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A filha mais velha fez um comentário menos bonito sobre outra menina e Luísa Sobral voltou a aventurar-se na literatura para a infância. Com o seu primeiro livro também foi assim. Editado pela Caminho em 2022, Quando A Porta Fica Aberta fala-nos sobre “o segredo dos armários que ganham vida ao deitar”, um medo partilhado por Emília, a personagem principal, e um dos filhos da cantautora. Agora, é novamente hora de conversar, desta vez sobre O Peso das Palavras. Lançado de forma independente, o álbum – ilustrado por Ligeiramente Canhoto – debruça-se sobre a importância de termos cuidado com o que dizemos e não sermos impulsivos, para que possamos escolher as palavras certas, as que nos fazem a nós e aos outros felizes.
Há palavras que são rouxinóis, diz-nos Luísa. São palavras simpáticas e afectuosas, que nos fazem sentir queridos. E há palavras-elefante. Ao contrário dos elefantes bonitos que vivem na selva e nos fazem sorrir, as palavras-elefante dão-nos vontade de chorar. São muito grandes e pesadas, agarram-se ao nosso pescoço, ou colam-se às nossas costas, ou andam connosco para todo o lado, para sempre, e fazem-nos sentir muito pequenos. É difícil fugir delas – todos nós corremos o risco de as ouvir em algum momento –, mas talvez, se tivermos cuidado, se não as dissermos, possamos mostrar aos outros como é muito melhor oferecer palavras-rouxinol. “Acho que é muito importante falar sobre sentimentos em geral. Tenho ido às escolas apresentar o livro e costumo pedir aos miúdos do primeiro ano para partilharem frases ou palavras que os pais lhes dizem que os fazem sentir bem”, conta Luísa, que gostava de despertar conversas honestas entre pais e filhos.
As palavras também nos podem aleijar
Mãe de quatro crianças entre os dois e os sete anos, a cantautora revela que, em sua casa, se fala muito sobre o que se está a sentir e porquê. É uma forma dos miúdos não chegarem à idade adulta sem conseguirem processar os seus sentimentos. Para que isso aconteça é preciso saber verbalizar, uma vez que isso torna real a experiência sentida e alivia a pressão mental causada. Quando não verbalizamos, sobretudo emoções negativas, permitimos que a ansiedade tome conta de nós. “É importante desenvolvermos a nossa inteligência emocional, porque às vezes é negligenciada e isso dá origem a adultos que não sabem expressar-se nem ter relações saudáveis. E, atenção, eu não sou nenhuma autoridade na matéria, mas, graças a Deus, na minha infância sempre falámos abertamente. Ainda no outro dia me perguntaram num podcast se era normal para mim ver um homem chorar, e eu disse que sim. O meu pai tem 60 e tal anos, se calhar a maior parte dos homens da geração dele não chora com tanta facilidade, mas eu nunca tinha pensado sequer nisso, porque para nós sempre foi normal.”
A par da história, Luísa destaca as ilustrações de Ligeiramente Canhoto, artista sugerido pelo marido e com o qual adorou trabalhar pela primeira vez. Ao início, confessa, estava com medo que resultasse numa estética “demasiado adulta”, mas ficou rendida logo que recebeu os primeiros desenhos. Mais do que acompanharem o que escreveu, acrescentam ao texto, dando vida a uma segunda mensagem. “Quando me mandou as primeiras páginas, achei logo impressionante, porque não foi para onde eu estava à espera. Mexeu mesmo comigo, sobretudo a última ilustração, onde vemos a menina a brincar com um elefante e um rouxinol, porque isso evoca a ideia que vamos ter sempre palavras-elefante na vida e que também é importante convivermos com elas, contrabalançar com as palavras-rouxinol”, diz, ansiosa por continuar a ir às escolas. Foi também por isso que decidiu arriscar a publicação independente.
“Eu gosto de ir, falar com as crianças, cantar com elas, ensinar-lhes a escrever canções, mas isso também é um trabalho, exige tempo, e quando publicas tradicionalmente não tens tanto retorno. Ao publicar de forma independente, estou a arcar com todas as despesas, mas também estou a tornar isto uma segunda profissão. E eu tenho uma óptima relação com a Caminho, não quer dizer que não voltemos a trabalhar juntos, mas neste caso fez-me mais sentido assim.” Lançado na passada sexta-feira, 11 de Maio, O Peso das Palavras encontra-se à venda online, no site de Luísa, e em várias livrarias espalhadas pelo país. Em Lisboa, está disponível na FuFu, na Ler Devagar, na Livraria Ler, na Tantos Livros, Livreiros e na Tigre de Papel. Está ainda prevista uma apresentação na Feira do Livro de Lisboa, em parceria com a livraria e editora The Poets and Dragons Society, no Dia da Criança, 1 de Junho, às 17.00, no Auditório Norte.
O Peso das Palavras, de Luísa Sobral (texto) e Ligeiramente Canhoto (ilustração). 13 pp. 15€
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