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É primeira vez que a chef Marlene Vieira participa no concurso do Peixe em Lisboa que há três anos elege as melhores pataniscas da capital. Na apresentação dos finalistas, viajámos de eléctrico e conversámos sobre o festival gastronómico e o bê-à-bá de uma receita popular que “é simples, mas não é fácil”.
Marlene Vieira inaugurou o dia com uma animada sessão fotográfica, junto à porta verde-escura de um eléctrico conhecido como Arraiolos. A chef de cozinha, que tem um restaurante no Time Out Market e outro no Taguspark, estreia-se este ano no Peixe em Lisboa com as suas pataniscas. A apresentação foi esta quinta-feira numa viagem pelas zonas mais emblemáticas da cidade.
As provas de pré-selecção para esta terceira edição do concurso ocorreram em Março do ano passado, mas a lista de finalistas ainda não está completa. Para além de Marlene Vieira, confirma-se outra novidade: a participação do Panorama, do Hotel Sheraton. A estas presenças juntam-se as da Casa do Bacalhau e do Restaurante D’Bacalhau, vencedores da primeira e segunda edição respectivamente. Numa prova totalmente cega, vão ser avaliadas as pataniscas em aspecto, sabor e consistência, com especial atenção ao equilíbrio dos ingredientes e à ausência de gordura em excesso.
Mãozinha e sensibilidade
A Praça do Comércio encheu-se de vida logo pela manhã. Um turista corre até ao eléctrico 744, cujo forro do tecto é uma réplica de um tapete de arraiolos oferecido pela artesã Maria Hortense Canelas ao Papa Francisco. Terá de esperar por outro, mas aproveita a oportunidade para apreciar a decoração e olhar indiscreto para as pataniscas em alfaces de cerâmica.
“Sempre tivemos a ideia de criar um concurso à volta do peixe e chegámos à conclusão que a patanisca, dentro da gastronomia lisboeta, era aquele prato de bacalhau que talvez mais se adequasse, porque são facilmente comparadas e consumidas”, conta Duarte Calvão, director do Peixe em Lisboa, evento gastronómico dedicado ao peixe e marisco.
“O bacalhau é a mercadoria que mais nos identifica no mundo enquanto elemento alimentar”, continua o gastrónomo Virgílio Gomes, o criador deste concurso. “Há 40 anos era o peixe das segundas-feiras nos restaurantes porque não havia peixe fresco”, acrescenta, contando como Portugal entrou na gastronomia de elite, com um banquete de peixe e marisco que D. Sebastião ofereceu ao seu tio D. Filipe II.
Antes do eléctrico começar a andar, Virgílio destaca as pataniscas e o seu lugar no receituário lisboeta, presente em livros como Cozinha Regional Portuguesa, de 1973, e Comeres de Lisboa, de 1998. São práticas de fazer, mas nem sempre bem preparadas. Por isso o mais importante é perceber como identificar a melhor confecção deste salgado. Virgílio Gomes confessa preferir comer “as mais espalmadas, ligeiramente estaladiças e douradas, mas bem secas do óleo de fritura”.
Embora se assumam as pataniscas como petisco, o gastrónomo relembra que também podem ser a estrela de um prato principal, acompanhadas com arrozes malandros de berbigão, tomate ou feijão vermelho. Imperdoável são as pataniscas com sabor a farinha e espinhas, diz Virgílio Gomes.
As pataniscas que Marlene Vieira deu a provar, durante a viagem, são finas e crocantes, com interior cremoso e sabor intenso a bacalhau. “Sou competitiva”, afirma a chef, que relembra a receita da avó, que usava azeite para a fritura. “Eu faço com óleo. Mas o que importa é a mãozinha e a sensibilidade de cada um.” A receita “é simples, mas não é fácil”, avisa, depois de perguntar se não estão gordurosas.
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