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Ao longo de seis episódios, seis histórias interligam-se, tendo como pano de fundo o 25 de Abril de 1974. Não são reais, mas podiam ter sido. Sempre é uma série antológica, saída dos estúdios da produtora Coyote Vadio e realizada por Manuel Pureza, responsável pelo sucesso de Pôr-do-Sol. Estreia a 7 de Junho, em simultâneo na RTP1 e no streaming da Prime Video.
Do primeiro ao sexto episódio, passam-se apenas 72 horas. A janela temporal de Sempre está comprimida entre os dias 24 e 26 de Abril de 1974 e ao longo de seis episódios de 45 minutos são apresentadas seis histórias com personagens fictícios que movimentam entre episódios reais. Sempre é uma ideia original de um grupo de amigos: Manuel Pureza e dos argumentistas David Neto, Luís Lobão e Luís Filipe Borges, que se juntaram para escrever sobre o sonho e, precisamente, a amizade, e falar “de uma coisa que ouvimos dos nossos pais”, começa por dizer Manuel Pureza, na antestreia da série que aconteceu a 27 de Maio. A produção apresenta um elenco bastante numeroso, fruto da característica antológica da série, que conta – entre muitos outros – com Gabriela Barros, Rodrigo Saraiva, Rita Loureiro, Natalina José, Cristóvão Campos, António Durães, Carla Maciel, Diogo Martins, João Pedro Vaz ou Marco d'Almeida.
Sempre tem uma estrutura estável e singular. Antes de mais, todos os episódios são baptizados com títulos muitos especiais, de “Canção de Embalar”, de José Afonso, a “A Madrugada que Eu Esperava”, poema de Sophia de Mello Breyner, embora a série tenha uma banda-sonora própria, da autoria do projecto Canhoto, que junta os músicos Fred Menos, Nuno Sanches, Joana Lobo, João Fragoso, Pedro Mendonça e João Neves. E que pode ser escutada (e adquirida) online. Depois, cada episódio foca um tema em particular, sendo brindado no final com testemunhos reais de quem viveu situações semelhantes. Por exemplo, o primeiro episódio desenrola-se sob o tema do jornalismo e conhecemos o jovem Manuel (Rui Pedro Silva), estagiário da Rádio Clube Português que acompanha de bastante perto a tomada de controlo da rádio por um grupo de oficiais. O seu sonho acaba por ser o relatar desse dia histórico com material que leva mais ou menos emprestado da rádio e sai para a rua enquanto Joaquim Furtado lê o comunicado do MFA. No final, vemos e ouvimos testemunhos de pessoas como os jornalistas Fernanda Mestrinho, António Costa Santos e José Martins (também actor e encenador) e do agora coronel Nuno Santos Silva.
Sobre a construção desta narrativa, a Time Out esteve à conversa com Manuel Pureza. “Foi um desafio porque queríamos contar cada capítulo como se fosse mesmo separado dos outros, com pequenas e acidentais ligações. [...] Por exemplo, estás a ver o primeiro episódio e pensas: ‘Porque é que a Gabriela Barros é figurante?’ E não é. A Gabriela no quarto episódio tem o seu clímax. Ou, sei lá, o Diogo Martins está lá no meio a cantar e é o cantautor do quinto episódio. Foi um desafio muito interessante conseguir fazer uma teia que não fosse gratuita e que, ao mesmo tempo, suscitasse essa reacção”, explica o realizador, para quem a ideia é que Abril “tem de ser continuado”. “Sinto que há ainda muitos 25 de Abril por fazer em relação a várias pessoas, em relação a várias realidades, em relação a várias coisas que não foram resolvidas. Sim, lutámos todos pela liberdade, mas ainda há muita gente que não é tão livre como devia ser. Isso é muito, muito importante”, sublinha, enumerando alguns dos temas que serão abordados ao longo dos episódios, do racismo à condição feminina.
“A democracia é um animal muito aflito”
Esteticamente falando, cada episódio pode ser dividido em três tipos de imagem. Temos as que vamos chamar de normais e contemporâneas, que são interpoladas por imagens de arquivo da RTP e ainda por imagens 4:3 que simulam o velhinho filme de 8mm. “Isto foi pensado desde a génese do projecto, que é: qual a maior dificuldade que sentes quando vês uma cena da época? Falta dinheiro. E como falta dinheiro, faltam pessoas. Portanto, a câmara, evidentemente, não pode abrir um plano geral do Largo do Carmo, porque não vou ter milhares de pessoas. Como eu queria que o espectador sentisse a festa de perto, tem a Super 8 na mão e vai atrás. Como o quadro reduz para 4:3, a verdade é que isto resulta porque aproxima. E faz uma espécie de degradê, se quiseres, de imagem narrativa, imagem de arquivo e a nossa memória. É este o pensamento que está por trás”, revela Pureza.
E é uma das formas de embalar uma forma menos comum de contar a nossa história, numa tentativa de cativar as gerações mais novas em relação ao tema do 25 de Abril e da democracia. “Em boa verdade, a ficção histórica em Portugal vive refém da pedagogia à força, não se ficciona a bem do rigor histórico. [Em Sempre] não aconteceu assim, mas o rigor histórico está lá. São duas coisas quase paradoxais, mas que fazem todo sentido. Eu acho que nós ainda temos algum receio de inventar histórias sobre períodos da história. Contamos o que aconteceu [...], mas não sabemos o que pensou a senhora que não pôde ir ao pão.” Para Manuel Pureza, a fórmula de Sempre poderá funcionar como um antídoto (palavras nossas) para combater um certo alheamento das gerações mais novas em relação a este tema em particular, uma vez que “a democracia é um animal muito aflito, que tem de ser cuidado, porque se não for cuidado, ele foge”.
Sempre. Estreia a 7 de Junho na RTP1 às 22.30/ RTP Play e Prime Video
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