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Lisboa, Cidade Triste e Alegre: 60 anos depois

Renata Lima Lobo
Escrito por
Renata Lima Lobo
Jornalista
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Lisboa, Cidade Triste e Alegre é um objecto de culto. Considerado o melhor foto-livro português, é a partir de quinta-feira a peça central de uma exposição que inaugura no Museu de Lisboa. A sua história dava outro livro.

Parece de propósito, mas não é. Precisamente um ano e um dia após a inauguração de a exposição "Victor Palla e Bento d’Almeida: Arquitetura de outro tempo" apresentar a dupla de arquitectos (que nos deu snackbars como o Galeto) na Garagem Sul do CCB, o Museu de Lisboa apresenta uma outra vertente da obra de Victor Palla, desta vez em dupla com Costa Martins, também arquitecto. E, como Palla, também fotógrafo. "Lisboa Cidade Triste e Alegre: Arquitectura de um Livro" inaugura quinta-feira e apresenta uma nova visão sobre esta espécie de poema gráfico.

lisboa cidade triste e alegre
"A filha andava na rua e veio para ao pé do pai, enquanto conversávamos com ele, aninhando-se mais quando nos via olhá-la”, lê-se no índice.

A relação que se cria com cada uma das imagens, ora tristes, ora alegres desta Lisboa dos anos 50, é ampliada com a consulta de um peculiar índice carregado de referências técnicas, de contextos como este da legenda da imagem em cima ou mesmo alusões ao realismo italiano no cinema. E depois o livro é bonito. Os autores contrariam a fotografia académica, optando por raramente usar o negativo integral, uma técnica também traduzida na paginação, e algumas imagens são acompanhadas por poemas de Fernando Pessoa, Almada Negreiros, Alexandre O’Neill, entre outros.

A história

As fotografias são apresentadas pela primeira vez em 1958 na Galeria do Diário de Notícias, em Lisboa, e na Galeria Divulgação, no Porto, numa tentativa de difusão e de recolha de opiniões, embora sem grande adesão. Mais tarde escreveriam Palla e Costa Martins em Lisboa, Cidade Triste e Alegre: "Durante a composição tivemos de esquecer tudo o que ouvimos e planear segundo os nossos conceitos e convicções". Enviaram cartas personalizadas para os jornais todos da época, fizeram folhetos publicitários e até foram à televisão. Tudo para angariarem assinantes do livro, vendido em sete fascículos. Apesar dos esforços, a empreitada foi um fiasco. A obra teve uma segunda vida em 1982, quando inaugura a galeria Ether – Vale tudo menos tirar olhos, de António Sena. "Lisboa e Tejo e tudo" exibe imagens não publicadas do livro e, como tinham sobrado imensos fascículos, foram encadernados e postos à venda cerca de 200 exemplares. A exposição ainda foi nesse ano para os Encontros de Fotografia em Coimbra e em 1989 foi para Serralves. E nunca mais se ouviu falar disto.

Victor Palla e Costa Martins

Até que em 2007 está um exemplar, dos encadernados em 1959, à venda na Christie’s em Londres e é arrematado por 14 mil euros. Talvez porque três anos antes tenha ido parar ao The Photobook: A History, uma reputada edição dos fotógrafos Martin Parr e Gerry Badger que inclui os 100 melhores foto-livros do mundo. "Os coleccionadores mais ferozes digladiaram-se por ele", conta Rita Palla Aragão, neta de Victor Palla e a curadora da exposição que inaugura quinta-feira. Aí será possível comprar o facsimile editado em 2015 pela Pierre Von Kleist, de André Príncipe e José Pedro Cortes, depois de uma primeira edição em 2009, de dois mil exemplares, ter esgotado. À venda estará também uma nova edição do Público, uma colecção que sairá com o jornal em oito fascículos, em vez dos sete originais. Mas há mais.

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A exposição

"Vamos ver dois arquitectos amigos, sem os vermos, através da câmara. A fotografarem a cidade e a construir o livro durante três anos", começa por explicar a curadora. A primeira sala é dedicada a 16 fotografias, doze impressas agora e quatro da época em rotogravura, cada uma com o respectivo texto do índice. Noutra secção da exposição mostra-se a primeira edição, encadernada em 1959 e em 1982 e as edições da Pierre. Na segunda sala, vinte fotografias que se dividem em negativo integral e a versão cortada dos autores. No mesmo espaço, "a maior indiscrição de todas", assegura Rita: "Pegamos em quatro fotografias e fomos à procura das tiras de negativo delas". O resultado são 24 imagens – as quatro do livro, mais as cinco inéditas de cada tira de negativo. "São conjuntos interessantes, sobretudo porque eles não disparavam duas vezes e isso é muito diferente dos dias de hoje". Também há uma secção dedicada à Ether – Vale tudo menos tirar olhos; uma sala onde será projectado um documentário de 2005 sobre o livro realizado por Luís Camanho, com testemunhos preciosos; e um tablet a explicar como se constrói um fascículo. Em exposição estarão ainda três dos 60 livros vindos duma tiragem especial numerada e rubricada pelos autores, três da edição normal e um da edição da Ether – que é basicamente a primeira edição com outra encadernação. E a 10 de Maio arranca um ciclo de conversas no âmbito da exposição com os fotógrafos André Príncipe, José Pedro Cortes e Paulo Catrica.

Museu de Lisboa – Palácio Pimenta, 245. Ter-Dom 10.00-18.00. Até 16 de Set. Entrada: 3€.

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