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A vida do restaurante não é longa, mas têm sido tantas as transformações que, por vezes, parecem ter passado mais de quatro anos. Em 2021, quando o Terroir ficava em plena Baixa, na Rua dos Fanqueiros, escrevíamos, depois de umas obras de ampliação e de uma mudança de chef, que o restaurante tinha mudado tudo “para ficar maior e ainda melhor”. Não era mentira, embora três anos depois se perceba que havia mais. Com Guilherme Sousa a comandar a cozinha desde 2022, e numa nova morada – que permite finalmente que o espaço não esteja dividido em dois, como acontecia – o Terroir está pronto para subir o nível. Ou melhor, já subiu.
“A nossa ideia foi conseguir arranjar um sítio que tivesse espaço para os nossos sonhos. Precisávamos de ter mesas maiores, de ter uma sala única, uma cozinha única, que nos permitisse não ter que separar os esforços”, começa por explicar Magda Martins, sommelier e directora do Terroir, além de responsável pela decoração do restaurante na Avenida Duque de Loulé, onde outrora funcionou a Taberna do Lopes Ground Floor. “Encontrámos este espaço e achámos que seria muito engraçado para nós. É muito longo e a cozinha para eles é um sonho. Na Baixa, tínhamos duas cozinhas pequenas, aqui temos uma cozinha grande, temos frigoríficos enormes, que não conseguíamos ter. Eles estão nas nuvens, nós estamos nas nuvens.”
Guilherme Sousa não esconde o entusiasmo, admitindo que no novo restaurante “gerir as pessoas, motivar e, ao mesmo tempo, controlar tudo, do início ao fim do serviço” ficou mais fácil. “E no final, o cliente nota, e isso é que é importante”, acrescenta. “Estávamos a precisar de dar mais condições ao cliente, mais privacidade. Aqui, conseguimos ter um ambiente diferente do outro Terroir, que para a quantidade de clientes já era muito pequeno, já acabava por ser mais barulhento.”
Desde que chegou em 2022, depois de passar por cozinhas estreladas como o Ocean, a Fortaleza do Guincho ou o Fifty Seconds, aquando de Martín Berasategui, Guilherme Sousa tem vindo a vincar a sua assinatura e visão. Em vista, um objectivo claro: uma estrela Michelin. “Eu acho que é importante ter esse foco e trabalharmos com esse rigor”, diz, destemido e seguro. “Trabalhamos com pessoas muito jovens, é uma ambição muito grande para eles. Eu tento não iludir demasiado”, continua Guilherme, destacando como não é habitual um chef fora do circuito, ou com menos reconhecimento público, receber essa distinção. “É difícil vir um rapaz de 29 anos e no primeiro ou no segundo ano ganhar uma estrela. O que é importante é pensarmos que estamos a trabalhar com esse foco. Depois, pode vir, pode não vir, mas nós fizemos o que conseguimos para alcançar”, diz, falando sempre no plural. “Nada aqui é do Guilherme, é um trabalho de equipa, em que toda a gente tem liberdade para dar ideias.”
Até ver, o trabalho parece dar resultados. Pelo menos, já estão recomendados no Guia Michelin desde o ano passado. “Acho que esse é um bom sinal.”
Para isso, muito contam as alterações que o chef foi introduzindo, a começar desde logo pelos menus de degustação, cujo preço teve de subir. Há dois, um mais curto com cinco momentos (95€) e outro maior, com oito momentos (115€), ambos com umas adições do chef – mais 55€ ou 75€, respectivamente, com harmonização vínica. “Obrigatoriamente isso pressupõe melhor qualidade do produto”, garante. E elabora: “O valor aumentar ajuda a conseguirmos melhor produto. Por outro lado, fomos obrigados também a fazê-lo pela inflação, a mudança de preços foi brutal”.
Esse equilíbrio tem sido mesmo um dos maiores desafios para Guilherme, admite. “A empresa somos nós, não temos um hotel por trás, não temos mais restaurantes, não há um grupo. Nós temos de nos pagar a nós, dar lucro e satisfazer o cliente. Isso pode ser, se calhar, o que é mais difícil. Em todos os sítios em que trabalhei não havia muita atenção ao que se gastava porque havia o objectivo da estrela”, explica. “Aqui, essa parte de gestão também nos motiva todos os dias.”
Olhar para os produtos da época e valorizar aqueles que, à partida, podem ser menos nobres, é parte do caminho. “O cliente quando vem quer uma experiência diferente, não quer comer sempre carabineiro, lombo de novilho, robalo, dourada… Eu adoro isso tudo, mas tentamos fugir um bocadinho a essa linha”, justifica.
A ideia é que os menus sejam uma surpresa, mas não significa isso que os pratos estejam sempre a mudar. “Nunca mudamos o menu todo, mas pratos. É muito mais fácil trocar uma carruagem e o comboio continuar a andar do que trocar tudo de uma vez. Depois quem paga é o cliente”, defende Guilherme, que vai buscar inspiração às memórias de infância, mas também ao caminho que tem percorrido.
Há, por exemplo, um prato de pescada com batata e caldo cozido que o chef recorda dos fins de semana em família. “É a junção do melhor e do pior dos meus fins de semana. Ou tinha a pescada cozida, ou tinha cozido à portuguesa”, brinca. O pão, que surge como um momento, é passado ligeiramente no fogo e servido com azeite e muxama, ralada no momento. “Em casa da minha tia e na casa antiga da minha avó fazíamos o pão em fogo de chão. Daí a ideia de o pão ser um momento específico. Merece isso e acaba por ser uma homenagem também ao Algarve, que é uma região que, apesar de familiarmente não ter nenhuma ligação, eu adoro, e foi onde comecei o meu percurso, no Ocean.”
Falta agora chegar a mais portugueses, um desejo partilhado por todos da equipa, talvez mais fácil de concretizar nesta nova morada. “Uma coisa é mostrarmos aos estrangeiros o que não conhecem, é muito bom, mas uma pessoa vir e sentir coisas de casa é diferente, e torna a experiência mais pessoal.”
Avenida Duque de Loulé 86 A (Marquês). 926 312 647. Seg-Sáb 19.00-23.00
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