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Quando se temeu que o Red Frog fechasse, depois de o prédio onde ficava, na Rua do Salitre, ter sido vendido, a marca reapareceu ainda mais forte. Nos planos de Paulo Gomes e Emanuel Minez, o fim nunca esteve à vista; o renascimento, sim. Escondido no Monkey Mash, ninguém dá pelo bar que acaba de entrar para a lista dos 50 melhores do mundo. Se no ano passado a casa de Paulo Gomes e Emanuel Minez voltou a entrar na lista dos 100 melhores num honroso 67.º lugar, este ano o Red Frog ascende ao cobiçado top 50 – não é por acaso que os prémios têm como nome The World's 50 Best Bars.
Se hoje há mais bares de cocktails de autor e se mesmo os restaurantes apostam cada vez mais nessa vertente, Paulo e Emanuel não duvidam que têm uma quota parte de responsabilidade. É fruto de muito trabalho, acredita a dupla que criou o Red Frog em 2015, inspirando-se nos bares clandestinos que surgiram nos EUA nos anos 20, durante a Lei Seca.
Ainda na Rua do Salitre, o Red Frog chegou a dar nas vistas, e em 2017 entrou pela primeira vez para o The World’s 50 Best Bar (na 92.ª posição). Mas sem saberem, não era ali que teria espaço para crescer. Parece um contra-senso que isso tenha acontecido num espaço com apenas oito mesas, ao contrário do antigo bar, que dava para cerca de 70 pessoas. Talvez esteja aí o segredo. Desde que abriu na Praça da Alegria, no interior do Monkey Mash – não revelamos onde, para que parte da experiência não se dilua –, que tudo passou a fazer mais sentido. E ainda nem se arrojaram nos cocktails, já que a aposta tem sido numa carta que reúne alguns dos melhores cocktails antigos, embora com um twist, como o Star Fizz (14€), com Tanqueray Ten, sabugueiro e erva príncipe, pepino e rosas; ou o Bee’s Knees (14€), com Gin Mare, limão e mel.
Para entrar, é preciso reservar. Longe vão os tempos das filas à porta. É possível que, com a novidade a espalhar-se, fique mais difícil arranjar lugar. Mas Paulo avisa: “Nós vamos estar cá com a mesma dedicação e serviço o resto do ano.” Agora não vá como se fosse para um bar qualquer, porque o Red Frog não é um bar qualquer.
O que faz do Red Frog um dos melhores bares do mundo?
Emanuel Minez: Para mim a resposta é muito fácil: a autenticidade. Acho que, essencialmente, é isso. Não temos nada semelhante no nosso país e o bar marca por isso. Antigamente, funcionávamos com um conceito speakeasy e não éramos speakeasy à séria. Neste momento, já é. Muitas das pessoas vêm ao Monkey Mash e não sabem que o Red Frog está ali. Andam no Monkey à procura, para cima, para baixo, andam à volta... Isto é a parte gira deste tipo de bares, o facto de estarem escondidos alimenta uma série de questões.
Paulo Gomes: Isso é a pergunta que toda a gente faz. Em tanto mundo há tantos bares… Acho que é [fruto] de um trabalho feito desde o primeiro dia, também porque desde o início quisemos lá estar [no The World's 50 Best Bars]. É preciso querer e jogar as regras do jogo. O que nos distingue não é sermos diferentes dos outros bares. Temos é algo especial e, quando as pessoas vêm, sentem isso. Pode ser a nossa portugalidade, o sabermos receber bem. Somos muito bons na hospitalidade e na parte de hotelaria, isso é uma mais-valia.
EM: Aí, somos únicos.
PG: Isso vem no bolo da experiência toda. O [próprio] país também nos ajuda a isso.
Falaste das regras do jogo. Que regras são essas?
PG: Na gastronomia quando alguém quer ter uma estrela [Michelin] já tem uma noção do que isso quer dizer. Para nós, é mais ou menos a mesma coisa.
EM: Mas também é uma rede de contactos.
PG: Nos 50 [Best Bars] há um painel de votantes.
EM: E o painel é gigante, estamos a falar de mais de 600 pessoas. Conseguirmos tocar algumas dessas pessoas e chegarmos a elas é a parte difícil porque não conseguimos adivinhar [quem são]. Muda todos os anos, não são sempre as mesmas e nós não sabemos quem são. A verdade é esta. Nós arriscamos em alguns. Eu ainda estou convencido que se ficarmos no número 50 ficamos altamente, somos o primeiro dos últimos, mas se subirmos e se estivermos mais para cima é merecido. O importante é estarmos na lista dos 50. É um objectivo alcançado, um sonho realizado. Agora, a continuidade é uma coisa que temos de pensar se conseguimos, porque não é fácil. Cada vez mais a lista está a ficar mais difícil. Nós tínhamos o objectivo de fazer isto em três anos e com a covid e não sei quê estamos ao fim de sete e com um espaço novo. Ou seja, podemos dizer que o nosso primeiro espaço se calhar não atingiu o objectivo que pretendíamos. Conseguimos com um espaço mais pequenino, com uma realidade diferente e com muito mais qualidade.
PG: Também porque o próprio jogo foi mudando. Houve cidades que foram entrando porque os países investiram imenso na gastronomia, como o Peru. Nós temos a vantagem de Portugal, especialmente Lisboa, estar muito bem-visto, não só ao nível de turismo, mas também gastronómico. Na gastronomia, estamos cada vez mais presentes. Isso é uma grande vantagem. Nós estamos a fazer a parte oposta a isso, que não havia. Nunca vamos conseguir competir com cidades como Nova Iorque, Singapura e outras, mas arranjamos a nossa maneira de conseguir lá chegar.
EM: Por exemplo, esta final em Barcelona, se um dia fosse em Portugal, para nós seria uma mais-valia gigante, se calhar ajudava-nos imenso no crescimento na tabela. Eu estou convicto de que para o ano os bares de Barcelona sobem todos graças às visitas que vão ter.
Pois, de repente estão lá os especialistas todos.
EM: Exactamente. E um evento destes leva gente de todo o mundo.
PG: Há aqueles que abrem o bar e estão logo lá [na lista]. Nós não fizemos isso, demorou. Portanto, acreditamos que isto é o reconhecimento de todo o trabalho, desde que abrimos até agora. É um trabalho que foi construído, não foi comprado, não nasceu do nada. Nós próprios, já tivemos a noção de que se calhar não voltávamos a entrar porque percebemos que o jogo ia mudando e era cada vez mais difícil.
EM: Apanhámos um período transitório quando os 50 Best Bars foram adquiridos pelos 50 Best Restaurants e isso baralhou-nos tudo, porque fazíamos um trabalho e tínhamos um foco, já que anteriormente eram reveladas as pessoas que votavam e nós tentávamos jogar o jogo. Identificávamos onde estavam e o que podíamos fazer. Também aprendemos muito porque fomos convidados a ir a outros sítios. Viajámos bastante para perceber qual é que era o caminho que tínhamos de fazer.
Para perceber porque é que os outros bares estavam na lista e vocês não?
EM: Para vermos o que os outros estavam a fazer.
PG: E aprendermos onde é que estávamos a falhar. Percebemos que não estávamos a fazer nada de diferente dos outros e aí percebemos que tínhamos de mostrar aquilo que éramos.
Onde é que estavam a falhar?
PG: Estávamos a falhar porque não estávamos a oferecer nada de diferente no nosso menu. Foi aí que começámos a introduzir o vinho do Porto, o vinho da Madeira, produtos portugueses. Começámos a ir muito para ambientes portugueses, ingredientes mais portugueses. Começámos a mostrar às pessoas, que convidávamos para vir cá, quem somos, qual é a nossa cidade, porque é que isto é giro, porque é que é bom, porque é que Lisboa está na moda. Isso foi o game changer para nós.
Mas sentem que este reconhecimento chega na hora certa ou demorou?
EM: Nunca desistimos e, quando o Red Frog saiu dali [da Rua do Salitre], uma das coisas que pensámos foi: vamos fazer o trabalho outra vez para o Red Frog voltar. O ano passado subimos a 67.º. Somos o único português nesta listagem até à data e decidimos que estava na altura de tentar dar o salto e investir mais um bocado, convidando mais gente para tentar tocar nas pessoas certas e foi o que fizemos. O facto de darmos agora o salto para os 50 é exactamente isto. Num futuro poderão até surgir outras listas ligadas ao 50 [Best Bars]. Estão a fazer o 50 Best Asia, o North America. No futuro, pode surgir uma na Europa e se calhar aí pensamos jogar o jogo também com o Monkey, num posicionamento diferente. O Red Frog, para nós, é e sempre será o bar 50 Best, o Monkey se vier, vem por arrasto, porque em boa verdade acaba por ser um complemento muito bom.
E nunca se canibalizam?
EM: Não, complementam-se, é ao contrário. Costumo dizer que a concorrência complementa-se e neste caso é a cereja no topo do bolo.
PG: Nós temos a vantagem de o cliente entrar aqui e se não conhecer o Red, vem para o Monkey e depois acaba por conhecer o Red. Se vier para o Red, vai ter a experiência um dia de vir ao Monkey. Consegue ter dois serviços distintos. Nós temos clientes que ficam aqui a noite inteira e eles dizem que estiveram em dois bares. Conseguimos dar duas experiências diferentes numa só noite.
Mas quem entra e não faz ideia que existe o Red Frog é convidado a ir?
PG: Depende do tipo de cliente. Por exemplo, há clientes que chegam e nós percebemos que são clientes que gostam de cocktails, ou são do meio, ou são pessoas entendidas. Não é aquele cliente que quer ir só porque sim.
EM: Sendo que agora estamos a dar muito enfoque na reserva.
PG: São só oito mesas, é muito complicado gerir isto tudo. Se até agora já tínhamos problemas, daqui para a frente vai ser pior. Mas é muito fácil, as reservas estão a abrir com um mês de antecedência.
EM: E nós temos estado sempre com as duas semanas à frente quase cheias.
PG: E temos um pagamento caso não venham, porque ficámos cansados dos no-shows, as pessoas não nos respeitam. Desde que metemos isso tivemos para aí dez cancelamentos. Até nisso, vai haver uma mudança de comportamento. O cliente nacional não vai tanto à bola com isto, mas o turista vai. As pessoas até nos costumam perguntar se somos um bar de turistas. Não somos, somos um bar para pessoas, sejam elas nacionais ou turistas. O que acontece é que os turistas reservam, os turistas esperam, os turistas não se importam. E os portugueses gostam de chegar e ser os VIP e entrar logo. Se as pessoas forem lá fora ao melhor bar do mundo vão ter que reservar.
EM: Não fazemos distinção.
O que acontece é que o turista habitualmente planeia a viagem, não?
PG: Pois, é mais isso. O português chega cá à hora e quer entrar.
EM: Não quer dizer que não consiga, às vezes há um cancelamento ou pode não estar cheio e pode conseguir, mas nesta fase é muito arriscado. E acho que vai ficar pior, pela experiência que temos visto dos nossos colegas nas outras partes do mundo.
PG: E temos outra vantagem, no outro [o Red Frog da Rua do Salitre] não tínhamos reservas e era preciso esperar na fila. Hoje em dia, se quiserem, reservam para essa hora.
EM: É muito mais fácil.
PG: Têm é de estar muito em cima, como nos melhores restaurantes do mundo. É só estar atento.
EM: Estou convicto que, no futuro, vai acontecer muito isso.
Notam que quando recebem alguma distinção há essa repercussão?
EM: Entrar nos 100 deu-nos logo um boom muito grande. Da nossa indústria, nós somos a referência. As pessoas quando vêm a Portugal, é ao Red Frog que querem ir. Estamos sempre a ser notificados, a receber mensagens. Para o futuro vamos ter até de preparar mais este bar [o Monkey Mash] do que aquele, porque aquele está no limite, aquele não dá mais do que aquilo. Este é que vai ter um choque grande.
Obrigatoriamente as expectativas para este também sobem?
PG: Bom, bom era nós termos um salão enorme e abrirmos e enchíamos isto tudo, mas não é isso que queremos.
EM: Não, isso já acontecia no outro Red e não nos estava a dar gozo nem prazer. É muito mais giro as pessoas terem uma experiência num sítio muito privado.
Até porque acaba por se tornar num lugar apetecível.
PG: Não vamos sair daqui para lado nenhum, daqui ninguém nos tira. Além disso, isto não é uma coisa de um dia, é uma coisa que perdura. Costumo dizer que agora saem as notícias e há o boom, mas nós vamos estar cá com a mesma dedicação e serviço o resto do ano. As pessoas vão ter sempre oportunidade de cá vir.
EM: Não há dúvida que a lista nos dá um push no negócio. E a verdade é que há cada vez mais grupos de investidores a querer investir, [a querer] pôr um bar nos 50 [Best Bars] e às vezes não conseguem porque não é só querer, isto não se compra. Já nos aconteceu, aqui em Lisboa, virem ter connosco a dizer que também querem fazer um trabalho para os 50 Best. Muitas das vezes não têm noção do tempo e do investimento que fazemos. Isto é muito giro, mas vamos ao 50 Best desde 2010. Ou seja, isto surgiu da ideia de abrir um bar em Lisboa, quando o Cinco Lounge era o único que existia e eu via as pessoas a irem para lá. Abrimos o Red com este objectivo e começámos a trabalhar nesse sentido, só que em boa verdade a indústria era muito pequenina. Tivemos uma luta e carregámos uma série de coisas às costas, porque em boa verdade não havia trabalho feito. Hoje, estamos sempre a tentar ajudar, as marcas que querem entrar vêm ter connosco e nós encaminhamo-las e a indústria tem crescido. Hoje temos uma série de marcas de águas tónicas, uma série de marcas de rum, uma série de marcas de whiskies, e isto é que é a parte boa, estamos a crescer, estamos a dar oferta.
PG: A cultura de bar era muito básica e o gin veio ajudar-nos. Se calhar, a trend a seguir ao gin foi o cocktail. Tem muito a ver com a massa crítica. Lembro-me que ao início eram os turistas que traziam os locais. Era um bocado estranho. Hoje em dia, temos uma coisa diferente, que é, temos pessoas a pararem em Lisboa para vir ter a experiência Red Frog. Portanto, isto é um feito que não estávamos a conseguir atingir. Nenhum de nós sonhava que ia acontecer e está a acontecer.
É o que acontece com a gastronomia. Deslocamo-nos a certo sítio para ir àquele restaurante.
PG: Exactamente o mesmo, mas é um feito.
EM: É um tipo de turismo. Gosto de fazer isso em turismo.
PG: Temos de ficar super-orgulhosos. Por isso é que eu digo, isto no final é um trabalho muito grande. Há muita gente que vai aos bares dos 50 [Best Bars], quase como uma caderneta. É um outro tipo de turismo, que ajuda a economia local.
Até porque não se ficam só por aqui.
PG: E isso também faz com que ajude os outros. Eles perguntam-nos onde ir a seguir e nós dizemos, vai ali, vai acolá.
EM: E é um cliente de muita qualidade. O cliente do cocktail é um cliente de muita qualidade. É um cliente que gosta de ir aos melhores restaurantes da cidade.
Valoriza a experiência?
EM: Valoriza, sabem o que estão a pedir, sabem o que querem beber. Nós somos um bar que só trabalha com as bebidas mais premium do mercado. Às vezes há esta questão dos preços, mas as pessoas não estão a perceber a qualidade que estão a ter na oferta que estamos a dar.
Como é que se explica a esse cliente os preços dos cocktails?
EM: Tem a ver com qualidade. Se calhar, num hotel pagam o mesmo valor e a qualidade do produto é a gama abaixo. Nós conseguimos dar a qualidade a um preço justo.
PG: Veja-se o caso da Apple. As pessoas sabem que é caro, mas continuam a comprar. E é exactamente isso. Sabemos que somos caros para o custo de vida nacional, mas o que fazemos, fazemos bom. A relação preço/qualidade é muito boa. Continuo a dizer que ninguém nos consegue bater. Mas o cliente também tem de entender que está a ter um serviço exclusivo, só temos oito mesas. Quer dizer que tem de pagar um bocadinho a marca também. Agora digo: não venham cá beber um café, pedir uma imperial e beber uma caipirinha. A pessoa tem de estar aberta a uma experiência diferente. Se não for assim, tudo vai correr mal. As críticas que acabam por ser problemáticas para nós são essas.
EM: Não é o nosso cliente.
PG: As pessoas não entendem o conceito. Por exemplo, temos regras para as pessoas perceberem. Hoje em dia, se uma pessoa quiser estar mais do que duas horas, em princípio não vai dar. Porquê? Porque foi a maneira que conseguimos arranjar para as pessoas poderem ter oportunidade. Senão as pessoas ficam ali horas e horas. E o português nesse aspecto é o pior porque pede o cafezinho e fica duas horas na mesa.
Mas acontece terem de pedir às pessoas para saírem?
PG: Meia hora antes o cliente é informado. Duas horas é uma boa experiência.
E se a pessoa quiser continuar a beber?
PG: Se tivermos reservas, não dá. Só se a pessoa [seguinte] não aparecer. Duas horas é suficiente, já experienciámos isso várias vezes. Se for uma pessoa que goste de consumir que não esteja naquela de olhar para a carteira, normalmente duas horas é suficiente e até é aquele cliente que ficava mais horas, mas aí tem a ver com disponibilidade. Nós nunca garantimos isso. Duas horas é garantido, mais do que isso, depende.
Sendo que nessas regras também têm, por exemplo, dress code. Porquê?
PG: Não faz sentido nenhum, as pessoas hoje em dia...
EM: Virem com a camisola do Benfica, por exemplo [risos].
PG: Acontece. Nós não queremos que as pessoas venham com smoking, queremos é que as pessoas respeitem um bocadinho e elevem também a própria experiência. Estamos a pedir que não venham de chinelos, calções…
E isso não pode intimidar?
PG: Hoje em dia não. O que temos é casual, smart casual. Não queremos é que as pessoas venham de fato de treino.
EM: Temos um problema maior que é o número de pessoas. Normalmente aceitamos reservas de quatro pessoas. O que são quatro pessoas? Um grupo facilmente tem cinco, seis.
PG: Engraçado que, por exemplo, há clientes que se sentem ofendidos quando se sentam e percebem que as outras pessoas não tiveram o cuidado de se preparem para vir.
EM: No Monkey, sentimos as pessoas que vinham para o Red. Isso é giro. Porque aqui é muito mais cool, mas percebe-se nitidamente pela forma como as pessoas estão e como se preparam para ir para o Red. É uma parte gira porque as pessoas idealizam o espaço. E é o que eu digo, não é clube privado não sei de onde. Quanto melhor ambiente conseguirmos no bar, melhor.
PG: Ainda no outro dia tivemos uma crítica por causa de uma pessoa que começou a jogar às cartas. Nós dissemos que era proibido jogos e danças porque queremos que as pessoas respeitem o outro. No caso das cartas, isto não é um salão de jogos. A pessoa não quer esta experiência, quer ir a um café e por isso não faz sentido estar a desperdiçar tempo. Não é que ela não seja precisa, mas não está a usufruir. Ela está noutro mundo. Não queremos isso, queremos que as pessoas se sentem e comecem até a conversar. Mesmo as mesas duplas, sentam-se duas pessoas e não há vez nenhuma que a gente não meta as pessoas a conversar umas com as outras.
EM: É a parte gira dos bares. Aqui [no Monkey Mash], criámos um balcão grande por isso. Muitas vezes estão ali pessoas ao balcão que vêm sozinhas e já se criaram relações, já se criaram amizades.
PG: E no antigo bar, quando abrimos, ainda só havia 3G, era muito bom porque as pessoas não tinham rede. Hoje, têm 5G. Isto também faz com que as pessoas passem o tempo ao telefone e não queremos isso, queremos que as pessoas parem no tempo, esqueçam tudo e conversem. E o pessoal mais novo está cada vez mais agarrado. Portanto, no futuro ainda vamos ter mais esse trabalho quase social de obrigar as pessoas a falar. É por isso que pedimos para o telefone estar no silêncio, isto para resumir a questão das regras. Não estamos a exigir nada, só estamos a querer que a pessoa pare e que viva aquele momento porque assim vai ser bom, senão vai ser só como os outros.
Ainda estão com a carta com que abriram aqui, mas a ideia é mudar?
EM: Sim, vai entrar uma nova agora para o futuro. Esta foi pensada para ser um best of de todos os que tínhamos no Red. Refizemos, demos-lhes um toque de modernidade, mas agora, com esta notícia, pensámos que mais vale atrasar um bocadinho.
Mas como é que é o processo criativo?
PG: É fácil. Em relação ao menu que está agora em vigor, a intenção foi fazer com que as pessoas revivessem. Foi reviver o espaço, reviver a noite, reviver o cocktail, reviver estarmos em conjunto e reviver os nossos cocktails antigos. Então, em vez de estarmos a criar um menu novo, que se calhar seria mais um menu e não ia ter a mesma aceitação, quisemos que os clientes fossem lá porque o ‘Red Potion’, que esteve na carta de 2015 a 2017, voltou. O processo criativo é fácil, é arranjar uma inspiração e com isso criar um menu que dê para toda a gente, com cocktails que façam fit com o espaço. O menu criado para o Monkey Mash tem uma vertente diferente, é desenhado de uma maneira, é servido de uma maneira, e no Red Frog é totalmente diferente. Tem a ver com o espaço, a maneira como temos os bares montados, a experiência que queremos dar ao cliente. Este menu é o mais simples que tivemos, não temos muito teatro, o próximo já vem outra vez com o teatro. Para quê? Para também criar um wow effect.
Sentem alguma responsabilidade na evolução na cidade em relação aos cocktails e outros bares que se seguiram e até mesmo nos restaurantes, que agora quase todos apostam em cartas de cocktails?
EM: Achamos que há uma coisa importante que não está a ser feita, que é: não estamos a ensinar o consumidor a consumir os cocktails. Está tudo a surgir com cartas de cocktails de autor e devíamos pensar um bocadinho em ensinar o consumidor.
Mas como é que se ensina?
EM: Pela identificação do tipo de cocktail, por exemplo.
PG: É isso que gostamos muito. Qual é o passo a seguir da pessoa que bebe um gin tónico? É servir-lhe um copo que seja parecido com isso. Por exemplo, um gin fizz. Qualquer coisa que traga a parte ácida, que é o que a pessoa vai gostar, e que vai ser diferente. Há aí três mercados: as pessoas que gostam de cocktails, mas não gostam de cocktails, gostam é de açúcar; as pessoas que gostam de cocktails sour, coisas frescas, ácidas; e o mercado que conquistámos com o Red, diferente destes dois. A maior parte destas pessoas são consumidoras de whisky, são consumidores de bebidas puras. São pessoas que têm noção do que estão a beber, gostam e apreciam. Eu acho que o que o Emanuel estava a dizer, de ensinarmos o cliente a identificar o cocktail, significa, por exemplo, no caso de alguém que gosta de coisas frescas, dizermos-lhe a palavra sour. Se calhar, depois disso, ele vai a outro sítio e diz que quer um sour. E vai sentir-se super-orgulhoso porque vão-lhe servir um sour e ele já sabe o que é. Nós fazemos esse trabalho.
Como clientes, o que procuram num bar?
EM: Eu gosto do mood do bar. Quando vou a um bar, a primeira coisa que faço é olhar para a prateleira para perceber o tipo de bebidas que tem. Gosto de perceber o serviço, todo o acolhimento que é feito, toda a parte do atendimento, que é muito importante. Gosto de tentar perceber o que representa. Já estive em alguns bares dos melhores do mundo que para mim nunca estariam na minha lista dos 100 melhores, e já estive noutros muito melhores que nunca apareceram na lista. O facto de estarmos numa lista dá-nos muito mérito, de facto, e ficamos muito contentes com isso, mas existem outros bares bons. Até nos nossos bares tentamos sempre corrigir os detalhes. Por exemplo, quando abrimos o Monkey tínhamos o bar um bocado frio, hoje tem um power gigante.
PG: Gosto sempre do challenge de procurar o que é que o bar tem de diferente. Por exemplo, em Portugal tenho muito essa dificuldade de conseguir encontrar. Mas, lá fora, há sempre um outro bar que tenho de visitar. É a tal coisa de perceber porque é que eles fazem o que fazem. Se calhar depois no final não é exactamente aquilo que quero. Há uns que são muito bons e depois a hospitalidade é uma porcaria. Outros em que a hospitalidade é excelente e as bebidas não prestam. Também percebemos que isso é muito bom para nós. Claro que não somos aquele cliente que se senta e quer uma bebida. Nós somos aquele cliente que vai e está permanentemente a perceber tudo e quase a dizer: se isto fosse meu, eu fazia assim. Mas, pelo menos, o que eu quero é que o bar me acrescente. As outras pessoas também têm ideias boas.
EM: Tiramos inspirações muitas vezes, isso ajuda-nos.
PG: É o tal trabalho que fazemos que depois os outros não fazem. Tive um cliente que gostava muito de nós e que um dia foi ao NoMad de Nova Iorque, estamos a falar de um dos melhores bares na altura, e quando veio cá disse: ‘Adorei o NoMad, mas agora dou-vos muito mais valor’. Ele percebeu que o trabalho que estávamos a fazer aqui era muito bom porque ele esteve num sítio espectacular que estava no top. Ele disse: ‘É muito bom, mas vocês estão lá’. Isto é o cliente a dar-nos resposta.
É a prova que o trabalho é reconhecido.
EM: Esse reconhecimento dos clientes dá-nos o mérito todo. E isso é a parte que no fim paga as contas.
Praça da Alegria, 66 (Lisboa). Ter-Sáb 18.00-01.00. Reservas em redfrog.pt ou 21 583 1120.
+ 50 anos de Procópio. São elas que estão à frente do mítico bar lisboeta
+ Para chegar ao TOPO é preciso renovar. E foi o que se fez no Martim Moniz