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A clássica figura, que de braços abertos percorre uma plantação de trigo debaixo de um sol de fim de tarde, é um retrato já visto em filmes, quadros e outras tantas expressões de arte. É como uma visão de liberdade, palavra que é também o principal alicerce do novo restaurante italiano da Avenida da Liberdade — o Libertà, aberto desde o final de Fevereiro. É a liberdade que lhe dá nome, contexto, grafismo. No tecto pendem espigas de trigo vindas de Itália (volta e meia cai uma ou duas: sinal de sorte, dizem); por todo o lado vêem-se símbolos relacionados, movimentos de mãos como o largar das pombas, a tocha da Estátua da Liberdade ou o revolucionário punho cerrado; e os quadrados nos vidros da cozinha e nos espelhos ilustram a ideia da opressão. “Começámos a desenvolver o restaurante durante a pandemia, altura em que a casa se tornou numa prisão para as pessoas, e pensámos que seria o momento certo para criar um conceito baseado na liberdade, na ideia de ser livre”, explica à Time Out Alykhan Popat, o jovem empresário, de apenas 24 anos, responsável pelo restaurante.
Filho de pai queniano e mãe portuguesa, Alykhan estudou nos Estados Unidos, depois mudou-se para Lisboa onde começou a trabalhar em business development para a Uber. Recentemente sentiu-se atraído pelo mundo da restauração. “Acho que Lisboa precisava de uma nova perspectiva da cozinha italiana. Como em muitos países no mundo, aqui a cozinha italiana é vista de uma maneira muito superficial. É pizza e massa”, argumenta o responsável. “Se quiseres comer frango assado vais a uma churrascaria, se queres um bom bife da vazia com molho vais a uma cervejaria. Em Itália é o mesmo. Se quiseres comer pizza, vais a um restaurante só de pizza, massa e pizza não se juntam. A maioria dos restaurantes aqui tem carbonara, e muitos pratos italianos globais”, exemplifica. E assim nasce o Libertà, sem pizza e sem carbonara. “Queríamos trazer algo mais de nicho, um pouco mais diferente, mais único. Uma cozinha italiana não convencional”, remata.
O italiano da região de Bérgamo Silvio Armanni, ex-chef executivo do Octavium, em Hong Kong, com uma estrela Michelin, é quem assume as rédeas na cozinha. “Quando conheci o Silvio disse-lhe que queria fazer cozinha italiana de uma maneira muito honesta. Com anos de restaurante Michelin, ele também achou que era o momento para voltar às suas raízes, comida caseira, comida de conforto, comida tradicional. Nada requintado, sem óleos de trufa ou flores”, conta Alykhan. "A inspiração vem de todo o lado. Queria criar uma carta autenticamente italiana, sem muitos efeitos. Simples, saborosa, com bons ingredientes portugueses", comenta Silvio. Assim, a carta do Libertà dá muito destaque à massa, mas também brilham pratos de carne e focaccias. A isto junta-se um menu de almoço que vai sendo alterado regularmente e é servido entre o 12.00 e 15.00, de terça à sexta. Os menus são compostos por antipasti, uma pasta e couvert (16€ ou 19€ com sobremesa).
A pasta fresca é preparada de forma caseira no restaurante. Desta resultam pratos como o cavatelli ai frutti di mare (22€), um prato leve com um caldo saboroso, confeccionado com peixe e marisco, e o aconchegante casoncelli alla bergamasca (15,5€), com ravioli recheados com carnes, pancetta crocante, sálvia, manteiga e parmesão. Nesta lista de massas, ênfase para o tagliatelle di coniglio alla genovese (17€), com ragu de coelho. “Adoro coelho e em Hong Kong não podia cozinhá-lo. De uma certa maneira, as pessoas de Hong Kong procuram a proteína mais rica. Querem bifes do Japão, ostras, caviar, mas sempre adorei coelho porque a minha mãe costumava cozinhá-lo aos domingos. Os portugueses gostam”, comenta o chef Silvio Armanni durante a apresentação da carta. Há outros pratos principais além das massas que também vale a pena experimentar: é o caso do bife de lombo dos Açores (25€) com rabo de boi estufado em ameixas, acelgas e polenta. Neste menu existem ainda pratos para partilhar.
Mas antes de tudo isto, a focaccia farcita (8,5€), com burrata e mortadela de pistacho, pode ser um bom começo, assim como o tartare di manzo (17€), um bife tártaro; o fritto misto (14,5€), uma tempura de camarão, lulas e legumes; ou o crudo di ricciola (18,5€), lírio cru marinado com salada de funcho e laranja e molho de mel e laranja. Já para o final da refeição, reserve um espacinho para o tiramisu (8€), com uma apresentação digna de vídeo para as redes sociais; ou para o canollo siciliano (6€), recheado com ricotta.
“Alguns podem dizer que é aborrecido, eu não acho. Acho que nos concentramos na qualidade da comida e não no espectáculo”, afirma Alykhan Popat para se referir à carta. Porém, assume que “fazer com que a comunidade portuguesa compreenda a ementa” possa ser um desafio.
Num futuro breve, o responsável quer “ampliar o foco na sustentabilidade”. “Temos uma máquina de compostagem na parte de trás na qual vamos começar a compostar os nossos resíduos orgânicos e a trabalhar com os agricultores para cultivarem frutas e legumes com o nosso composto. No futuro, gostaria de ter a nossa própria quinta para produzir fruta e legumes para os nossos futuros restaurantes”, conclui Alykhan.
Para acompanhar, pode optar por um dos cocktails. A carta divide-se em clássicos italianos, como o negroni (9€), e os de assinatura, como o Libertà Mule (10€). Nos vinhos há opções nacionais e internacionais.
Rua Rodrigues Sampaio, 39 (Avenida da Liberdade). Ter-Sex 12.00-15.00/19.00-23.30. Sáb 19.00-23.30.
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