momento, temos uma história bem definida, sabemos bem aquilo que queremos fazer”, afirma, explicando que a mudança serve também para cativar os clientes que aqui vieram no início e que, por variadas razões, acabaram por nunca voltar. “Hoje olho para trás e vejo isso. Houve muitos clientes que depois da pandemia não voltaram ao Sála. Acho que não acompanharam e nós também evoluímos enquanto cozinha, enquanto restaurante. Ao início diria que estávamos um bocadinho a acertar passo. Hoje acho que o Sála está melhor do que alguma vez esteve”, acrescenta.
Entre as novidades está o quase desaparecimento da carne. No menu de três, intitulado pelo chef “À procura de novas texturas”, em que o cliente escolhe uma entrada, um prato e uma sobremesa (58€/88€ com harmonização de três vinhos), há apenas o lombo de novilho, batata nova e molho de chanterelles como prato principal. “Mas está quase a sair que eu estou farto de o fazer”, brinca. Já no menu “Horizonte à vista” (75€/120€ com harmonização de cinco vinhos), esta proteína não entra de todo, a não ser que faça parte do snack surpresa, decidido diariamente. “O menu de cinco é muito focado no peixe e no marisco”, conta, revelando que a mudança prendeu-se também com o número crescente de mesas que pediam para não ter carne. “Mais vale então ter uma oferta pensada já de acordo. É mais fácil para nós não ter um prato de carne e na realidade acho que nos obrigou a equilibrar mais o menu.”
O que não mudou, porém, é a cozinha portuguesa de João Sá que se faz de misturas. Uma viagem gastronómica que começa em Lisboa e que se estende a outras latitudes, da Índia a África. “Foi preciso perceber o bairro onde estamos. Estamos numa zona que foi sempre uma zona de porto, onde sempre chegou muita mercadoria. Lisboa sempre foi um bocadinho esta zona de convergência de culturas. Então o menu tem também um bocadinho desta história”, explica.
Veja-se o exemplo da santola com caril goês e geleia de maçã verde, a gamba do Algarve com molho de moqueca, amendoim e côco, ou os cuscos transmontanos, com coentrada e berbigão fumado. “Os pratos têm esta cultura de [incluir] produtos que vêm de fora. Não porque nos apetece usar, mas porque há uma razão histórica. É uma cozinha que tem muita viagem, também porque trabalhamos com muitos turistas e é uma maneira de dar a conhecer.” Isto tudo respeitando sempre a sazonalidade dos produtos, mesmo que isso signifique que alguns pratos durem pouco tempo no menu. “Normalmente, não trocamos a carta toda, não tenho logística para fazer uma mudança radical, mas a ideia é sempre ir trocando pratos”, aponta.
Mas há um prato que João Sá não sabe se algum dia conseguirá tirar: o afamado arroz de polvo e algas com gel de citrinos. “Foi o único que se manteve no menu neste ano e meio.”
R. dos Bacalhoeiros 103 (Baixa). 218 873 045. Ter-Sáb 12.30-15.00, 19.00-23.00
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